BA: O povo disse não ao projeto Pedra de Ferro
Em quatro audiências públicas consecutivas, realizadas entre os dias 28 e 31 de julho, o povo da região atingida pelo projeto Pedra de Ferro, que vai desde Malhada do São Francisco até Ilhéus, mostrou sua rejeição ao empreendimento. Mais de 5 mil pessoas participaram das audiências promovidas pelo Instituto do Meio Ambiente (IMA) para discussão do processo de licenciamento de localização do complexo minerário da Bahia Mineração Ltda. Em Guanambi, Caetité, Malhada e no distrito de Guirapá do município de Pindaí, os trabalhadores do campo e as comunidades tradicionais, que estão entre os principais afetados pelo projeto, manifestaram de forma clara o seu “NÃO”.
Antes e durante os eventos, a Bahia Mineração Ltda. (BAMIN) procurou forjar uma imagem de empresa responsável e preocupada com a questão sócio-ambiental. Mas sua verdadeira face ficou à mostra quando na apresentação do empreendimento escamoteou os impactos negativos, e superdimensionou os supostos benefícios do negócio. As empresas SETE – Soluções e Tecnologia Ambiental, e F&H Engenharia Ambiental, foram contratadas pela BAMIN para a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) acerca da adutora e da mina Pedra de Ferro. “As duas empresas, ao invés de apresentar os estudos com lisura e imparcialidade, se comportaram como verdadeiros garotos-propaganda, fazendo lobby para a BAMIN. Principalmente a SETE que, em nenhum momento apresentou de forma clara os impactos irreversíveis como perda de flora e supressão de comunidades tradicionais”, comenta Diacísio Leite, da Comissão Pastoral da Terra – CPT Bahia.
Rebaixamento do lençol freático
Foram recorrentes as intervenções do público acerca do rebaixamento em 300 metros do lençol freático. Nesse aspecto, a BAMIN tentou diminuir a magnitude do impacto, desconsiderando que em longo prazo esta ação poderá transformar a região em um deserto, perdendo a possibilidade até mesmo de recorrer a poços por conta da falência dos aqüíferos. Ressalta-se que o rebaixamento não deve ser pensado isoladamente. Existem outros fatores que devem ser levados em consideração, como a diminuição dos índices pluviométricos, o aquecimento global e o fato de o local solicitado para a mina está na principal área de recarga desses aqüíferos.
Poder público amplamente favorável
O poder público das esferas municipal, estadual e federal esteve presente nas audiências. “O posicionamento do IMA demonstrou, por vezes, parcialidade confundindo-se com a própria BAMIN”, preocupa-se Hundira Cunha, agente da CPT na região Sul/Sudoeste. Existe uma dúvida sobre qual dimensão o IMA irá dar às inquietações e protestos presentes nas falas do povo durante as audiências, que será base para a concessão ou não da licença de localização, avaliada pelo Conselho Estadual de Proteção Ambiental (CEPRAM). “Os poderes públicos municipai, tanto o legislativo como o executivo, infelizmente e contrariando as falas da população, intervieram praticamente colocando a venda as suas cidades, utilizando como moeda de troca propostas que não passam de medidas compensatórias, fazendo o jogo da BAMIN, que ao invés de trazerem benefícios para o povo são, na verdade, projetos eleitoreiros”, desabafa Hundira.
Comoção e um não dito de diferentes maneiras
Nas quatro audiências, o povo disse NÃO ao projeto da mineradora. Houve momentos de grande comoção, como na fala do Sr. Daniel, da comunidade de Lajes do Sapato no município de Guanambi, quando pediu aos “senhores” da BAMIN “um pouco de humanidade, que os senhores sejam um pouco humanos, eu sei que esse projeto vai ser implantado passando por cima de todo mundo.”
Em Caetité o Sr. José Fernandes, da comunidade João Barrocas, atentou para o problema da falta de água e da perda da possibilidade de utilização de terras comuns, nos campos dos gerais que foram cercadas pela BAMIN.
Em Malhada, o quilombola Osmar, do quilombo Pau D´arco e Parateca, destacou a importância do Rio São Francisco para a as comunidades ribeirinhas e afirmou que estão dispostos a lutar de qualquer forma para defender o Velho Chico.
Mais de 2.000 pessoas na audiência de Guirapá
No povoado de Guirapá, no município de Pindaí, diretamente afetado pelos rejeitos do empreendimento, a participação popular superou a casa dos dois mil participantes, segundo cálculo da Policia Civil. Em Guirapá, a audiência publica só ocorreu devido a uma solicitação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, uma vez que não havia sido contemplado pelo calendário das audiências públicas, O comparecimento de populares contrários ao empreendimento na audiência de Guirapá era tão maciço que o prefeito de Pindaí e os vereadores presentes preferiram se calar. A presença da Promotora Pública Luciana Khoury, do Ministério Público Estadual, deu maior segurança à população e esclareceu quanto ao verdadeiro caráter da audiência, que até então era apresentado pelo IMA apenas como um momento parar tirar dúvidas. Drª Luciana afirmou que as audiências não seriam definitivas, ressaltando que o NÃO dito pela população teria que ser considerado.
A força da participação popular, a forma natural de manifestação do povo que, embora não tendo o conhecimento técnico dos assessores da BAMIN, expressaram através de poesias, de musicas e a colocação nas mesas das audiências de produtos da terra como verduras, alho, abóbora e cachaça, o potencial produtivo da região. Unido na convicção que o minério não trará benefícios para o povo, mas ao contrário, irá concentrar ainda mais a riqueza através da usurpação dos recursos naturais gerando fome e miséria.
* Informe da Comissão Pastoral da Terra – Regional Bahia, publicado pelo EcoDebate, 06/08/2009
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Olá! Considero muito importante a mobilização popular a respeito do projeto Pedra de Ferro. Porém, há um desconhecimento total ou parcial no que diz respeito a rebaixamento do nível freático. É uma atividade praticada em várias minas de ferro do Brasil desde a década de 80. Impactos nas nascentes podem haver mas são compensadas com a própria água subterrênea que é bombeada para se rebaixar o freático. Além disso, a proporção entre o volume de água que sai pelas nascentes é muito menor que a bombeada da mina. É uma atividade sustentável mas pelo fato de ser desconhecida pela maioria é muito mal vista. Para o pleno entendimento é preciso um conhecimento de hidrogeologia, que é a ciência que trata das águas subterrânes. Uma mineração de ferro produz muitos impactos como qualquer empreendimento de grande porte. No meu entendimento, o rebaixamento é um dos menos nocivos.
Cordialmente, Mário.