Satisfação garantida, artigo de Montserrat Martins
Foto do R7, Entretenimento
[EcoDebate] Quem resiste a um filme berm feito, por mais previsível que seja o ‘happy end’? O cinema tem esse poder sobre nós, é capaz de nos envolver emocionalmente e, por mais que os intelectuais critiquem o padrão hollywoodiano, ele mobiliza milhões de espectadores no mundo inteiro e o próprio “imaginário coletivo”, o modo como vemos o mundo. Sim, existe uma “fórmula do sucesso” e ela é científicamente estabelecida, vale a pena conhecer os detalhes das técnicas de roteiro, são verdadeiras aulas de psicologia (como “Teoria e Prática do Roteiro”, de David Howard e Edward Mabley), nos explicam o que as pessoas querem ver numa história e o modo como as pessoas querem que a história seja contada.
Jorge Furtado já resumiu que um filme é a história de “alguém que quer muito uma coisa, mas que é difícil de conseguir”. Tudo começa com o desejo do protagonista, um desejo que nós também teríamos no lugar dele, mesmo que seja o de simplesmente sobreviver (como em “2012”). Aí começa a “psicologia de massas” do cinema, que para fazer sucesso tem de empatizar com o que desejamos, o que tememos, coisas que nem sempre são tão claras ou conscientes porque, como já disse Carl Rogers, “o que existe de mais íntimo e pessoal é o que existe de mais universal”.
Quando Freud centrou a teoria do inconsciente na sexualidade, vivia em plena “era vitoriana” na qual o sexo era um tabu. Hoje, de “assunto proibido” falar de sexo se transformou em “obrigatório”. Então, quais são os tabus de hoje, as polêmicas e dramas da nossa época, que mexem com temores e esperanças de todos no íntimo, mesmo que não sejam evidentes a todos ? Ter esperanças no futuro, por exemplo, de que ainda seja possível prevalecerem valores sociais e ambientais sobre os meros interesses imediatos, é um tema que está se tornando recorrente nos filmes atuais, como agora aparece na fábula “Avatar”.
O cinema explora justamente essas contradições, entre o mundo em que vivemos e o em que gostaríamos de viver. Se há uma característica comum aos protagonistas da maioria dos filmes, hoje, é que eles são anti-convencionais, quebram regras para um “bem maior” que vai além do “status quo”, para que suas histórias prendam nossa atenção. Praticam valores elevados, “heróicos”, mesmo quando mal compreendidos pelos grupos sociais a que pertencem. Este “heroísmo” do protagonista está em suas virtudes que se revelam quando enfrenta obstáculos e supera limites, inclusive das próprias contradições interiores. É o que os junguianos chamam de “jornada do herói”, descrita em “A Jornada do Escritor”, de Christopher Vogler.
Por tudo isso, os “megasucessos” do cinema são mais do que “satisfação garantida”, mero entretenimento. Também dizem algo sobre nós mesmos, como nos sentimos e como gostaríamos de ser. Só são “fórmulas comerciais” porque mobilizam desejos e necessidades. Como no caso de “Avatar”, agora, que de forma alegórica nos coloca diante dos dilemas atuais da civilização, em que nossas conquistas tecnológicas se defrontam com a “tecnologia” de recursos da natureza que ainda não conhecemos tão profundamente.
Montserrat Martins, Psiquiatra, é colaborador e articulista do EcoDebate.
EcoDebate, 15/01/2010
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