Pesquisadores brasileiros desenvolvem vacina contra doenças autoimunes
Infográfico do Correio Braziliense. Para acessar o infográfico no formato original clique aqui.
Pesquisadores brasileiros descobrem que substância produzida a partir do DNA de bactérias apresenta bons resultados contra males como distrofia muscular
Uma vacina desenvolvida para combater a tuberculose pode ser a esperança para portadores de doenças autoimunes, como a diabetes e a distrofia muscular. Patenteada pelo Laboratório de Imunoterapia Gênica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), a substância, testada em camundongos, foi capaz de reverter o processo pelo qual o organismo começa a destruir as próprias células porque não as distingue de agentes externos, como vírus e bactérias. Reportagem de Paloma Oliveto, do Correio Braziliense.
Inicialmente, a vacina gênica, que usa o DNA de bactérias, foi feita pelo professor Celio Lopes Silva, da Faculdade de Medicina, tendo como alvo apenas a tuberculose. Porém, os experimentos mostraram que ela teria muitas outras aplicações. “Para a tuberculose, a vacina funciona muito bem, em altas doses. Percebemos, no entanto, que, dependendo da quantidade, ela mudava a resposta do sistema imunológico. Em baixas dosagens, a vacina teve efeito anti-inflamatório”, conta a professora Arlete Aparecida Martins Coelho-Castelo, responsável pelo laboratório. Há sete anos, ela investiga vacinas gênicas.
Embora ainda não saiba exatamente o porquê de, em baixa dosagem, a substância desativar o sistema imunológico, a pesquisadora acredita que haja alguma ligação à estrutura da molécula de DNA. Arlete destaca que essa é a primeira vez, no mundo, que o resultado é alcançado. A pesquisa será publicada, em breve, numa revista internacional especializada.
O passo seguinte foi desenvolver modelos de vacinas gênicas para o tratamento de doenças autoimunes. Os melhores resultados, segundo Arlete, foram os relacionados à sepse, infecção geral no organismo desencadeada por agentes patogênicos. “Os resultados foram excelentes”, diz a pesquisadora. “A vacina controlou a infecção”, comemora. Já com a diabetes mellitus, o sucesso ainda não foi tão grande porque a droga usada para induzir a doença em camundongos, chamada STZ, destroi as células do pâncreas. “Nesse modelo (de diabetes), os efeitos são muito drásticos”, conta Arlete.
De acordo com a chefe do laboratório da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, a esperança é tentar controlar doenças inflamatórias, entre elas, as autoimunes, seja somente pela vacina ou com a terapia gênica associada a medicamentos. “Dependendo da doença, poderia representar a cura”, diz a cientista. Mas, como são multifatoriais, alguns desses males não seriam completamente combatidos somente com a vacina. Mesmo assim, nesses casos, ela significaria melhoria nas condições de vida dos pacientes, com menos dores e redução da quantidade de remédios que geralmente trazem muitos efeitos colaterais.
Boa notícia
Uma das pesquisas mais recentes orientadas por Arlete foi uma dissertação de mestrado que mostrou como a vacina gênica pode melhorar a qualidade do tratamento de portadores da distrofia muscular de Duchenne. Descrita pela primeira vez no século 19, pelo médico Guillaume-Benjamin-Amand Duchenne, a doença tem origem na deformidade no cromossomo X, não tem cura e provoca degeneração progressiva. “Os animais que receberam a vacina melhoraram muito. Houve diminuição da inflamação dos músculos e eles demoraram mais a desenvolver a doença. Quem nasce com essa alteração sofre efeitos drásticos e vive geralmente apenas até os 30 anos. E é uma vida muito sofrida. O efeito anti-inflamatório da vacina indicou uma melhora muito boa. É uma ótima notícia”, diz Arlete.
Mãe de um portador da doença de 31 anos, Edna Maria Soatto Pupin diz que os familiares das vítimas do mal de Duchenne estão sempre em busca de terapias que possam significar melhoria na qualidade de vida dos pacientes. “Eu sei que pouca coisa pode ser feita para o meu filho, mas quero ter alguma esperança de que é possível melhorar a condição dele, torná-la menos sofrível”, diz. Murilo apresentou os primeiros sintomas aos 5 anos, quando começou a ter dificuldades para correr. “Na época, a doença era pouco conhecida. Só se sabia que era progressiva, levava à cadeira de rodas e, depois, à morte. Era um diagnóstico horroroso”, diz Edna, que fundou a Associação de Amigos dos Portadores de Distrofia Muscular, em Ribeirão Preto.
Aos 18 anos, Murilo precisou usar respirador durante 24 horas por dia, equipamento do qual ainda depende. Ele fez traqueostomia, parou de andar e, segundo Edna, tem uma vida bastante limitada. “Mas, dentro dessas dificuldades, tentamos fazer com que tenha um dia a dia normal”, conta. Ela diz que está sempre em contato com pesquisadores, em busca de novas terapias. “É a esperança que move a gente”, ensina.
Segundo a professora Arlete Aparecida, o próximo passo é conseguir aprovação do comitê de ética para testar a vacina em pacientes humanos. “Infelizmente, ainda há muita burocracia. Deve demorar mais ou menos cinco anos”, calcula. Para a infectologista Ligia Raquel Brito, do Complexo Hospitalar Edmundo Vasconcelos, em São Paulo, a pesquisa da USP é bastante promissora. “É um avanço muito grande. Se realmente os cientistas descobrirem onde a vacina age, milhões de pessoas vão se beneficiar. Teoricamente, significaria a cura para várias doenças”, diz.
“Dependendo da doença, poderia representar a cura” – Arlete Aparecida Martins Coelho-Castelo, pesquisadora
EcoDebate, 20/10/2009
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