Mineração ferro no sudoeste da Bahia causa conflito de água
Primeiro a indústria, depois a população - Municípios da região sudoeste que sofrem com a escassez de água tem
duto aprovado para fins industriais*
Uma Outorga Prévia concedida pela Agência Nacional das Águas (ANA) à empresa que explorará minério de ferro na região de Caetité corrsponde a uma inversão total das prioridades no uso da água. Enquanto a população dos municípios do Sudoeste da Bahia sofre com a falta d’água, a empresa terá o direito de desviar do rio São Francisco uma quantidade quatro vezes maior do que disponível para consumo humano.
A Empresa Bahia Mineração (BAMIN) chega ao sudoeste baiano com promessas de gerar emprego e riquezas na exploração da reserva de minérios de ferro em solos dos municípios de Caetité e Pindaí. O início das atividades do empreendimento, no entanto, ameaça aumentar o já alarmante déficit no fornecimento de água para consumo humano na região.
A BAMIN é uma empresa com 100% de capital estrangeiro, pertencente na atualidade a dois grandes grupos: a Zamin Ferrous, do investidor indiano Pramod Agarwal, e ao grupo Eurasian Natural Resources Corporation – ENRC, empresa com ações negociadas na bolsa de valores de Londres, sediada no Cazaquistão e 6ª maior exportadora de minério de ferro do mundo.
O empreendimento que está sendo instalado na região será formado por um sistema de captação de água industrial e linhas de transmissão de energia. A mina e a usina de concentração terão uma logística de transporte financiada pelo Estado, com mais de 400 km de ferrovia (a Leste-Oeste realizada pelo PAC) e um terminal de embarque privativo offshore ligado a uma retro área, em Ponta da Tulha, dentro da Área de Proteção Ambiental Lagoa Encantada, em Ilhéus.
Para atender ao uso exclusivo da mineração, dispensando o uso humano, a empresa entrou com um pedido de Outorga Prévia junto a ANA – Agencia Nacional de Águas que a concedeu, através da Resolução nº 520 de 06 de Dezembro de 2007, para retirada do Rio São Francisco no município de Malhada. Segundo a Outorga Prévia, a vazão máxima será de 3.588, m³ por hora, correspondente a 996,67 litros de água por segundo, com um sistema de bombeamento operando durante 24 horas todos os dias do ano, alcançando um volume de água de 86.112 m³ por dia. Durante um ano, o volume retirado do rio São Francisco seria de até 31 milhões de metros cúbicos.
Segundo dados da Empresa Baiana de Águas e Saneamento – EMBASA, um habitante consome uma média de 120 litros de água por dia ou o correspondente a 0,12 m³. O volume outorgado a ser retirado pela BAMIN em um dia (86.112 m³) seria o suficiente para abastecer uma cidade com 717.600 (setecentos dezessete mil e seiscentos) habitantes.
Ainda segundo a EMBASA nos municípios em que a empresa opera (Malhada, Iuiu, Palmas de Monte Alto, Guanambi, Pindaí, Caetité, incluindo os distritos de Morrinhos, Mutans, Pilões e Brejinho das Ametistas) e que estarão na rota de passagem do duto da empresa BAMIN, a produção atual de água ou a oferta hídrica (disponível ao consumo humano) é de 18.265 m³ por dia.
Considerando a população atual desses municípios e distritos, para atender a demanda atual, seria necessário um volume de água correspondente a 24.670 m³ por dia. O déficit, portanto, é de 6.405 m³ de água por dia.
De acordo com os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) a estimativa é que nos próximos 20 anos a população dos municípios citados deva chegar ao número de 267.655 habitantes, precisando consumir um volume de 32.118,6 m³ de água por dia.
Vale lembrar que o volume de água outorgada pela ANA à BAMIN é de 86.112 m³ por dia e que esse duto vai passar na frente de muitas portas de famílias que já sofrem com a falta de água. Parece claro a inversão das prioridades para uso da água, enquanto a legislação diz que primeiro devem ser atendidas as necessidades humanas, segundo os animais e terceiro os usos industriais, no sudoeste baiano as prioridades se invertem.
Frente a toda esta logística e perspectiva de implantação, os problemas na fase de estudo já começam a influenciar na vida da população local, a exemplo da comunidade de Antas Velhas, onde 38 famílias foram retiradas pela BAMIN. Esta comunidade viu seu modo de vida, construído há gerações, ser destruído em nome de um projeto que mais uma vez atende interesses de poucos. Expropriados de sua terra, aumentarão as massas sub-urbanizadas nos municípios da região.
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Na comunidade de João Barroca um poço perfurado pela mesma empresa entre duas nascentes que abastecia mais de 500 famílias da localidade, após um período de bombeamento foi diminuindo gradativamente o nível da água no lençol freático secando definitivamente a nascente. Por sua vez, a empresa não interrompeu o bombeamento e ainda se recusou a destinar a pouca água do poço para saciar as necessidades básicas das famílias.
A implantação da empresa, não diferente de outros locais atrairá para região um expressivo número de pessoas em busca dos prometidos empregos, o que por sua vez ocasionará um aumento populacional e com ele os problemas sociais em municípios que já vivem em situações precárias de saúde, educação e principalmente de abastecimento de água.
Diante do atual estado de degradação que passa o Rio São Francisco e no momento em que muitos países no mundo discutem e sofrem a escassez de água, no Sudoeste da Bahia se permite que a transformem em lama inútil ao consumo humano e animal.
* Informe da Comissão Pastoral da Terra – Regional Bahia
[EcoDebate, 15/06/2009]
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