Código Florestal brasileiro ou Código Ambiental estadualizado? artigo de Albino Gewehr
[EcoDebate] O Código Florestal brasileiro é alvo de intensa movimentação legislativa no Congresso Nacional. Apesar do seu rigor, acumula insucessos, principalmente junto aos grandes proprietários rurais, que, ao arrepio da lei avançam com a soja e o gado na Amazônia e com imensas áreas de eucalipto no Pampa. . Mas, com o aumento das pressões nacionais e internacionais de combate ao desmatamento , principal emissor de gases do efeito estufa no Brasil, cresceu também a pressão para regularizar ambientalmente as propriedades.
Já os agricultores familiares demonstram maior compromisso social, preservando e recuperando áreas nas últimas décadas em todos os biomas, inclusive no Amazônico.
Para tirar esses “grandes” produtores e empresas rurais da ilegalidade, começou uma corrida em torno de mudanças nos limites e regras impostas pela legislação ambiental. Essa corrida foi intensificada no inicio de 2008, em reação ao Ministério do Meio Ambiente (MMA) que editou o Decreto 6.321, que prevê medidas de controle do desmatamento da Amazônia. A partir do decreto, a pasta ambiental passou a divulgar a lista de municípios que mais desmatam no país e autorizar o embargo de atividades econômicas em áreas degradadas.
Em julho de 2008, uma nova medida aumentou a pressão sobre os produtores rurais. Uma norma do Banco Central, aprovada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), obrigou o produtor rural da Amazônia a se regularizar ambientalmente para ter acesso ao crédito rural. Naquele mesmo mês, o governo federal editou o Decreto 6.514, regulamentando a lei de crimes ambientais (Lei 9.605/98) e tornando as penalidades mais severas.
Os produtores rurais e agricultores familiares se rebelaram contra o decreto que determinava o prazo até dezembro de 2008 para que os proprietários de terra se regularizassem junto aos órgãos ambientais, sobretudo no que dizia respeito à averbação de áreas destinadas à reserva legal. A pressão foi tão intensa que o ministério do Meio Ambiente, recuou e reeditou o decreto, estendendo o prazo até dezembro de 2009, por meio do Decreto 6.686/2008.
Na tentativa de solucionar parte do problema, o Ministério do Meio Ambiente em maio de 2009, fechou acordo com representantes dos agricultores familiares, trabalhadores rurais e campesinos (Fetraf-CUT, Contag e Mpa) . Como resultado dessa parceria, no dia 05 de junho o Presidente Lula enviou mensagem ao Congresso Nacional, apresentando o PL 5487/2009 que cria a política nacional de serviços ambientais e no dia 22 de julho, os ministros Carlos Minc do meio Ambiente e Guilherme Cassel do Desenvolvimento Agrário (MDA), assinaram três instruções normativas para dar tratamento diferenciado à legislação ambiental para a agricultura familiar.
Foram determinadas regras específicas para regularizar a situação dos agricultores familiares, facilitando o processo de averbação da reserva legal, abrindo a possibilidade para o produtor contabilizar as áreas de preservação permanente no percentual de reserva legal, ampliaram o prazo para regularização das áreas dos pequenos com até 4 módulos fiscais, além da previsão de pagamentos por serviços ambientais.
Já o Projeto de Lei 5487/2009, que institui o pagamento por serviços ambientais, está na pauta da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados e deve ser apreciado ainda em agosto. O projeto tramita apensado ao PL 792/2007, de autoria do Deputado Anselmo de Jesus (PT-AM).
As medidas, no entanto, desagradaram aos grandes produtores rurais, que defendem isonomia de direitos e extensão das normas também para as grandes propriedades.
Recentemente grandes redes de supermercados decidiram boicotar produtos oriundos destas áreas de expansão agrícola, gerando um grande impacto , fazendo com que houvesse reversão no discurso da CNA e de representantes do Ministério da Agricultura, acoplaram desmatamento zero no discurso, mas continuam avançando sobre a mata e discursando em nome dos agricultores familiares para tentar salvaguardar seus interesses.
No Congresso atuam com movimentação política que procura adequar a legislação, a CNA e ruralistas ruralistas querem flexibilizar legislação e anistiar crimes ambientais. Entre os projetos que modificam o Código Florestal, o mais polêmico é o PL 5367/2009, de autoria do deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), que institui o Código Ambiental Brasileiro e estabelece uma nova Política Nacional de Meio Ambiente ( este PL foi protocolado ás pressas no dia 03/06/2009 com clara intenção de confundir os agricultores familiares e a opinião pública).
A proposta não só revoga a Lei 4.771/1965, que criou o Código Florestal, como também anula a lei que estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6938/1981); o decreto-lei que dispõe sobre o controle da poluição do meio ambiente provocada por atividades industriais (Decreto-lei 1413/1975); e o Decreto 4297/2002, que estabelece critérios para o Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE). O projeto altera ainda artigo da lei de crimes ambientais (art. 7 da Lei 9.605, 1998), que trata das penas restritivas de liberdade, e o artigo 22 da Lei 9985, 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Lei do Snuc), no que se refere à criação dessas unidades.
A principal proposta do projeto ruralista é o chamado pacto federativo ambiental descentralizado, que pretende dar autonomia aos estados para que eles estabeleçam leis ambientais específicas. Esse pacto, basicamente, retira do âmbito federal a determinação de estabelecer os limites de área que devem ser preservados e passa para os estados a autonomia de decidir sobre as áreas que não podem ser desmatadas.
O projeto estabelece ainda mudanças de competências e conceitos da atual legislação. Ele acaba com o conceito de reserva legal da propriedade e de APPs e determina que a preservação das áreas será delimitada por bioma e não mais por propriedade ou microbacia hidrográfica. A proposta retira poderes normativos e deliberativos técnicos do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) e estabelece prazo de 60 dias para o licenciamento ambiental, atrelando o não cumprimento desse prazo à aprovação automática da licença.
O PL 5367 tramita na Câmara apensado ao PL 1876, de 1999. Também tramitam em conjunto com eles o PL 4524/ 2004, o PL 4395/2008 e o PL 5226/2009. Esse último, proposto pelo PT, traz mudanças que seguem de acordo com a direção do governo nas negociações com os agricultores familiares.
A proposta do PT modifica ainda a definição e o conceito do que hoje se admite como reserva legal. De acordo com a proposta, essa reserva passa a ser denominada de área de reserva e uso sustentável. A intenção é deixar mais claro o fato de que nessa área é permitida a atividade econômica, desde que use de modo sustentável, ou seja, preservando os recursos naturais.
Todas essas propostas serão discutidas em comissões ordinárias e em uma comissão especial antes de seguirem para votação em plenário na Câmara Federal e depois no Senado.. Será imprescindível aglutinar as propostas e respeitar o modo de vida consolidado na agricultura familiar, sem ceder a pressão política dos latifundiários e empresários rurais que gostariam de legislações estaduais onde tem mais influência. Em vários estados começam a pipocar propostas alinhadas estrategicamente com esta pretensão.
Entidades deverão reforçar mobilizações pela aprovação do PL 5487, buscando a aglutinação do debate em torno desse, com a articulação de eventos sobre o tema, manifestações junto aos deputados , articular forte presença nos debates no Congresso Nacional e enviar correspondências aos parlamentares. Este é o momento de valorizar quem preserva e ver quem está realmente defendendo os interesses dos agricultores familiares.
Aguardo com grande expectativa, o posicionamento dos parlamentares e acredito que os “interesses” de alguns milhares de latifundiários não se sobreponham ao de 4,4 milhões de agricultores familiares. As entidades de representação dos agricultores familiares, trabalhadores rurais e campesinos certamente acompanharão com extremo zelo este debate, pois será muito esclarecedor clarear posições em relação aos rumos dos 20 milhões de votos que lideram.
Colaboração de Albino Gewehr – Técnico Agrícola, Assessor técnico da Fetraf/Brasil – CUT
EcoDebate, 19/08/2009
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