MPT pede o fim da exposição de cortadores de cana a temperaturas exaustivas
Exaustivos golpes de podão que sintetizam o pesado trabalho no corte da cana-de-açúcar. O sol escaldante dos municípios do interior paulista, que podem alcançar picos de temperaturas de aproximadamente 40 graus. A soma destes dois fatores, acrescido do salário por produção, pode tornar a rotina de um trabalhador em algo desumano.
Contudo, o fim da exposição de trabalhadores ao calor intenso é um dos objetivos do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Bauru, que ajuizou ações civis públicas (ACP) contra a Nova América S/A, de Tarumã, pertencente ao grupo Cosan, e a Parapuã Agroindustrial, do município de Parapuã.
As ACPs pedem um controle rigoroso da exposição dos trabalhadores ao calor encontrado nas frentes de trabalho, além de uma série de regularizações relacionadas ao meio ambiente de trabalho e o pagamento de indenizações por dano moral coletivo.
As investigações conduzidas pelo procurador do Trabalho José Fernando Ruiz Maturana constataram que os trabalhadores que atuavam nas frentes de corte de cana estavam sendo submetidos a elevadas temperaturas, que chegam aos 37ºC na sombra, podendo configurar uma série de lesões graves à saúde, ou resultar em mortes por exaustão.
CALOR – um estudo realizado por acadêmicos da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) aponta que o ser humano pode perder cerca de 1 litro de suor por hora por meio de exercício intenso em um ambiente quente, o que chega a atingir até 4% do peso de um indivíduo de tamanho médio. Ainda, a exposição ao calor excessivo pode causar cãibras, exaustão (como fadiga extrema, tonturas, vômitos e desmaios) e até mesmo distúrbios letais, como perda de consciência, interrupção da transpiração ou infartos, fatores que podem causar a morte.
Segundo o procurador, o cenário encontrado nas frentes de corte da Nova América e da Parapuã não preservava a integridade física dos trabalhadores, que estavam sendo submetidos a longas jornadas sob o sol escaldante, o que configura o desrespeito à Norma Regulamentadora nº15, que prevê um “Limite de Tolerância para Exposição ao Calor”.
Segundo a NR-15, a atividade de produção deve ser pausada assim que o Índice de Bulbo Úmido Termômetro de Globo (IBUTG) atingir o índice 25, para garantir a manutenção do bem estar dos trabalhadores. A literatura internacional reduz o IBGTU para 23 em casos nos quais o trabalhador tem de usar equipamentos de proteção, o que torna a situação ainda mais grave, de acordo com o procurador.
Aferições realizadas em uma indústria da região de Avaré registraram em diversas ocasiões números acima do limite estabelecido pela NR-15, chegando a ultrapassar o índice de 30. Ainda como agravante, a Parapuã e Nova América localizam-se em regiões próximas aos município de Oswaldo Cruz e Assis, que registraram, através de monitoramentos, temperaturas em média 5ºC mais elevadas do que as observadas próximas à Avaré.
Além da submissão ao calor degradante, as investigações do MPT verificaram que as empresas não vinham respeitando uma série de regras referentes ao meio ambiente de trabalho, como o não fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPI’s), não fornecimento de água potável para os trabalhadores, além de uma série de instalações irregulares que colocam a segurança dos operários em risco.
SOBRE A AÇÃO – Diante do cenário precário encontrado, coube então ao MPT acionar as usinas perante a Justiça do Trabalho.
As ações pedem o fornecimento de ferramentas adequadas para o cultivo e colheita da cana-de-açúcar, a manutenção de um sistema eficiente de primeiros socorros e a composição integral do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT).
O pedido principal refere-se ao monitoramento da exposição dos trabalhadores ao calor nas frentes de trabalho, seguindo como padrão os limites estabelecidos na NR-15, concedendo períodos de descanso ou a suspensão das atividades assim que o nível máximo do IBUTG for excedido. As pausas devem ser remuneradas pelas empresas com base na produção do dia (preceito da dignidade), para que o trabalhador não sofra prejuízos, e devem ter a duração mínima de 15 minutos.
Também consta do processo pedidos quanto à adoção de uma série de regularizações de saúde e do meio ambiente de trabalho, como o fornecimento de água potável, proteção contra intempéries, instalações sanitárias e de máquinas adequadas, exames médicos periódicos, elaboração e atualização do Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional (PCMSO) e do Programa de Prevenção de Risco Ambiental (PPRA), entre outros.
Por fim, a ação pede a condenação da Nova América e da Parapuã Agroindustrial ao pagamento, respectivamente, de R$ 2 milhões e R$ 1 milhão, por dano coletivo causado aos direitos dos trabalhadores, valor reversível ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
“Exigir o corte de cana sob o sol forte, sem monitorar ou prevenir a exposição ao calor, atenta contra a lei e contra preceitos de dignidade humana”, observa Maturana.
A iniciativa deve se estender a outras usinas, presentes, inclusive, em diferentes estados do país, tendo em vista a existência do Programa Nacional de Erradicação no Setor Sucroalcooleiro, criado pelo MPT nacional para combater as irregularidades no segmento. Nesse contexto, a região nordeste destaca-se como prioridade, em decorrência das dificuldades encontradas na implementação do corte mecanizado.
Informe do Ministério Público do Trabalho em Campinas, publicado pelo EcoDebate, 20/08/2010
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