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Inpe e Unicamp divulgam estudo sobre vulnerabilidades da região metropolitana de São Paulo às mudanças climáticas

Vulnerabilidades na mira – Caso siga o padrão de expansão apresentado na última década, a mancha urbana da Região Metropolitana de São Paulo terá o dobro do tamanho em 2030, com aumento dos riscos de enchentes e deslizamentos. A maior parte da expansão urbana deverá ocorrer exatamente nas áreas mais vulneráveis às consequências das mudanças climáticas e a maior parte dos impactos será sofrida pelos mais pobres.

Essas são algumas das conclusões do relatório Vulnerabilidade das Megacidades Brasileiras às Mudanças Climáticas: Região Metropolitana de São Paulo, apresentado nesta terça-feira (15/6) na capital paulista em um debate promovido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pelo jornal Folha de S. Paulo.

O estudo, que faz projeções climáticas para os próximos 20 anos e cenários futuros entre 2070 e 2100, formou a primeira base para a produção de mapas qualitativos de riscos de deslizamentos, enchentes e riscos sobre a saúde na região, indicando espacialmente as vulnerabilidades frente aos efeitos do aquecimento global.


Os dados do relatório mostram que uma elevação média na temperatura da região metropolitana de 2 ºC a 3 ºC poderá dobrar o número de dias com chuvas intensas na capital paulista. Segundo a projeção, o número de dias e noites quentes deverá aumentar, com diminuição no número de dias e noites frios. Mais de 20% da área total da expansão urbana da região metropolitana estará vulnerável em 2030. Cerca de 11% das novas ocupações poderão ser feitas em áreas de risco de deslizamento.

Participaram do estudo pesquisadores do Centro de Ciência do Sistema Terrestre (CCST) do Inpe, do Núcleo de Estudos de População (Nepo) da Unicamp, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (IPT) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

O relatório foi apresentado por Carlos Afonso Nobre, pesquisador do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), do Inpe, que participou, em seguida, de debate sobre o estudo com o vereador Gilberto Natalini, o secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo, Eduardo Jorge, e o ex-secretário executivo do Fórum Paulista de Mudanças Climáticas e Biodiversidade, Fábio Feldmann.

De acordo com Nobre, o estudo é o primeiro resultado de uma linha de projetos interdisciplinares que tem apoio do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), do qual é coordenador, do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) para Mudanças Climáticas e da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (Rede-Clima).

O estudo seguiu um formato inovador. Depois de uma primeira consulta com especialistas e gestores sobre o conceito de vulnerabilidade, foram realizados em 2009 dois painéis que reuniram equipe técnica, gestores e especialistas do Brasil e do exterior para discutir as vulnerabilidade das duas principais megacidades brasileiras – São Paulo e Rio de Janeiro – às mudanças climáticas globais. O painel paulista foi realizado na FAPESP.

“A cidade de São Paulo já está apresentando mudanças climáticas gigantescas nos últimos 50 anos. Além dos impactos da mudança climática global, a cidade também tem uma modificação suplementar “, disse Nobre.

Medições no bairro da Saúde, por exemplo, mostraram aumento de 2,1 ºC desde a década de 1930. As chuvas aumentaram em mais de 20%, chegando a 295 milímetros, e a diminuição da umidade relativa do ar chegou a 7%. O fenômeno das ilhas de calor também foi marcante na capital paulista: foram registradas diferenças de até 7 ºC entre áreas do centro e da periferia.

“Se em 1930 as chuvas muito intensas, de 50 milímetros, eram eventos que ocorriam anualmente, agora elas acontecem quatro vezes por ano em média”, disse Nobre.

Para construir os cenários, os pesquisadores aplicaram um modelo de projeção de mancha urbana associado ao modelo conhecido como Hand, que permitiu identificar as possíveis áreas que teriam ocupação urbana no futuro e qual o risco potencial, caso o padrão de uso e ocupação do solo atual se perpetue sem nenhuma alteração e controle.

“A vulnerabilidade tem três componentes principais: chuva, declividade e uso do solo. Se uma região de média declividade for coberta por vegetação, o risco é pequeno. Mas se essa mesma região é ocupada por uma favela, ou um lixão, com drenagem muito precária, o risco pode ser altíssimo”, disse Nobre.

Segundo o relatório, hoje cerca de 30% da população da região metropolitana de São Paulo, ou aproximadamente 2,7 milhões de pessoas, vive em comunidades, cortiços e habitações precárias, muitas vezes ilegais.

Concentrações significativas de áreas de risco de escorregamentos estão presentes na Zona Sul da capital paulista (Jabaquara, Cidade Ademar, Pedreira, Cidade Dutra, Jardim Ângela, Capão Redondo e Campo Limpo). Nessa região, estão concentradas mais de 50% das favelas em São Paulo.

Nas demais regiões, as áreas de risco localizam-se na Zona Oeste (Butantã e Jaguaré), na Zona Norte (Perus, Pirituba, Jaraguá, Brasilândia, Freguesia do Ó e Tremembé) e na Zona Leste (Sapopemba, São Mateus, Aricanduva, Vila Formosa, Vila Prudente e Itaquera).

Não repetir erros

O estudo dividiu as vulnerabilidades em diversas categorias, definindo os principais cenários de risco, como enchentes e inundações, enxurradas com alto potencial de arraste, alagamentos em diferentes pontos, lixo lançado nos cursos d’água, escorregamentos de massa em encostas e eventos pluviométricos mais severos. O trabalho avaliou também os diversos impactos das mudanças climáticas sobre a saúde humana.

“Os impactos das enchentes e inundações, por exemplo, deverão atingir habitações, atividades industriais, comerciais e o sistema de transporte urbano e rodoviário, com contribuição da expansão das vias em áreas de várzea para atender ao crescimento da demanda de tráfego”, disse Nobre.

Os impactos sobre a saúde incluem aumento de incidência de alergias – como rinite e asma – e da intensidade e duração dos sintomas por causa da poluição atmosférica. “Utilizando modelos com dois parâmetros – poluição e temperatura –, observou-se que esses fatores explicam 80% dos casos dos picos de internações por doenças das vias respiratórias inferiores”, afirmou.

Segundo Nobre, embora não tenha sido seu objetivo principal, o relatório também aponta medidas de adaptação que as cidades da região metropolitana terão que buscar.

“Uma das recomendações mais importantes é não repetir os erros do passado quanto aos padrões de expansão urbana”, disse Nobre. De acordo com o estudo, será preciso aumentar os investimentos em pesquisas voltadas para modelagem do clima, assim como na elaboração de modelos hidrológicos que permitam ações preventivas. Haverá ainda necessidade de investir em transportes coletivos e de criar áreas de proteção ambiental nas áreas de várzeas de rios.

Segundo Natalini, a votação da Lei de Mudanças Climáticas de São Paulo demonstra que a Câmara Municipal da cidade está empenhada em discutir o tema e em contribuir para as adaptações necessárias na cidade. “O problema é muito grave e o desafio de São Paulo é imenso, porque a cidade, em geral, não teve qualquer planejamento durante sua fase de maior expansão”, disse.

Jorge afirmou que, embora o tema das mudanças climáticas venha sendo mais comentado atualmente, é necessário agora encarar de frente o tema das adaptações. “A cidade de São Paulo está descobrindo que essa não é apenas uma questão ambiental, mas também econômica e social. Estamos começando a perceber agora que as mudanças climáticas precisam ser tratadas como um tema transversal, em todas as esferas de governo, e horizontal, em todas as secretarias”, disse.

Feldmann destacou a qualidade científica do trabalho e a capacidade de articulação institucional demonstrada na realização do estudo. “Um dos principais méritos do estudo é sinalizar para o cidadão com a noção de que ele é um protagonista do processo. A emissão de gases de efeito estufa, por exemplo, depende do seu comportamento”, afirmou.

* O sumário executivo do estudo Vulnerabilidades das Megacidades Brasileiras às Mudanças Climáticas: Região Metropolitana de São Paulo pode ser lido em: www.inpe.br/noticias/arquivos/pdf/megacidades.pdf

Reportagem de Fábio de Castro, da Agência FAPESP, publicada pelo EcoDebate, 17/06/2010

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