Uma história de Natal, artigo de Montserrat Martins
[EcoDebate] O Natal mexe com as pessoas porque evoca sentimentos familiares, alegrias e tristezas. Sei que há muitas histórias tristes mas vou compartilhar uma que me transmite alegria pelo que tem de inesperada, de inédita. Não é uma história de Natal típica no sentido religioso, nem no de ganhar presentes, mas sim das atribulações de uma família com o seu pai e avô. É a história do Osvaldo, a quem cheguei a avaliar quando esteve hospitalizado com uma série de problemas clínicos (inclusive cardiovasculares) e talvez neuropsiquiátricos, a investigar. Aos 75 anos, ele estava tão fragilizado em sua saúde, que sua recuperação nos meses seguintes foi surpreendente.
O Osvaldo, hoje viúvo, sempre foi um cara alegre, de bom papo, que trata bem a todos, carismático mesmo – e até hoje é assim. Quando uma neta viu a foto do casamento dele e perguntou “como a minha vó que era tão linda foi casar com o senhor que era tão feio?”, ele respondeu sorrindo, “feio mas agradável, minha filha”. Da sua juventude tem muitas histórias pra contar, foi jogador profissonal (atacante) do Cruzeiro de Porto Alegre que era um time grande naquela época, nos anos 50. Na sua cidade, Santana do Livramento, seus feitos são conhecidos até hoje pelos que o viram jogar – e ele recebe tratamento especial onde vai.
Na metade desse ano a família levou aquele susto com a saúde dele, teve episódios de ficar confuso à noite, não se sabia se era um quadro neurológico ou efeito colateral das medicações cardiovasculares. Como ele não gosta de ficar no hospital, um dia protagonizou uma cena inédita, saiu do seu quarto de pijama mesmo, de madrugada, e foi para o atendimento clínico de emergência se queixar de uma dor na perna. Depois de atendido lhe ofereceram condução para casa – sem saber que ele estava baixado – e ele deu um endereço no bairro Sarandi, onde foi “passear” de ambulância, até descobrirem que ele não morava mais lá, estava baixado no próprio hospital e residindo numa clínica geriátrica.
A parte inédita dessa história é que depois disso ele trocou de clínica e foi para uma tão alegre quanto ele, que chega a ter bailes entre os pacientes. Logo que entrou lá cativou a três “pretendentes”, até se decidir por uma, que aparenta ter a mesma idade e a mesma disposição dele. Pois a nova namorada do Osvaldo contou que o filho dela é piloto de avião e o convidou para viajar até Miami. A família, que chegou a temer pelo pior no meio do ano, agora está tentando se adaptar à nova vida do seu pai e avô. Em vez de passeios de ambulância pelo Sarandi, ele agora tem de se preparar para passear de avião nos “States”. A vida tem muitas tristezas e provações, mas esse “novo momento” que o Osvaldo está vivendo pode nos inspirar a sermos mais alegres e otimistas, como ele.
Montserrat Martins é Psiquiatra, colaborador e articulista do EcoDebate.
EcoDebate, 23/12/2009
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