Caiu o sistema, artigo de Montserrat Martins
[EcoDebate] Hoje quando se fala em ‘sistema’ é porque estamos num banco ou numa loja e tudo emperra porque ‘caiu o sistema’. Mas para as gerações dos anos 70 e 80 se falava tanto em ‘sistema’ que ficava enjoativo, tudo que acontecia de errado no mundo era por causa do ‘sistema’. Pior do que a repetitiva culpa do sistema, só a “geração Big Brother” cujo único fascínio são as fofocas de celebridades. Porque, afinal, questionamentos podem ser chatos mas ajudam a fazer evoluir conceitos. Certamente o culto às celebridades deve contribuir em algo, embora eu também (como diria o Luís Fernando Veríssimo) ainda não tenha descoberto para que serve.
Mas qual o “sistema” que os contestadores criticavam tanto e que viviam “derrubando” em mesas de bar ? Naquela época, até tomando refri com os amigos já tinha quem pensasse que o sistema ia “cair” graças às idéias criadas naquela mesa, é claro. O ‘sistema’, não era só a questão do “capitalismo” porque não chegou a haver um modelo político alternativo satisfatório, capaz de gerar unanimidade, então o dito “socialismo real” também era chamado de ‘sistema’ com quase a mesma frequência.
Se hoje tivéssemos a mesma empolgação para mudar o mundo (ao invés de bater umas fotos com os famosos pra botar na internet) haveria muito mais coisas para chamar de ‘sistema’, a começar pelo consumismo descartável que enche o mundo de lixo, a ponto dos cientistas descobrirem cada vez mais verdadeiras “ilhas de plástico” nos oceanos. Podíamos chamar assim o fato de que quem mais sofre com a degradação das águas, do ar e dos solos são os mais pobres, que não tem tantas opções de onde morar, nem podem beber água mineral.
Mesmo naquilo que há em todos lugares, como a corrupção, ainda é o “sistema” que abafa os escândalos, não deixando ir para a cadeia os “de colarinho branco”. Onde a saúde pública não funciona isso não desperta interesse nas autoridades, pois o interesse econômico dita que todos tenham algum plano de saúde. E para que vamos investir em segurança pública, se já tem tantas empresas de segurança privadas ? Cabe aqui tudo aquilo que nos decepciona, se alguém chegou a uma posição de liderança para mudar as coisas e se acomodou, foi “absorvido pelo sistema”.
Talvez por ser tão frustrante é que se tem falado menos disso por aí, do que nas décadas passadas… Ou talvez porque quem falava, hoje está dentro dele. O certo é que não se fala mais como antes em mudar o mundo, justamente agora que mais precisaríamos mudar, não é irônico ? Antes era uma delícia se falar em “cair o sistema”, hoje dá medo nas pessoas, tipo “será que eu não vou conseguir comprar minha bugiganga hoje, se caiu o sistema ?”.
Montserrat Martins, Psiquiatra, é articulista do EcoDebate.
EcoDebate, 23/04/2010
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