As nascentes do São Francisco, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] O rio São Francisco, como todo grande rio, tem várias nascentes. Eu não conheço a nascente ofical do chamado “rio da integração nacional” que fica na Serra da Canastra, no sudoeste mineiro. Acho que é um desconhecimento imperdoável e, para reparar, já agendei conhecer a região neste ano de 2010.
Mas conheço bem a nascente do rio das Velhas, principal afluente do São Francisco, que fica na cidade de Ouro Preto. Eu fui professor e pesquisador durante 15 anos na UFOP e sempre que podia visitava o alto dos morros de Santana e São Sebastião que são divisores de água de duas grandes bacias hidrográficas brasileiras: a do rio das Velhas (bacia do São Francisco) e a do rio do Carmo (bacia do rio Doce). Quando chove ao norte dos morros de Santana e São Sebastião, em Ouro Preto, as águas correm para o Nordete do Brasil. Quando chove ao sul, as águas correm pelo vale do rio Doce (região de nascimento da Cia Vale do Rio Doce) até desaguar no oceano Atlântico, no estado do Espírito Santo. É por estas e outras que Minas Gerais é chamada a “Caixa D’água” do Brasil.
No alto dos morros de Santana e São Sebastião fica a Área de Proteção Ambiental da Cachoeira das Andorinhas. É um lugar lindo, com uma rica biodiversidade e uma beleza paisagistica indescritível. A Cachoeira das Andorinhas tem uma característica única. As águas da nascente que correm no meio das pedras, de repente, caem em uma gruta e desaparecem. Para encontrá-las é preciso dar uma pequena volta e entrar dentro da gruta onde se pode tomar um banho de cachoeira no meio de grandes blocos de pedras, ocasionalmente, com a visita de inúmeras andorinhas que vivem no local. Mais abaixo existe a “pedra do jacaré” que é uma rocha que tem a forma de um jacaré e que se estica sobre um belo vale verde, ricamente e naturalmente arborizado com espécies da Mata Atlântica e do Cerrado. No fundo, as montanhas se estendem no horizonte até a Serra do Caraça, local onde existia o famoso educandário do Caraça, colégio administrado pela Igreja Católica e que formou vários homens públicos, políticos e presidentes do país na época da República Velha (o colégio não formava mulheres).
O Parque das Andorinhas foi criado para proteger a segunda principal nascente do rio São Francisco e combater as atividades ilegais de mineração e desmatamento que estavam (e ainda estão em menor monta) destruindo este patrimônio natural. A mineração da pedra Ouro Preto que é usada como piso de casas e jardins (como a pedra São Tomé explorada no município de São Tomé das Letras no sul de Minas e que é outro local de beleza indescritível) provoca uma grande erosão do solo, pois a terra em volta do quartizito é retirada e levada pelas chuvas, assoreando toda a área. Esta situação é agravada pelo desmatamento e pelas queimadas realizadas pela população pobre dos morros de Santana e São Sebastião que utilizam o fogo para fazer pastagem (para vacas, cavalos e cabras) e para a retirada de lenha para ser usada fonte de energia nas cozinhas.
Estas atividades causam danos irreparáveis, pois retiram boa parte das matas ciliares, de cabeceira e demas formações vegetais essenciais à proteção das águas das nascentes, reduzindo o fluxo de água do leito dos córregos. Como resultado, o volume de água da Cachoeira das Andorinhas vem diminuindo ano a ano. As ações públicas implementadas recentemente no Parque das Andorinhas reduziram muito a extração da pedra Ouro Preto e um pouco as queimadas. Mas a recuperação da área ainda não foi feita e são visíveis os danos causados por anos de degradação ambiental.
Evidentemente falta decisão política e recursos para recuperar o Parque das Andorinhas e para proteger a segunda mais importante nascente do rio São Francisco. Enquanto isto, o governo gasta milhões para fazer a transposição do rio São Francisco. Eu não sou especialista para opiniar sobre a oportunidade e a viabilidade desta obra um tanto quanto faraônica. Mas o que dá para sentir é que se o governo não cuidar das nascentes do rio São Francisco, dentro de pouco tempo, não haverá água suficiente para ser transposta.
José Eustáquio Diniz Alves, colaborador e articulista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE. E-mail: jed_alves{at}yahoo.com.br
EcoDebate, 08/04/2010
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