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Artigo

Fármacos residuais contaminam sem tratamento, artigo de Fernando Marcelo Tavares

fármacos

[EcoDebate] As técnicas de tratamento de efluentes são relativamente recentes. De 1900 a 1970, resumiam-se à remoção de material suspenso, tratamento de orgânicos biodegradáveis e eliminação de organismo patogênicos. A partir de 1970 passou a haver uma preocupação maior com a Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) e a remoção de nutrientes, sendo que o tratamento de águas residuais passou a ser direcionado para questões de saúde.

Os avanços conquistados até agora, evoluíram de um tratamento preliminar e primário para um tratamento secundário com a utilização de recursos biológicos para a redução dos teores de materiais orgânicos solúveis, e, finalmente, para o tratameno terciário, que passa a abranger a remoção, através de processos químicos, de nutrientes como o fósforo e o nitrogênio, microorganismos patogênicos, substâncias corantes, entre outras não eliminadas nos processos anteriores.

Assim como ocorreu a evolução das técnicas de tratamento de efluentes domésticos e industriais ao longo da história recente e de forma compatível com o conhecimento tecnológico das diversas épocas, é sensato afirmar que esta evolução está muito aquém de seu ápice, principalmente considerando que há, ainda, muito desconhecimento acerca das características e dos efeitos dos produtos químicos no meio ambiente e na saúde humana, bem como há uma profusão de pesquisas em andamento que, certamente, possibilitarão o desenvolvimento de novas tecnologias.

E é bom que elas cheguem logo. Quanto mais se difundem e se aperfeiçoam os processos de monitoramento ambiental, mais transparece nossa vulnerabilidade a contaminações não previstas anteriormente. É o que vem demonstrando, por exemplo, os resultados de algumas pesquisas sobre a presença de fármacos residuais em efluentes de estações de tratamento de esgoto, levantando informações bastante preocupantes. O assunto tem sido alvo de diversas pesquisas em todo o mundo que têm constatado a presença de antibióticos, hormônios, anestésicos, antipilêmicos, meio de contraste de raio X, antiflamatórios, entre outros fármacos, nos esgotos domésticos e nas águas superficiais e subterrâneas em países como os EUA, Itália, Inglaterra, Holanda, Suécia, Canadá e Brasil.

Os estudos demonstram que estes fármacos não têm sido completamente removidos nas ETEs, indicando, ainda, a resistência de muitos deles ao tratamento convencional da água favorecendo seu retorno ao metabolismo humano. São vários os efeitos nocivos desta contaminação: desenvolvimento de resistências bacterianas a estas substâncias; perturbação nos sistemas endócrinos de organismos humanos e animais; e alterações determinantes nos sistemas reprodutivos de espécies marinhas e terrestres.

São muitas as evidências. Informações apuradas desde a década de 1980 comprovam estes efeitos. Foi nessa época quando foram iniciadas as primeiras pesquisas sobre a influência de substâncias estrogênicas no desenvolvimento de anomalias no sistema reprodutivo de peixes, havendo, inclusive, muitos relatos de casos de feminização de peixes machos expostos a estrogênios.

O que se constata a respeito dessas substâncias, é que são desenvolvidas pelos laboratórios farmacêuticos para serem persistentes em virtude de sua função terapêutica, podendo ser excretados do organismo humano de 50 a 90% da dosagem ingerida, com suas características completamente inalteradas.

Verifica-se, ainda, que os níveis de contaminação podem ser muito piores considerando o uso intensivo de antibióticos como promotores de crescimento na bovinocultura, suinocultura, produção avícola e aqüicultura, além do impacto direto, em águas subterrâneas, dos resíduos da indústria farmacêutica dispostos nos aterros sanitários, e do uso do lodo digestivo das ETEs na agricultura.

Este cenário indica a necessidade de uma regulamentação mais rigorosa para a produção destas substâncias pelos laboratórios, assim como um monitoramento mais eficiente na sua aplicabilidade terapêutica e produtiva. Indica, também, a urgência para o aperfeiçoamento das etapas do tratamento de água e de efluentes, ou o desenvolvimento de uma nova etapa, específica para a remoção dos fármacos residuais pelas ETEs.

Enquanto as novas tecnologias e regulamentações não chegam, continuamos gozando dos benefícios da vida moderna, ignorando, na maioria das vezes, que o custo pago por eles vai muito além do cartão de crédito.

Colaboração de Fernando Marcelo Tavares, Jornalista e ambientalista, para o EcoDebate, 10/12/2009

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