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Artigo

Dona Felicidade foi ‘simbora’, artigo de Américo Canhoto

[Ecodebate] Dia destes presenciei um quebra pau amoroso homérico; a mulher do seu Zé, meu amigo faz tudo e que me socorre nos quebra-quebra das coisas do cotidiano, estava arrumando suas coisas prá ir embora. É, a Dona Maria Felicidade (A Fiinha pros íntimos), a mulher do Zé da caixa de ferramentas, estava puxando o carro; tirando o time de campo, zarpando, buscando outros ares – Quase fui arrastado prá briga como advogado do diabo; pra escapar tentei fazer cara de paisagem, cara de político pego com a mão na botija, cara de isso não é o que parece…, dentre mortos e feridos, acho que como ator da novela das oito eu escapei ainda amigo dos dois.

O causo foi mais ou menos o seguinte:
– To indo imbora Zé! – Nem abre o bico senão eu ti mato!
– Mas, purque Felicidade? (a coisa deve ter sido feia; pois, pro Zé chamar a Fiinha de forma tão solene: Felicidade! – algo grave aconteceu).
– Ocê sabe muito bem seu cabra safado! – Mas, prá te poupar como disse a muié da novela: Não estou mais feliz! – Quero viver bem!
– Mas, Fiinha eu não sei viver sem ocê!
– Sabe sim, seu Zé pilintra! – Tá vendo essa m…. aqui; e jogou a camisa do “timão” no chão; uma suprema ofensa, pois o fanático Zé tinha dado pra ela no seu aniversário; – Tudo isso era fingimento; eu sou “porco”.

Achei que o Zé ia partir para a ignorância; mas ele só ficou ali com cara de quem vai explodir – e a Felicidade puxou o carro.

Resumindo a estória, aconteceu uma situação com o Zé que já passei muitas vezes, e que a Dona Felicidade levou pro outro lado; não posso entrar em detalhes (segredo de amigo e de médico); mas que foi muito gozado; isso foi.

Sem saber muito bem o que dizer; falei pro Zé: – Fica triste não; ela volta; daqui a pouco a Felicidade vai bater de novo na tua porta! – Quantas vezes isso já aconteceu e ela sempre volta!

Será?
Mas, como em casos de felicidade dos outros, o melhor é não meter o bedelho; até por que o motivo de felicidade de uns pode ser algo amedrontador para outros; fiquei na minha e disse pro Zé: Deixo a chave com o porteiro e assim que der, ocê passa lá e conserta prá mim!

De volta prá casa; as últimas palavras da Dona Felicidade do Zé antes de virar a esquina ficaram martelando na minha cabeça: – Quero ser feliz! – Quero viver bem!

E passei a conversar com meus botões:
O que a Felicidade do Zé quis dizer com: viver bem? – O que é viver mal?
Estar ou ser?

Viver bem é estar alegre e feliz? – Veja bem: estar feliz, e não, ser feliz; pois são momentos e num momento você está, noutro não.
– Neste exato momento estás alegre ou triste? – E daqui a um minuto?

Às vezes, basta apenas um minuto para sairmos da sensação de tristeza para a de alegria ou de um sorriso, um gesto, um olhar…

Ser é a somatória de todos os momentos em que você está. Podemos nos considerar pessoas felizes quando a soma dos momentos que consideramos felizes supera os outros; claro que a Felicidade do Zé não sabe disso; pois na contabilidade existencial até os sábios em determinar a felicidade alheia não sabem somar e deixam a sua dona Felicidade ir embora.

Ser feliz é uma conquista que poucos já fizeram; é crediário quitado; consciência limpa.

Se eu pudesse, diria prá Dona Felicidade: Estar feliz é possível a todo instante, para qualquer pessoa, só depende de nós. Estar alegre também é diferente de ser alegre – mas, talvez eu precise mais ouvir isso do que ela.

Ser feliz com qualquer coisa! – Ser simples! – Mas, como conseguir isso sem parecer bobo? (Tá rindo do quê? – pergunta o baixo astral). Estar feliz exige um porque, um motivo. Ser, já não precisa mais de motivo; simplesmente é e pronto. Ser um dia alegre e feliz depende de uma sucessão de estar alegre e feliz, muitas e muitas vezes até cansar de estar triste e mal humorado. É um tipo de treino que exige conhecimento, meta, trabalho e persistência.

Eu me pergunto:
Há segredo na alegria?
Se existe um segredo para ser alegre e feliz? – Claro. O segredo é criar, inventar, reciclar o tempo todo motivos para estarmos felizes e alegres. Cada um tem que inventar os seus; pois copiar do outro quase nunca dá certo. Muito menos querer a alegria e a felicidade dele.

– O que é preciso para estar alegre e feliz? – Apenas de um, relativo, bom motivo. Pessoas alegres são inventivas, criativas. Aprenderam a criar seus motivos de alegria e felicidade sem dar permissão para que os outros o façam; são mais autênticas que as outras. A tristeza crônica vira mau humor permanente. Pessoas mal humoradas perdem a autenticidade costumam copiar os outros e pouco criam. Há mais copiadores do que criadores. Essa é uma explicação do porque de existirem muito mais pessoas tristes do que alegres.

Tomara que a Dona Felicidade do Zé na caia nas armadilhas da tristeza.

Algumas pessoas se acostumaram tanto a serem tristes e a sentirem-se infelizes que não admitem que alguém possa estar alegre à sua volta. Sentem inveja. E criam armadilhas para que os alegres se tornem tristes: inventam valores inúteis, criam marcas e padrões, sofisticam as coisas, complicam tudo para tentar impedir que as pessoas estejam alegres e felizes, simplesmente.
(Não conte para ninguém; ou melhor; espalhe para todo mundo que a alegria é simples. Um dos segredos de ser alegre é ser simples…)

Alegria e tristeza são contagiosas; se a Dona Felicidade soubesse disso, ela só ficaria perto de gente alegre.
De repente alguém começa a rir, e sem que consigam controlar os que estão em volta também disparam a dar risada sem saber a razão. É como se alegria fosse capaz de contagiar, e é.

Cuidado: a tristeza e o mau humor também.

O ideal é buscarmos sempre que possível companhia de pessoas que irradiam alegria.
Procure cultivar a alegria e a felicidade íntima para que seja capaz de contaminar as outras pessoas. Nunca lhe faltarão bons amigos; pois sem perceber as pessoas buscam nas outras a alegria que às vezes lhes falta naquele momento.

Será que:
Alegria e tristeza são momentos?
Tudo na vida passa. Se a Dona Felicidade soubesse disso ela não teria colocado o pé na estrada. A estrada da vida é uma sucessão de breves e únicos momentos; não existe um momento exatamente igual a outro. Não seremos inteiramente alegres ou tristes o tempo todo e para sempre.

Se eu pudesse iria atrás da Dona Felicidade; pois com certeza ela está triste – e diria para ela:
“Fiinha” – Não fuja da tristeza!

Não é fugindo dela que se encontra a alegria; ao contrário, enfrentando e aprendendo a dominar os momentos tristes é que nos capacitaremos a entender e dominar os momentos alegres.

Estar triste ou sentir-se infeliz é um estado temporário que temos de aprender a dominar para que sejamos realmente alegres e felizes.

Os momentos de tristeza também têm a sua própria beleza; basta apenas que aprendamos a descobri-los.
“Fiinha” – Aprenda a respeitar a sua tristeza!

Temos o mau hábito de parar para pensar apenas para tentar fugir dos efeitos das escolhas mal feitas. A tristeza ou até o sofrimento, é um tipo de breque, um sinal amarelo de alerta, preparando para um sinal vermelho de pare, que não deve ser desperdiçado, sob perigo de acidente de percurso, de bater ou capotar com vítimas na estrada da vida.

A tristeza é ótima conselheira e uma grande mestra na arte de viver. Poucos conseguem conquistar sabedoria sem a sua ajuda.
Analise e estude as suas dores da alma; quem sabe de uma tristeza possa ser tirada uma linda lição e até uma relativa alegria.

Provavelmente Dona Felicidade não se lembre da Elis Regina cantando a música “Como Nossos Pais” – composição de Belchior.
Como Nossos Pais
Elis Regina
Composição: Belchior
Não quero lhe falar,
Meu grande amor,
Das coisas que aprendi
Nos discos…
Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
Eu sei que o amor
É uma coisa boa
Mas também sei
Que qualquer canto
É menor do que a vida
De qualquer pessoa…
Por isso cuidado meu bem
Há perigo na esquina
Eles venceram e o sinal
Está fechado prá nós
Que somos jovens…
Para abraçar seu irmão
E beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço,
O seu lábio e a sua voz…
Você me pergunta
Pela minha paixão
Digo que estou encantada
Como uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade
Não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento
Cheiro de nova estação
Eu sei de tudo na ferida viva
Do meu coração…
Já faz tempo
Eu vi você na rua
Cabelo ao vento
Gente jovem reunida
Na parede da memória
Essa lembrança
É o quadro que dói mais…
Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Como os nossos pais…
Nossos ídolos
Ainda são os mesmos
E as aparências
Não enganam não
Você diz que depois deles
Não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer
Que eu tô por fora
Ou então
Que eu tô inventando…
Mas é você
Que ama o passado
E que não vê
É você
Que ama o passado
E que não vê
Que o novo sempre vem…
Hoje eu sei
Que quem me deu a idéia
De uma nova consciência
E juventude
Tá em casa
Guardado por Deus
Contando vil metal…
Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo, tudo,
Tudo o que fizemos
Nós ainda somos
Os mesmos e vivemos
Ainda somos
Os mesmos e vivemos
Ainda somos
Os mesmos e vivemos
Como os nossos pais…

“Fiinha” – Em se tratando de alegria e tristeza vale a pena: Libertar-se da educação recebida!

Há uma forte tendência na educação e na socialização a padronizações, dogmas e preconceitos para tentar impedir que as pessoas sejam alegres e felizes. Alguns tipos de moral religiosa criaram conceitos de pecado, perdão, céu, inferno, santos, diabos, purgatórios, arrependimentos, e o pior de tudo, criaram um paradigma de que o sofrimento resgata os chamados pecados. Isso não resiste ao pensamento lógico, no entanto, muitas pessoas acreditaram que o nosso querido planeta é um mar de lágrimas e de expiações. A liberdade é de cada um; entre escolher como caminho de progresso a via da alegria ou o caminho da tristeza e da dor.

Dona Felicidade, é possível que o Zé não tenha percebido que:
A lei de causa e efeito é um mecanismo regulador da alegria e tristeza!

Alegria e tristeza, dor e prazer são o preço da liberdade que temos de pagar ao executar escolhas. O “pulo do gato” na conquista de um estado de alegria mais duradouro é desenvolver a capacidade de retirar alegria da tristeza gerada pelas escolhas mal elaboradas, reformulando-as, e criando uma metodologia para fazer das novas escolhas, as mais acertadas a cada novo momento.

“Fiinha” – Vale a pena deixar o orgulho ferido de lado e voltar.

Alegria e tristeza são compartilhadas!

Impossível o isolamento. Somos seres interdependentes.

Conquistam o estado de estar alegre e feliz mais duradouro apenas aqueles que aprendem a compartilhar sua alegria e felicidade. A tendência cultural de valorizar o mal faz com que muitas pessoas sintam prazer em dividir com os outros muito mais suas tristezas e dores ou seus estados de euforia e tendam a esconder suas alegrias com medo de que a inveja dos outros faça secar seu poço de felicidade.

Alegria e tristeza exigem respeito!
Cada pessoa está no seu próprio momento nem antes nem depois. Cada um fez suas conquistas, têm a sua visão de mundo particular, seus valores, seus conceitos.

Você está alegre ou triste neste momento?
Estar alegre ou triste tem um quê de subjetivo e de doidura!

Definir a qualidade de uma sensação exige interpretação. Uma mesma situação pode ser interpretada de maneira diferente por pessoas diferentes. Até, uma mesma pessoa pode interpretar uma situação idêntica de forma diferente em diferentes momentos.
Muitos são os fatores que fazem com que as sensações sejam sentidas de forma subjetiva e pessoal. Dentre elas a expectativa que o julgador tem com relação ao acontecimento. Os valores em jogo. A qualidade pessoal do julgador, etc.

Essa subjetividade comporta até os extremos. O que para uma pessoa significa alegria para outra pode representar tristeza.
Alegria e tristeza sempre devem ser questionadas. Estou alegre por quê? Quais os motivos? Estou triste por quê?
“Fiinha” – matuta; põe a cabeça pra pensar, pois:

A alegria não abre mão da inteligência.

Outra dica para ser feliz é aprender a discernir entre a verdadeira e a falsa alegria. Alguns tipos de alegria são efêmeras demais, e logo como “gremlins” podem tornar-se daninhas e perigosas.

O maior inimigo da alegria duradoura é o embalo, o impulso sem o controle da razão, a tendência mal conduzida.
“Dona Felicidade” – Cuidado com a tristeza má conselheira:

Busque alegria no lugar certo e na hora certa.

Quantas pessoas descuidadas caem na armadilha de buscar a alegria apenas nos prazeres da mesa. No orgasmo continuado a qualquer preço. No consumo de drogas, cigarro, álcool, etc. Nas festas sem sentido. Na algazarra.

Nos dias seguintes vem a ressaca física e às vezes até a ressaca moral. A verdadeira alegria é uma forma íntima de nos sentirmos, que pode e é compartilhada durante alguns momentos com as outras pessoas.

Será que pode haver hora certa para ficar alegre e hora certa para ficar triste?
Como qualquer outra atividade e sensação humana a alegria deve ser inteligente, caso contrário a ressaca do sofrimento é fatal.

Depois de uma bela noitada o rescaldo pode ser uma indisposição que pode levar vários dias para desaparecer. Uma tremenda dor de cabeça. Tarefas mal feitas. Gravidez não desejada que pode terminar em aborto, etc.

Onde encontrar alegria duradoura?
Viver segundo os próprios valores ouvindo a voz da própria consciência deve tornar-se um ato de alegria e de prazer.

Quando desenvolvemos a capacidade de participar da vida com honestidade começamos a compartilhar nossa felicidade.

Dizem os mais sábios que a alegria permanente emana da alegria que proporcionamos aos outros.

Dona Felicidade – sou amigo do Zé – Sabe que musica peguei ele cantando? “Felicidade foi simbora e a saudade no meu peito ainda mora” do Caetano Veloso… –

Felicidade foi se embora
E a saudade no meu peito ainda mora
E é por isso que eu gosto lá de fora
Porque sei que a falsidade não vigora

A minha casa fica lá de traz do mundo
Onde eu vou em um segundo quando começo a cantar
O pensamento parece uma coisa à toa
mas como é que a gente voa quando começa a pensar

(2 X)
Felicidade foi se embora
E a saudade no meu peito ainda mora
E é por isso que eu gosto lá de fora
Porque sei que a falsidade não vigora

Na minha casa tem um cavalo tordilho
que é irmão do que é filho daquele que o Juca tem
E quando pego meu cavalo e encilho
Sou pior que limpa trilho e corro na frente do trem

Claro que ele não ouviu a obra prima do teu “Grito de Alerta” (Gonzaga Jr)! – Se ele tivesse prestado atenção na deixaria sua Felicidade ir embora.

Primeiro você me azucrina, me entorta a cabeça
Me bota na boca um gosto amargo de fel
Depois vem chorando desculpas, assim meio pedindo
Querendo ganhar um bocado de mel
Não vê que então eu me rasgo, engasgo, engulo
Reflito e estendo a mão
E assim nossa vida é um rio secando
As pedras cortando e eu vou perguntando: até quando?
São tantas coisinhas miúdas, roendo, comendo
Arrasando aos poucos com o nosso ideal
São frases perdidas num mundo de gritos e gestos
Num jogo de culpa que faz tanto mal
Não quero a razão pois eu sei o quanto estou errado
O quanto já fiz destruir
Só sinto no ar o momento em que o copo está cheio
E que já não dá mais pra engolir
Veja bem, nosso caso é uma porta entreaberta
Eu busquei a palavra mais certa
Vê se entende o meu grito de alerta
Veja bem, é o amor agitando meu coração
Há um lado carente dizendo que sim
E a vida da gente gritando que não.

Dona Felicidade; volta pro Zé.
Muita Paz

Américo Canhoto: Clínico Geral, médico de famílias há 30 anos. Pesquisador de saúde holística. Uso a Homeopatia e os florais de Bach. Escritor de assuntos temáticos: saúde – educação – espiritualidade. Palestrante e condutor de workshops. Coordenador do grupo ecumênico “Mãos estendidas” de SBC. Projeto voltado para o atendimento de pessoas vítimas do estresse crônico portadoras de ansiedade e medo que conduz a: depressão, angústia crônica e pânico.

* Colaboração de Américo Canhoto para o EcoDebate, 17/11/2009

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