Especialista adverte que a refinaria da Petrobras poderá ser ‘engodo’ no MA
O professor Manoel Carlos Bordalo, engenheiro químico, especialista em gerência petroquímica, adverte que a Refinaria Premium da Petrobras, que deverá ser construída em Bacabeira, poderá se transformar em um “grande engodo industrial que não trará benefício algum para o povo do Maranhão da forma como estão anunciando”. Professor Bordalo faz este alerta em entrevista concedida ao blog de Robert Lobato, na versão eletrônica do Jornal Pequeno.
A governadora Roseana Sarney (PMDB) assinou decreto, no dia 10 de julho passado, que declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, uma área de 20 km² em favor da Petrobras para a construção da Refinaria Premium, no município de Bacabeira.
Muito se fala nos benefícios que esse empreendimento bilionário promete trazer para o desenvolvimento industrial do Maranhão, assim como “dias melhores” para a população do ponto de vista da geração de empregos, renda e riqueza; afinal, são US$ 20 bilhões (vinte bilhões de dólares) em investimentos e a promessa de que estará em pleno funcionamento até 2014.
Contudo, há opiniões que confrontam com o discurso oficial de “boas novas” proclamado pelo governo do Maranhão. Opinião como a do professor Manoel Carlos Bordalo, engenheiro químico, especialista em gerência petroquímica, que fala com experiência de quem trabalhou no pólo petroquímico de Camaçari (BA).
Roberto Lobat, em seu blog na página eletrônica do JP, conversou com o professor Bordalo sobre vários aspectos do projeto de implantação da Refinaria Premium no município de Bacabeira, a 50 km da ilha de São Luis.
Na avaliação do especialista, há grandes possibilidades de estarmos diante de mais um “grande engodo industrial que não trará benefício algum para o povo do Maranhão da forma como estão anunciando”.
A entrevista, além de polêmica, cria a necessidade de instituições como as universidades, Assembléia Legislativa e a sociedade civil organizada, debaterem e acompanharem de perto esse empreendimento da Petrobras.
A seguir, os principais pontos da entrevista com o professor Manoel Carlos Bordalo.
Um investimento de US$ 20 bilhões – É algo que representa um pólo petroquímico aos moldes do que existe em Camaçari (BA) em termos de recursos humanos, por exemplo. Considerando que a nossa realidade, em função do modelo educacional das nossas universidades e escolas técnicas, que não têm cursos como o de engenharia de petróleo, engenharia química, entre outros afins, podemos concluir que toda a mão-de-obra nessas áreas virá de outras partes do país.
Precisamos ter mais responsabilidade ao criar expectativas para a nossa juventude com promessas fáceis de “dias melhores”. Já vimos isso em outros momentos da história do Maranhão em relação a outros mega projetos. O resultado foi que não houve abertura de novos postos de trabalho aos jovens maranhenses por conta da falta de especialização técnica.
Quem não se lembra de projetos como o da Siderúrgica do Carajás? Chegaram a mandar toda uma turma do curso de Engenharia para a cidade fluminense de Volta Redonda, na década de 70, e até hoje nunca foi implantada no Maranhão. Agora estamos falando em um cifra estratosférica na ordem de 20 bilhões dólares! Nunca houve no país um investimento dessa magnitude na área de petróleo, a não ser em perfuração do pré-sal, mas na área de refino, nunca.
Poucos benefícios concretos – Como se trata de projeto pioneiro, temos que fazer as seguintes ponderações: (1) Alto custo e (2) A demanda de tempo para se concretizar. É muito pouco provável que até antes de 2014 o projeto esteja plenamente implantado como andam prometendo. Outra coisa que precisa ser dita é que a Refinaria Premium não trará os benefícios anunciados pelas autoridades responsáveis pela condução do projeto. Para que esses benefícios (empregos, impostos, riqueza, renda, investimentos etc) se transformassem em realidade, seria preciso que a Premium fosse uma refinaria aos moldes do que são a Reduc (RJ) e a Relan (BA), só para citar essas duas refinarias.
Por que afirmo que a Refinaria Premium não trará os benefícios propostos? Ora, o fato de um empreendimento desde porte ser concebido exclusivamente para exportação (Lei Kandir), não vai exigir a geração de uma cadeia produtiva e nem o estado está discutindo essa questão. Pode-se estar diante de um novo engodo de desenvolvimento industrial aos moldes de grandes projetos tipo o Consórcio Alumar e Vale. O pólo do Carajás previa desenvolvimento da região. E o que ocorreu? Nada, a não ser o fato de ter ficado com a melhor parte do porto do Itaqui. Nunca trouxe a siderúrgica.
Vocação pela agroindústria – As autoridades têm que levar o Maranhão mais a sério. Isso significa que não podem sair por aí vendendo sonhos para a população em cima de projetos que em nada têm a ver com a nossa vocação desenvolvimentista. O Maranhão é vocacionado para a agroindústria, mas as nossas classes dirigentes insistem em outras áreas. O pior que essa refinaria está sendo idealizada a partir da produção de petróleo através do pré-sal. Isso é um absurdo, pois o pragmatismo em geologia não existe, existe hipótese. Então é um risco, para não dizer irresponsabilidade, prever investimento da ordem que está sendo pensado para a Refinaria Premium sem está produzindo, criando uma expectativa giganstesca para um povo sofrido como o do Maranhão.
Responsabilidade da Petrobras e do Ministério das Minas e Energia – Gostaria que a Petrobras e o Ministério das Minas e Energia apresentassem a sociedade o Projeto Básico (Basic Disign) desse investimento. Onde estão os estudos e pareceres técnicos que devem preceder o início de uma refinaria do porte da Premium? Por que a academia não tem participado dessa discussão? Se não foi chamada é porque, ou a Petrobras e Ministério subestimam os nossos cientistas, ou sabem que o projeto, não tendo nada a ver com a realidade do estado, ficam constrangidos em chamá-la e correr de o risco de ter que explicar o inexplicável.
Teriam, por exemplo, que dizer que o projeto terá que construir uma dutovia de 70 km de extensão por 90m de largura. Ora, se nunca duplicaram sequer BR 135, que é uma obra muito mais simples, irão construir a construir uma dutovia ligando Bacabeira a São Luis até 2014?
Gostaria ainda que a Petrobras, através do Cenpes, o centro tecnológico de excelência da estatal, informasse como está o andamento para a aquisições/construção de equipamentos altamente sofisticados como 660 bombas de fluídos, 140 reatores, 140 torres de destilação, 660 vasos que eles defiram as especificações e muito mais.
Outra coisa que chama a atenção é o fato da Petrobras não dá qualquer destaque à Refinaria Premium no seu Plano de Negócios 2009/20139, que prevê investimentos de US$ 174,4 bilhões. Se, por exemplo, acessarmos o site da estatal, não encontraremos absolutamente nada sobre a Refinaria Premium. Algo estranho, já que estamos falando de um projeto de 20 bilhões de dólares.
Nesse sentido, penso que é muito grave essa questão da Refinaria Premium da forma como está sendo colocada. Seria profícua uma ampla discussão com os vários setores da sociedade para que não pairam quaisquer dúvidas sobre os objetivos e metas do projeto. Caso contrário, correremos sério risco de está vivendo uma ilusão no valor de 20 bilhões de dólares.
Reportagem do Jornal O Pequeno, MA, enviada pelo Fórum Carajás.
EcoDebate, 22/07/2009
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