A redução da população, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] O século XX foi o século de maior crescimento da história da humanidade. Em 1900, a população mundial era cerca de 1,5 bilhão de habitantes e chegou a 6 bilhões no ano 2000. Portanto, foi um crescimento de 4 vezes, ou seja, a população demorou toda uma história para chegar a 1,5 bilhão e em apenas um século aumentou em 4,5 bilhões de habitantes.
Este alto crescimento aconteceu devido a uma conquista social fundamental que foi a queda das taxas de mortalidade. A esperança de vida ao nascer média do mundo era algo em torno de 30 anos em 1900 e passou para mais de 60 anos no ano 2000. Portanto, a extensão da vida humana dobrou no século passado. A redução da mortalidade precoce permite que as pessoas vivam mais, invistam mais na educação e se qualifiquem para exercer os direitos de cidadania e para contribuir com a sociedade.
O alto crescimento populacional aconteceu porque a mortalidade caiu rapidamente e houve uma defasagem entre o aumento da esperança de vida e a queda das taxas de fecundidade. Mas, gradativamente ao longo do século XX, as mulheres e os casais de quase todos os países do mundo começaram a ter menos filhos. Se antigamente era preciso ter 6 filhos para sobreviver 3, agora basta ter os 3 filhos desejados que a chance de sobrevivencia deles é muito grande. Portanto, em alguns casos, as famílias passaram a ter menos filhos totais, mas não necessariamente menos filhos sobreviventes.
Mas de modo geral as pessoas e as famílias passaram a ter menos filhos por que não dependem deles o quanto dependiam antes para funcionar como um seguro contra riscos ao longo do ciclo de vida e na velhice. Houve uma mudança especialmente em relação às expectativas das mulheres, que deixaram de serem valorizadas essencialmente pela maternidade, e passaram a construir uma carreira profissional e um projeto de vida autônomo.
Porém, mesmo com toda a dimensão da queda das taxas de fecundidade, a população mundial continuou a crescer por conta da estrutura etária jovem, já que mesmo tendo menos filhos existiam muitas pessoas em idade reprodutiva. Este fenômeno é chamado de “inércia demográfica”: a população cresce não porque as pessos têm muitos filhos, mas porque tem muitas pessoas em idade reprodutiva. Somente com o envelhecimento populacional as populações se estabilizam ou começam a diminuir.
Atualmente no mundo existem diversos países que já apresentam um declínio populacional, sendo que entre as maiores reduções absolutas estão na Rússia, Ucrânia e Japão. Diversos países europeus só não estão encolhendo por conta da imigração internacional. Outros países que possuem taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição só não apresentam redução devido ao efeito da inércia demográfica. Mas com a transformação da pirâmide etária estes países vão ter uma população estável ou em declínio, dependendo do comportamento da migração. Vários países com fecundidade muito abaixo da reposição (lowest low fertility) podem apresentar reduções muito fortes da população (mas trataremos destes casos em outro artigo).
Dentre os 5 maiores países do mundo, Brasil e China são exemplos de dois países que vão apresentar uma tendência de queda do número de habitantes no futuro próximo. As projeções do IBGE (feitas em 2008) mostram que o Brasil vai atingir um montante máximo de população de 220 milhões de habitantes por volta de 2040 e depois iniciará um período de declínio que pode ser mais rápido ou mais lento dependendo do comportamento das taxas de fecundidade e de migração internacional. Mas o país que vai apresentar o maior declínio absoluto é a China que deve atingir uma população máxima de 1,46 bilhão de habitantes em 2030 e depois cair até atingir 1,4 bilhão em 2050. Ou seja, a China deve perder 60 milhões de habitantes entre 2030 e 2050. Na segunda metade do século XXI, após o processo de envelhecimento do país, as quedas devem ser mais rápidas e superiores à casa dos 200 milhões, na segunda metade do século XXI.
A população mundial, que deve atingir 7 bilhões em 2012, poderá chegar a 9 bilhões de habitantes em 2050 e depois se estabilizar ou começar um leve declínio. O crescimento populacional nas próximas 4 décadas será uma realidade inevitável, mesmo que haja uma aceleração da queda da taxas de fecundidade, devido ao já referido processo conhecido como inércia demográfica. Mas o crescimento populacional do século XXI será menor do que o crescimento do século passado e a estabilidade ou ligeiro declínio está colocado no horizonte próximo.
Uma estabilização ou declínio da população (especialmente dos países com alta densidade demográfica) poderá ser positiva para o desenvolvimento humano e sustentável do do mundo, se houver melhoria da qualidade de vida dos habitantes do Planeta, redução do consumo e recuperação da capacidade regenerativa da Terra. Em 1970, as emissões mundiais de CO2 (e gases equivalentes) estavam em cerca de 14 bilhões de toneladas e passaram para algo como 29 bilhões de toneladas. As emissões per capita da população mundial passaram de 3,8 toneladas para 4,2 toneladas per capita.
Portanto, reduzir apenas o volume demográfico não basta. Mesmo nos casos onde há redução da população, a tarefa inadiável continua sendo romper com o modelo do crescimento econômico predatório e do consumo insustentável, pois se essa lógica continuar, toda a população mundial, independente do seu tamanho, vai sofrer as consequências da degradação e da depauperização do meio ambiente.
José Eustáquio Diniz Alves, colaborador e articulista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE. E-mail: jed_alves{at}yahoo.com.br
EcoDebate, 05/04/2010
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