Pesquisa da USP analisa impactos ambientais da pecuária na Amazônia
Impactos ambientais negativos da atividade que cresce na região poderiam ser diminuídos com a exploração de produtos regionais, indica estudo feito na FSP-USP
O incessante aumento do consumo de carne bovina no mundo contribuiu para que a pecuária assumisse um papel central na economia da Amazônia, com impactos ambientais negativos. Em determinadas regiões, a exploração de produtos alternativos poderia atrair os produtores para outras atividades, limitando a criação de gado e reduzindo a pressão sobre a floresta. Mas as políticas públicas de valorização dos produtos amazônicos têm sido insuficientes e as pastagens seguem ganhando terreno.
Essas são algumas das conclusões de um estudo de caso realizado na região de Xapuri, no Acre, por pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP). Relacionando dados sobre desnutrição, consumo de carne bovina e desmatamento para criação de pastagens, o trabalho teve o objetivo de avaliar as motivações da crescente pecuarização em território acriano.
A pesquisa, que teve apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular, foi coordenada pela professora Helena Ribeiro, do Departamento de Saúde Ambiental da FSP-USP. O estudo também correspondeu à dissertação de mestrado de Gabriela Bordini Prado, sob orientação de Helena.
A literatura científica mostra que vastas áreas da Amazônia foram ocupadas por pastagens nas últimas décadas. Atualmente, segundo Helena, cerca de 40% do abate bovino no Brasil – maior exportador mundial de carne – é proveniente da região amazônica.
“Nosso objetivo foi compreender a dinâmica da produção de gado na região. O consumo de carne vem crescendo aceleradamente no Brasil e no mundo e está associado ao aumento de doenças como a obesidade e o câncer colorretal. Por outro lado, é apontado também como um importante fator de desmatamento na Amazônia”, disse à Agência FAPESP.
Além de dados da literatura internacional sobre o desmatamento na Amazônia, o estudo utilizou como base informações sobre desnutrição, consumo de carne e produção de alimentos no mundo do Escritório Regional da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).
“Em paralelo à pesquisa sobre dados indiretos, fizemos um amplo trabalho de campo na reserva extrativista Chico Mendes, na região de Xapuri. Um dos dados que verificamos é que nas próprias reservas extrativistas, originalmente criadas para a exploração de recursos naturais das florestas, o avanço da criação de gado é visível. O trabalho de campo permitiu compreender essa dinâmica”, disse.
Segundo a professora da FSP-USP, o consumo de carne, em ascensão, gera um mercado cada vez mais robusto e impulsiona o valor da mercadoria. No entanto, como alternativa alimentar, o consumo de carne é altamente ineficiente, aponta.
“Um hectare de terra utilizada para a pecuária produz 34 quilos de carne. Na mesma área é possível produzir 6.500 quilos de milho, ou 3.800 quilos de feijão. Assim, uma região de pastagens poderia alimentar uma parcela maior da população, sem necessidade de desmatamento e ocupação de novas terras. Além disso, a dieta baseada em cereais diminuiria os impactos na saúde”, afirmou.
Já na década de 1970 grupos ambientalistas argumentavam que era preciso favorecer alternativas ao consumo de carne. Grande parte da literatura científica sobre o tema foi produzida naquela época, nos Estados Unidos. “Retomamos essa reflexão. Hoje, sabemos que quando se fala em coibir o desmatamento da Amazônia é preciso criar alternativas econômicas à pecuária”, afirmou.
Nas entrevistas realizadas no Acre, no entanto, verificou-se que a ocupação do território pela pecuária, tanto por grandes como pequenos produtores, é uma forma de acomodação de capital e reserva monetária.
“Muitos dos entrevistados trabalhavam originalmente com atividades extrativistas. Mas a queda no preço de produtos como a borracha, por exemplo, levou essas pessoas a optar pela criação de cabeças de gado”, disse Helena.
O governo criou, em Xapuri, uma fábrica de preservativos com o objetivo de absorver a produção dos seringais locais. No entanto, a medida não foi suficiente para incentivar a atividade, já que o preço da carne era mais atraente.
“A região também produz castanha-do-brasil. Inicialmente, a atividade atraiu muita gente, mas não foram estabelecidas políticas públicas para criar um mercado. Assim, o aumento da oferta derrubou o preço da castanha e a cooperativa que existia na região acabou fechando. Os produtores também foram atraídos pela atividade pecuária”, explicou.
Reserva de valor
A tradição pecuarista na região teve início na década de 1970, durante a ditadura militar, que incentivou a atividade como forma de ocupação das fronteiras. Essa política atraiu para a região muitos paulistas e paranaenses que se dedicaram à atividade pecuária.
“Usada como forma de ocupação geopolítica, a pecuária se tornou uma tradição. O governo criou fundos de investimentos que incentivavam essa atividade, atraindo frigoríficos do Sudeste. O processo de pecuarização continuou nas décadas seguintes. Entre 1998 e 2004, no Acre, o rebanho bovino passou de 900 mil cabeças para 2,5 milhões de cabeças”, disse.
Para os pequenos produtores, a criação de gado representa uma reserva de valor. “Cada vez que juntam um pouco de dinheiro, eles compram uma cabeça de gado. Quando há necessidade, eles vendem essa reserva. O plano da reserva extrativista permite que se tenha até 30 cabeças de gado por colocação. Mas vimos colocações com até 600 cabeças. Aos poucos, essa atividade vai avançando sobre a floresta”, disse Helena.
As políticas públicas para valorização dos produtos amazônicos, que poderiam reverter esse quadro, são incipientes, afirma. “Há uma série de alternativas, mas a criação de gado acaba se impondo. Um dos aspectos apurados pela pesquisa é a facilidade encontrada pelo pequeno produtor para escoar a produção de carne. Os frigoríficos buscam a mercadoria quando eles querem vender. No caso da castanha, da madeira e da borracha, ao contrário, é preciso se deslocar até a cidade para vender os produtos”, afirmou.
Helena explica que, de acordo com a FAO, o mundo produz mais calorias que o necessário para alimentar todos os habitantes do planeta. Ainda assim, pelo menos 850 milhões de pessoas sofrem com a fome. “Mesmo na Amazônia, a maior parte da carne produzida não é utilizada para alimentar a população local, mas enviada ao Sudeste ou exportada”, disse.
Os dados da FAO mostram, segundo ela, que o planeta produz, em grãos, cerca de 7 quadrilhões de calorias, o que excede em 1,5 quadrilhão a quantidade total de calorias necessária para alimentar todos os habitantes da Terra.
Esse excedente de grãos é utilizado para alimentar o gado, incentivando a produção de carne. “O problema é que a perda da substituição de grãos pela carne é muito grande: para produzir uma quilocaloria de carne é preciso alimentar o gado com 17 quilocalorias de grãos”, disse.
Reportagem de Fábio de Castro, da Agência FAPESP, publicada pelo EcoDebate, 13/08/2010
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Explica com fatos o que acontece com a Amazonia. Se assim já está fácil, com o Aldo e seus “perdões” não ajudará em nada. Eu, estudante de Eng. Florestal, me sinto na obrigação de frequentar este blog. Desde já muito obrigado.
Caros Amigos, onde posso encontrar na íntrega os estudos da USP citados na matéria: Pesquisa da USP analisa impactos ambientais da pecuária na Amazônia.
Grato
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