Agricultores de SP desmatam o Cerrado apesar de multas altas
Cerrado: mapa da destruição. Fonte AE
Proprietários exploram área de conservação, mesmo correndo risco de pagar multas maiores que o lucro obtido
Proprietários rurais do cerrado paulista escolhem usar a área de preservação obrigatória das suas terras em atividades como agricultura e pastagem correndo o risco de pagar multa – mesmo que o valor da multa seja muito superior ao lucro obtido com a exploração das terras. A constatação é do administrador e biólogo Alexandre Igari, que desenvolve no Instituto de Biociências (IB) da USP uma pesquisa de doutorado sobre o tema.
O pesquisador explica que o Código Florestal Brasileiro obriga os donos de terras a preservar algumas áreas frágeis de suas propriedades rurais, como margens de rios. Obriga também que 20% do território restante seja usado apenas em atividades que obedeçam a um plano aprovado pelo governo, como ecoturismo e extrativismo sustentável. Caso sejam pegos utilizando a área, chamada de Reserva Legal, os donos pagam uma multa de cerca de R$5.000 por hectare. A pesquisa propõe que o governo desenvolva linhas de crédito específicas para agricultores que obedecem à lei.
Igari estudou os 349 municípios paulistas que possuem mais de 10% do seu território na área original do cerrado. Ele calculou o quanto os proprietários lucrariam em média se alugassem a terra da reserva legal ou a usassem para as principais atividades econômicas das zonas rurais das regiões – por exemplo, agropecuária ou plantação de eucaliptos.
Era de se esperar que só desobedecessem a lei os municípios onde os lucros obtidos com a exploração e com o aluguel das terras fossem mais altos que o valor da multa. Contudo, apenas seis municípios, que cultivavam frutas, apresentavam lucratividade anual maior do que o valor da multa. E somente em 100 municípios o valor esperado do aluguel era maior do que o valor da multa. Em apenas cinco municípios foi observado o percentual mínimo de Reserva Legal.
Falta fiscalização
“Os agricultores preferem desmatar o cerrado porque a chance de ser pego na fiscalização é muito baixa e não há benefícios financeiros para quem obedece a lei”, explica Igari. Na verdade, os bancos são proibidos de negarem o Crédito Rural, com juros subsidiados pelo governo, a agricultores que desobedeçam ao Código Florestal. A única condição é que eles tenham condições de pagar os empréstimos e as multas decorrentes da infração.
“Com isso, o governo acaba financiando atividades que desrespeitam as leis ambientais”, resume o biólogo. Ele está aperfeiçoando em sua tese uma solução em que tanto os produtores rurais quanto o meio ambiente se beneficiariam. A sugestão é que mudem as regras de crédito rural, de maneira que somente produtores que respeitassem a lei recebessem o benefício. Outra idéia é que o governo utilize linhas de crédito internacionais, como as do Banco Mundial, para aumentar os subsídios para produtores que se enquadram no código florestal.
“O esquema seria atrativo para fontes estrangeiras de financiamento ambiental porque mesmo as taxas de juros subsidiadas no Brasil são muito competitivas, comparadas com as dos países desenvolvidos”, explica Igari em artigo sobre a pesquisa publicado em junho de 2009 na revista Environmental Management . “Proprietários de terras se beneficiariam de uma maior disponibilidade de recursos subsidiados para fazer novos investimentos. Isso poderia aumentar a produtividade e lucratividade, mesmo de acordo com as leis ambientais.”
O cerrado é considerado por pesquisadores de ecologia um hotspot – área com pelo menos 1500 espécies que vivem apenas na região e que tenha perdido mais de 70% da vegetação original. Em São Paulo, somente 8,5% da área original do cerrado permanece preservada, sendo que 93,5% se encontram em propriedades particulares.
A tese de doutorado de Igari, orientada pela professora Vânia Regina Pivello, deve ser defendida em 2011.
Mais informações: email igari{at}uol.com.br
Reportagem de Nilbberth Silva, da Agência USP de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 05/12/2009
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