Governo encontra dificuldades para formalizar propostas à Convenção do Clima
Falta de definição sobre temas polêmicos e projeto parado no Congresso são alguns dos entraves
Verde desbotado – A dois meses da Conferência das Partes da Convenção do Clima (COP 15) na Dinamarca, organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil corre o risco de chegar ao encontro sem propostas concretas. Parte do gargalo está concentrado no Congresso(1), onde se encontra, desde o ano passado, o projeto do Executivo para o Plano Nacional de Mudanças Climáticas, com o objetivo de regulamentar medidas que o país quer colocar em prática. Reportagem de Danielle Santos, do Correio Braziliense.
Apesar da ameaça, os parlamentares acusam o próprio governo pela falta de articulação para apreciação do tema em tempo hábil. “Temos dois desafios a superar, que são a falta de tempo e a concorrência de outras matérias de interesse da base governista, como o projeto do pré-sal, por exemplo”, afirma o deputado Rodrigo Loures (PMDB–PR). “Chega a ser uma ironia do destino disputar justamente com o petróleo, que é um combustível fóssil e poluente”, ressalta o parlamentar. Ele também questionou o conteúdo da proposta brasileira para uma boa discussão na Dinamarca. “É um projeto bem intencionado, mas vago, superficial e sem compromisso com algumas metas. Em alguns pontos, apenas menciona que vai adotar medidas para a redução do desmatamento, mas não especifica como isso será custeado, qual a área medida e em que circunstâncias”, completa.
Polêmica
O texto foi encaminhado, no ano passado, pelo Executivo e ainda aguarda a instalação de uma comissão especial para ser apreciado na Câmara. Na avaliação do líder do PV na Câmara, deputado Sarney Filho (MA), o assunto é polêmico e não tem consenso nem entre a base aliada do governo. “Não há acordo porque são temas que envolvem o uso do solo, a pecuária e o desmatamento. E, sobre esses assuntos, o governo não sabe nem o que quer, porque fica entre tentar agradar à comunidade internacional e, por outro lado, relaxar as exigências do código florestal aos ruralistas, o que é um absurdo.”
Segundo Sarney Filho, o governo também está muito comprometido com alguns parcerios internacionais, como Índia e China, e evita criar uma saia-justa ao assumir uma meta objetiva de redução de emissões de gases poluentes. Além do Plano Nacional de Mudanças Climáticas, o governo quer ver aprovada uma lei que cria pelo menos mil cargos para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) atuarem no monitoramento, controle e recuperação de áreas degradadas.
1 – Reunião técnica
Fora do Congresso, o governo está se desdobrando para fechar uma proposta mais detalhada até o fim deste mês. A última reunião técnica entre membros do Ministério do Meio Ambiente e do Ministério da Ciência e Tecnologia ocorre ainda esta semana, antes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva bater o martelo para a proposta oficial. A promessa da equipe de Lula é que haja acordo entre os pontos polêmicos até o fim de outubro.
Desafio ambiental
* O governo promete:
Reduzir em 80% o desmatamento da Amazônia até 2020;
Distribuir benefícios e recursos dos mecanismos de REDD (Redução de Emissões para o Desmatamento e Degradação (REDD) entre os estados da Região Amazônica responsáveis pela recuperação e proteção da floresta;
Manter as taxas de emissão de poluentes iguais às de 2005, equivalente a 2,1 bilhões de toneladas.
* O que falta para a promessa se concretizar:
Aprovar o Plano Nacional de Mudanças Climáticas no Congresso;
Criar mil cargos para o Ibama e para o Instituto Chico Mendes; Atuar com mais independência financeira em relação aos países desenvolvidos;
Apresentar uma política objetiva para garantir ajuda internacional.
Difícil vai ser conseguir recursos
A postura do governo brasileiro em torno da questão ambiental e da falta de propostas concretas para serem apresentadas na Dinamarca em dezembro também desagrada aos especialistas. O gerente-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Ícone), Rodrigo Lima, foi categórico ao defender uma posição mais racional no que diz respeito à captação de recursos para viabilizar o plano brasileiro de enfrentamento às mudanças climáticas. “Temos ideias em reduzir o desmatamento e outras ações para fazer cumprir essa regra, mas de onde vai sair o dinheiro? Estamos muito focados na contribuição internacional, mas sem uma política de verdade não veremos a cor do dinheiro”, prevê.
Lima esteve no encontro preparatório para a convenção de Copenhague, realizado em setembro, em Bangcoc, que mostrou evidências — segundo ele — da indisposição dos países desenvolvidos em financiar projetos ambientais de economias em desenvolvimento sem uma política estruturada para o setor.
Emissões
Outra preocupação é quanto ao número divulgado amplamente pelo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, para a redução de emissões de poluentes em até 40% até 2020. Os dados — produzidos pelo Ministério da Ciência e Tecnologia — não passam de uma estimativa, pois a última atualização do inventário de emissão de gases consta de 1994. “Está mais que na hora de o presidente Lula bater na mesa e exigir algo concreto para que se tenha uma base mais oficial do que o Brasil pode fazer ou não”, afirma Lima.
Assim como Rodrigo Lima, Marco Fujihara, coordenador do Grupo de Mudanças Climáticas da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) também aposta em uma “independêcia financeira” do Brasil para conseguir atingir os índices de desmatamento desejados até 2020. “Teremos uma discussão inócua em dezembro se o Brasil não fizer um esforço drástico com as próprias pernas para reduzir o desmatamento, nossa maior causa da emissão de poluentes.”
COMISSÃO APROVA 36 REQUERIMENTOS
Deputados ruralistas e ambientalistas que compõem a Comissão Especial de Meio Ambiente da Câmara aprovaram ontem os 36 requerimentos dos parlamentares apresentando sugestões de nomes de participantes para audiências públicas futuras e os locais a serem realizadas essas reuniões. Os requerimentos acatados ontem serão a base para o desenvolvimento dos trabalhos. A comissão, criada pelo presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), tem como objetivo debater as “dezenas” de projetos que envolvem o Código Florestal. A partir de 11 de dezembro, os produtores que estiverem em desconformidade com a legislação vigente serão passíveis de punição.
EcoDebate, 22/10/2009
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