Cúpula da FAO sobre segurança alimentar: Palavras não alimentam pessoas
“As intenções são apreciáveis, mas não se alimenta mais de um bilhão de pessoas atingidas pela fome com intenções“. É lapidar a opinião que Gawain Kripke, porta-voz da Oxfam internacional, lança sobre a declaração final adotada nesta segunda-feira pela cúpula da FAO [Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação] sobre segurança alimentar de Roma. Aquilo que uma das organizações não governamentais mais importantes do mundo denunciava há dias, tornou-se realidade ontem: do encontro de Roma, sai um texto sem prazos precisos e sem compromissos concretos.
A reportagem é de Francesca Caferri, publicada no jornal La Repubblica, 17-11-2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Desiludido, senhor Kripke?
As nossas expectativas já eram baixas. Se você tivesse me perguntado em julho, eu teria lhe respondido que esperava mais financiamentos, mas há muito tempo estava claro que a cúpula acabaria assim. Com um documento que é bom no papel, mas que, de fato, não leva o mundo para mais perto do objetivo de dar fim à fome ou à pobreza.
A seu ver, quais são os maiores problemas?
São diversos. Não há novos financiamentos. E a situação com relação aos financiamentos já decididos é confusa: para a maior parte, não há nem novas destinações. Depois, está o fato de que nenhum dos líderes dos países do G8 interveio aqui em Roma, e isso pode pesar sobre as ações futuras: o risco é que os caminhos divirjam, em vez de convergir. Temos em campo as Nações Unidas, os países do G8, depois os do G20: mas não há dinheiro e energia suficientes para ter estratégias diferentes. É preciso uma atitude única e global. Nós pensamos que as Nações Unidas deveriam coordená-lo: mas essa organização deve se tornar mais transparente e competente. Esperamos desafios muito comprometedores: a retomada econômica está fazendo com que os preços subam de novo, as mudanças climáticas colocam os agricultores mais pobres em dificuldade. Não podemos nos permitir outros fracassos.
Em Roma, discutiu-se muito sobre a ligação entre agricultura e clima e sobre a importância da cúpula de Copenhage, que, no entanto, fracassou antes mesmo de começar…
Encontramo-nos claramente em um momento de dificuldade para as iniciativas internacionais. Pensemos nas negociações da Organização Mundial do Comércio, nessa iniciativa sobre a fome, naquela sobre o clima de Copenhage: há muitos esforços, muitas promessas, mas depois não há convergência. O resultado é que o dinheiro é pouco e além disso não é gasto de forma coordenada: por isso, as iniciativas correm o risco de não funcionar. Uma das coisas positivas da declaração final adotada aqui em Roma é a ideia de que os países são responsáveis pelos planos de desenvolvimento que são realizados em seu interior. Neste momento, há muita confusão, muitas vezes os governos não sabem nem quais iniciativas que as ONGs ou a sociedade civil estão levando adiante. Assim não é possível.
Uma coisa que se viu em Roma apesar do crescente papel das ONGs: o diretor-geral da FAO indicou o seu trabalho como modelo, encontrando os representantes do Fórum da Sociedade Civil.
Sim. A sociedade civil e as ONGs podem desempenhar um papel muito importante. Nenhum de nós é depositário da verdade: mas quanto mais ideias e perspectivas houver com relação a um problema, mais possibilidades existem de resolvê-lo. A dialética entre os governos e o público é importante, e é importante que isso seja reconhecido.
(Ecodebate, 19/11/2009) publicado pelo IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
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