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COP 15, Copenhague, começou entre o fracasso e a esperança

COP 15

A COP 15 – Décima Quinta Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas – o encontro internacional considerado por muitos como o mais importante do século começou na capital da Dinamarca. O desafio: chegar a um acordo para estabilizar a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera em um patamar que evite o desequilíbrio do clima no planeta.

Na última década a questão ecológica deixou de ser um assunto periférico e deslocou-se para o centro da agenda mundial. Foi decisivo para esse deslocamento o movimento ambientalista e o já histórico relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas – IPCC – de fevereiro de 2007. À época, o informe dos pesquisadores e cientistas foi categórico e não deixou espaço para dúvidas ao afirmar de forma contundente – o relatório utilizou a expressão “inequívoca” – que o aquecimento global se deve à intervenção humana sobre o planeta, ou seja, o responsável pela evolução acelerada da tragédia ambiental é a ação antropogênica sobre a Terra.

Há dois temas centrais na pauta em Copenhague: O primeiro é a necessidade premente de um novo acordo – Kyoto está defasado – que reduza drasticamente a emissão dos gases-estufa. Desde o relatório do IPCC de 2007 o sentido de urgência, de que algo precisa ser feito, foi ganhando corpo e um consenso foi se consolidando: a temperatura do planeta não pode subir mais do que 2 graus Celsius até o final desse século. Esse limite é considerado o ponto crítico após o qual as consequências das mudanças climáticas seriam irreversíveis. Para que isso aconteça o mundo tem 40 anos – até 2050 – para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa em 80% e apenas uma década para atingir metas que correspondam a 20%.

O segundo tema diz respeito ao financiamento – o Fundo do clima –, de como os países ricos, principais responsáveis pelo aquecimento atual ajudarão os países pobres a descarbonizarem sua economia. As cifras necessárias são estimadas em US$ 150 bilhões a US$ 300 bilhões ao ano. Até agora, nenhum país rico disse com quanto pretende contribuir. Retornaremos a esse tema.

O movimento ambientalista já estabeleceu a sua pauta frente a essa agenda. Para o movimento ecológico, o sucesso em Copenhague exigirá um acordo justo, ambicioso, que tenha validade legal e contemple: Um compromisso dos países industrializados de reduzir as emissões em até 40% até 2020 (níveis de 1990); um plano para pôr fim ao desmatamento tropical até 2020 e pelo menos US$ 140 bilhões por ano em financiamentos públicos para os países em desenvolvimento.

É do possível acordo frente aos dois temas – redução e financiamento – que Copenhague pode se transformar numa flopenhague (de flop, ou fiasco, em inglês) ou em uma hopenhague – de hope, esperança, destaca Claudio Angelo.

Embora o tom do noticiário tenha ficado mais otimista ou menos pessimista nas últimas duas semanas, chega-se à abertura da reunião da Convenção do Clima, em Copenhague em meio a incertezas ainda muito acentuadas, afirma o ambientalista e jornalista Washington Novaes. Segundo ele, esse clima de incerteza é explicado pelo vai e vem de posições: “Nem sempre é simples entender o que acontece. Ora se noticia que EUA e China chegaram a um acordo para reduzir emissões, ora se noticia que os emergentes (China, Índia, Brasil, África do Sul), reunidos em Pequim, criaram frente para pressionar os países industrializados a quem atribuem a responsabilidade histórica e numérica de reduzir emissões a também financiar adaptações às mudanças e transferência de tecnologias”.

O mais provável é que o encontro termine com um acordo denominado de “politicamente vinculante”, em vez de “legalmente vinculante”. Na linguagem diplomática um acordo “politicamente vinculante” significa que os países assinam um documento se propondo a realizar esforços na direção do que seria de fato necessário e desejável. Na linguagem popular, significa “empurrar com a barriga” o problema para 2010 – esse é o quadro flopenhague

A grande surpresa seria um acordo ousado em que os países definissem de fato um acordo “legalmente vinculante”, ou seja, com força de lei. Esse cenário, hopenhague, está mais distante, embora não seja totalmente descartável. “A hora é agora. Os resultados virão, porque o preço político de não produzi-los é tão alto que nenhum país poderá pagá-lo”, afirma Connie Hedegaard, presidente da COP-15.

Segundo ela, “todo mundo concorda que ainda podemos chegar a um acordo em todos os elementos-chave necessários a uma resposta ambiciosa global à ameaça da mudança climática – como cortes de emissões de gases-estufa pelos países desenvolvidos e novos fundos para ajudar nações em desenvolvimento a se adaptarem às mudanças climáticas e escolherem um caminho de desenvolvimento verde”.

Na mesma linha vai Yvo de Boer, secretário das Nações Unidas para as mudanças climáticas, para quem
“os chefes de Estado vêm para celebrar êxitos, não para firmar fracassos”. Segundo ele, “nunca nos 17 anos das negociações do clima, os países haviam feito tantos anúncios”. A ONU considera que Copenhague será “um ponto de inflexão na luta para prevenir o desastre climático”.

O otimismo da ONU deve-se ao fato de que nas últimas semanas, os EUA se comprometeram a reduzir suas emissões de gases do efeito estufa em cerca de 17% até 2020 com relação a 2005. A China anunciou que irá frear o aumento de suas emissões e que, dentro de 10 anos, para cada ponto do PIB, irá emitir 40%, e que, em 2050, um terço de sua energia será renovável.

A União Européia, por sua vez, comprometeu-se a reduzir suas emissões em 20% com relação a 1990 e avalia agora ir a 30%. Por outro lado, Japão, Austrália, Brasil, México também chegam a Copenhague com compromissos.

Embora se respire otimismo, está praticamente certo que nada será definitivamente acertado em Copenhague. A própria Connie Hedegaard, anfitrião e presidenta do encontro, dá o caminho de como as coisas deverão terminar: “Nossa leitura, feita a partir das negociações e de muitos encontros bilaterais nos últimos meses, é que existe um sentimento geral de que será muito difícil produzir um instrumento legal completo já em Copenhague – muitos detalhes ainda precisam ser resolvidos –, mas não podemos sair de Copenhague sem um mandato claro para finalizar um instrumento legal num prazo curto”.

Esse resultado, o mais provável, ficaria numa espécie de meio termo entre a flopenhague (fracasso total) e a hopenhague (acordo ousado). Esse resultado, aliás, já foi de certa forma antecipada por Lula e Angela Merkel ao afirmarem que Copenhague não resultará em um “acordo dos sonhos”.

Há, porém os efetivamente otimistas. Um deles é Achim Steiner, diretor do Programa Ambiental das Nações Unidas (Unep). O seu otimismo fundamenta-se na metas já anunciadas pelos países: “Quem considera impossível um acordo em Copenhague está simplesmente errado” disse ele. O diretor da Unep e o especialista inglês Nicholas Stern afirmaram em relatório que a diferença entre as metas já anunciadas – nas últimas semanas, houve anúncio de metas de corte por parte de países que lideram o grupo dos maiores poluidores, como Estados Unidos, China, Índia, Brasil e Indonésia – de corte na emissão de poluentes e o volume considerado necessário pelos cientistas é relativamente pequena.

O estudo afirma que o mundo precisa limitar as emissões a 44 bilhões de toneladas por ano até 2020 para manter o aumento da temperatura neste século em 2 graus (calculados com base no período pré-Revolução Industrial), patamar considerado aceitável pela maioria dos cientistas. Se efetivamente adotadas, as metas já anunciadas por países ricos e em desenvolvimento permitirão reduzir as emissões a 46 bilhões de toneladas por ano.

Fundo do Clima

Um tema que será objeto de forte negociação é o financiamento, ou ainda, o Fundo do clima como mostra as primeiras declarações em Copenhague. O Fundo do clima diz respeito ao repasse de recursos dos países ricos aos pobres e emergentes para auxiliar no mitigamento do impacto ambiental. Nos bastidores do primeiro dia da 15ª Conferência do Clima das Nações Unidas (COP-15), com a União Europeia à frente, surgiu a proposta dos governos de países industrializados em não repassarem recursos dos fundos de Adaptação e Mitigação aos grandes países emergentes, como o Brasil.

Negociadores europeus e sul-americanos alertam que, sem o entendimento sobre o repasse de recursos dos fundos, as chances de acordo são reduzidas. Os debates sobre financiamento devem ser os mais complexos da COP-15. Não há consenso nem sobre a administração do fundo nem sobre seu montante total – e muito menos sobre a divisão dos valores, assunto que provoca divergência ainda maior entre os diplomatas europeus.

Para eles, a crise econômica – marcada pelo mau desempenho de países industrializados e pela boa performance dos grandes emergentes como China, Índia e Brasil – alterou as condições de negociação entre Bali, em 2007, e Copenhague, em 2009. “A arquitetura do Protocolo de Kyoto previa fluxos significativos de recursos migrando para China, Índia e Brasil. Hoje, acreditamos que, quanto maiores as necessidades de recursos de um país, mais ele precisa receber”, disse o negociador da União Europeia, Artur Runge-Metzger, em referência às nações menos desenvolvidas, como as africanas.

O ex-ministro do Meio Ambiente da França e embaixador encarregado das negociações do clima, Brice Lalonde, confirma a posição. “Na Europa, nos perguntamos se os emergentes devem receber recursos do Fundo de Adaptação ou se o mais plausível seria que apenas os países menos desenvolvidos, como os da África, tenham acesso”, afirmou. “O mundo mudou após a crise, e o papel dos emergentes não é mais o mesmo.”

A hora é agora!

Copenhague e o seu resultado servirá como um sinalizador da real disposição dos governantes em enfrentar a mais grave crise civilizatória: a crise ecológica. Como afirma Jeremy Rifkin, “temos duas semanas para puxar o freio de emergência e evitar a catástrofe climática”.

Hoje o mundo já vive com os refugiados do clima e Bangladesh é o maior exemplo: No último século, a ilha já perdeu 65% de seu território de 250 quilômetros quadrados. Outra ameaça dramática vivem os povos asiáticos em função do aquecimento global. As mudanças climáticas no topo do mundo põe em risco o fornecimento de água da Ásia. As geleiras do Himalaia estão em perigo, já que o seu derretimento (dentro do normal) alimenta o sistema hídrico mais poderoso do mundo: os rios Ganges, Indus, Brahmaputra, Mekong, Amarelo e Yangtze, um sistema que fornece sustento material e espiritual para mais de três bilhões de pessoas.

Esses são apenas dois exemplos de que o planeta Terra dá sinais de esgotamento. Reiterados estudos indicam que os sistemas físicos e biológicos alteram-se rapidamente como nunca antes aconteceu na história da civilização humana. Plantas florescendo mais cedo, primaveras precoces, desequilíbrio do padrão migratório das aves, geleiras derretendo, extermínio sem precedentes de espécies de animais, fenômenos assustadores como ciclones e furacões são algumas amostras irrefutáveis de que o planeta entrou em um estágio de agonia.

Nessa perspectiva é preocupante a pesquisa Nielsen/Universidade de Oxford que revela que a preocupação mundial com a mudança climática diminuiu nos últimos dois anos. A pesquisa mostrou que 37 por cento de mais de 27 mil usuários de Internet em 54 países disseram estar “muito preocupados” com a mudança climática, menos que os 41 por cento de uma pesquisa similar de dois anos atrás. “A preocupação global com o clima esfriou”, disse a Nielsen sobre a pesquisa realizada em outubro, que ligou a redução das preocupações com o clima à crise econômica mundial. Nos Estados Unidos, o segundo maior emissor de poluentes após a China e a única nação industrializada fora do Protocolo de Kyoto das Nações Unidas (ONU), o número dos muito preocupados caiu de 34 para 25 por cento.

Por outro lado no Brasil, pesquisa realizada pelo Instituto Análise, revela que nove em cada dez entrevistados (88%) já ouviram falar do aquecimento global. E 80% disseram ter notado alguma mudança climática nos últimos anos. Desses, 89% classificaram a mudança como ruim para a região onde mora. “O tema do aquecimento global ficou muito popular, e isso é importante para mobilizar as pessoas”, disse o diretor do Instituto Análise, Alberto Carlos Almeida. “Mostra também que a opinião pública está propensa a ouvir discursos que tratem desse tema”, completou, referindo-se à crescente atenção que políticos têm dado ao aquecimento global, por causa da conferência de Copenhague.

Perguntadas sobre “qual país é o maior culpado pelo aquecimento global”, 45% das pessoas responderam, espontaneamente, “Estados Unidos”. A resposta está cientificamente correta, já que os EUA são o país que mais contribuiu historicamente para o acúmulo de gases do efeito estufa na atmosfera. Já a China, que é o que mais emite gás carbônico atualmente, foi citada por 3% dos entrevistados. O Brasil apareceu em 12% das citações, apesar de a contribuição histórica do País para o problema ser pequena.

Destaque-se, porém, que em uma outra pesquisa, a preocupação com o ambiente ficou em sexto lugar na lista de prioridades para o próximo presidente da República, atrás de saúde, educação, segurança pública, emprego e salário mínimo. O tema ficou à frente, porém, de estradas e obras públicas. “É uma demonstração de que todo mundo quer obras, mas que, cada vez mais, essas obras precisam levar em conta o impacto ambiental”, avalia Almeida. Poluição dos rios e desmatamento foram os problemas ambientais mais citados pelos entrevistados.

Conjuntura da Semana. Uma leitura das ‘Notícias do Dia’ do IHU de 24 de novembro a 08 de dezembro de 2009

A análise da conjuntura da semana é uma (re)leitura das ‘Notícias do Dia’ publicadas, diariamente, no sítio do IHU. A presente análise toma como referência as “Notícias” publicadas de 24 de novembro a 08 de dezembro de 2009. A análise é elaborada, em fina sintonia com o IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT – com sede em Curitiba, PR, parceiro estratégico do Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

(Ecodebate, 10/12/2009) publicado pelo IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.

[IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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