Anjos das árvores, artigo de Eduardo Athayde
Trecho preservado de Mata Atlântica, em São Paulo. Foto de arquivo
[EcoDebate] Quando, no início do século 20, Augusto dos Anjos, o mais original dos poetas brasileiros, narrou conversa entre pai e filho no poema “A árvore da serra”, colocava a ânsia poética, estado que permite os poetas sentirem a seiva das coisas, a serviço da preservação.
– As árvores, meu filho, não têm alma! É preciso cortá-la para que eu tenha uma velhice calma!
– Esta árvore, meu pai, possui minh´alma! Não mate a árvore, meu pai, para que eu viva!
Paraibano e ignorado pela crítica da época, Augusto dos Anjos (1884-1914) é hoje um dos mais admirados poetas brasileiros. As florestas, ignoradas, começam a ser entendidas pela crítica contemporânea, despertando interesses de atividades que vão muito além da madeira.
Um século depois do tempo de Anjos, sentindo as conseqüências das seivas perdidas, autoridades de 180 países reuniram-se em Bangcoc, Tailândia, iniciando um processo voltado à elaboração de um novo pacto global de combate às mudanças climáticas, visando substituir o Protocolo de Kyoto. Os serviços das florestas estão no foco dos debates.
Ações precursoras, inspiradas em poetas, começam a ser adotadas. Refletindo Oscar Wild, “cínico é aquele que sabe o preço de tudo e o valor de nada”, a Califórnia, que declarou-se oficialmente como Estado Verde, avalia o valor do habitat dos insetos e o valor dos seus serviços para a economia local.
A Guiana, pequeno país localizado num sanduíche entre a Venezuela e o Brasil, com menos de um milhão de habitantes e 80% do território coberto por uma floresta amazônica intacta – maior do que a Inglaterra -, firmou o primeiro contrato do mundo com fundo inglês, para valorizar as florestas, recebendo pelos serviços por elas prestados, como a geração de chuvas, regulação climática e de regimes hídricos para agricultura, além da estocagem de carbono. A floresta amazônica gera a chuva que cai nas vastas áreas de soja e cana-de-açucar nos estados do Sudeste e Centro-Oeste.
Se conseguimos valorar os serviços do Google para a comunidade global, porque não os serviços das florestas tropicais? A água da torneira, vinda das bacias hidrográficas, protegidas e recarregadas pelas florestas, a temperatura ambiente, a fertilidade dos solos, a polinização e o viço dos nutrientes alimentares, são serviços prestados pelas florestas, não valorados.
Enquanto florestas agradecem a Anjos por ajudar os homens entenderem a importância dos seus serviços, agradecemos aos poetas por garimpar a matéria-prima da realidade.
Informado do falecimento prematuro de Augusto dos Anjos, aos 30 anos, desconhecido pela inteligentzia crítica da época, o contemporâneo Olavo Bilac, autor do Hino da Bandeira, exclamou: “Fez bem em morrer, não se perde grande coisa”. Do céu de Anjos, as lágrimas de Bilac, arrependido, ajudam a molhar a terra e a rebrotar ‘A verdura sem par destas mata’ – devastadas -, registrada nos versos devotados ao Pavilhão Nacional.
Eduardo Athayde é diretor do WWI-Worldwatch Institute. Email: eduardo{at}uma.org.br
EcoDebate, 24/09/2009
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Apelo mesmo como uma espécie de SOS. Os pardais e rolinhas sumiram completamente do Rio de Janeiro, capital. Não se vê nenhum, há algum tempo. Ainda não consegui a explicação; já apelei para algumas organizações e as respostas foram inconsistentes. Qual será o motivo? Como saber? Obrigada.