Setores agroexportadores, estado e licenciamento ambiental, artigo de Mayron Régis
[EcoDebate] O melhor dos mundos para os técnicos do governo federal pode não ser o melhor dos mundos para os políticos do Partido dos Trabalhadores, porque os resultados de superávit primário no Brasil dependem cada vez mais da exportação de produtos agrícolas e semi-elaborados para países capitalistas desenvolvidos e em desenvolvimento e porque os setores responsáveis pela pauta de exportação negam todos os direitos sociais e ambientais da sociedade brasileira que perduram por mais de vinte anos.
A crescente influência dos setores agroexportadores no cenário político brasileiro, como se evidencia nas recentes votações tanto a nível federal como a nível estadual, resulta do aquecimento da demanda de commodities e do arrefecimento em torno das políticas públicas como plataformas de democratização da sociedade em seus escaninhos mais retrógrados.
Os setores agroexportadores vão à praça pública, mas sem que a sociedade brasileira esteja presente para dar seu aval ou não, para melindrar o aparato jurídico-administrativo e filosófico que encampou e que encampa as demandas sociais, econômicas e ambientais de setores menos privilegiados e historicamente excluídos.
Seguindo uma tendência totalitária da vida moderna, os setores agroexportadores querem virar as páginas da história rapidamente e assim, quem sabe, recomeçá-la de uma página em branco ou remontá-la com trechos apócrifos. A boca enche ao conjurar verdades cientificas tais como os memorandos verbais do ministro da agricultura Reinold Stephanes e da senadora Kathia Abreu que execram o código florestal e etc.
De algum lugar do país, o ministro e a senadora defendem o Estado mínimo quando se refere à defesa do meio ambiente e o Estado máximo quando se refere a incentivos fiscais para os produtores rurais como se fossem versões tupiniquins de um santo-liberal europeu ou americano do pau-oco.
O Estado brasileiro sempre foi mínimo na defesa do meio ambiente e das comunidades tradicionais e ao reduzir as áreas de reserva legal e de preservação permanente como fez o governo de Santa Catarina e querem fazer na Amazônia se minimiza a presença do Estado para que fique imperceptível a olhos vistos. A miniaturização do Estado possibilita que ele caiba na mão, no bolso ou na carteira. Quanto menor, melhor ele fica de ser manuseado ou ser esquecido.
Ao minimizar o Estado, os políticos delegam funções à iniciativa privada que foge da sua competência ou faz com que ela sobreponha a sua presença em um terreno público. Em muitos casos de licenciamentos de empreendimentos agropecuários, que é a nossa pedra de toque, os empreendedores desferem seu argumento sobre as comunidades de que seu comparecimento naquela cidade e naquela região rifa a negligência secular do Estado.
A total inexistência de informações sobre a origem do empreendedor e a viabilidade do seu empreendimento pouco incapacitam o licenciamento ambiental no entender do Estado. A súbita ousadia de um empresário em investir seu dinheiro em uma região desconhecida confere à sua personalidade o dilema do benfeitor que antes de tudo quer ver o bem da sociedade.
No caso do Maranhão e de outros estados de interesse do agronegócio, essa súbita ousadia de um ou outro empresário, de investir seu dinheiro em empreendimentos agropecuários com titularidade da terra duvidosa, anseia por apoio e investimentos do Estado. O apoio e os investimentos solicitados ao Estado para negócios duvidosos acabam sendo as melhores saídas que grupos encastelados na estrutura estatal encontraram para apoderarem dos recursos públicos.
O empreendimento de cultura mecanizada de grãos com aproveitamento da lenha para a produção de carvão, na fazenda Nossa Senhora Aparecida, município de Alto Parnaíba, sul do Maranhão, da empresa Agroflorestal Alvorada, durante audiência realizada no dia 01 de abril, apresentou como documentação de titularidade de terras certidões de usucapião. Essas certidões se referem a áreas de mais de 4.000 hectares e mais de 400 hectares. O Sr. Lauro Castilho e a Sra. Regina Castilho entraram com uma ação rescisória no Tribunal de Justiça contra a decisão do Juiz da comarca de validar essas certidões.
O Fórum Carajás havia solicitado à Secretaria de Estado do Meio Ambiente o estudo de impacto ambiental do empreendimento e a marcação as audiências. A organização foi surpreendida pela marcação da audiência pro dia 01 de abril de 2009 sem que tenha sido comunicada com antecedência. Por essa razão foi pedido o cancelamento da audiência.
Outros empreendimentos agropecuários tiveram suas audiências contestadas como o do senhor Euclides de Carli que pretende plantar soja. A audiência pública em Tasso Fragoso foi caracterizada pela assistente social da prefeitura Denise Privado como “uma audiência medíocre somente para cumprir exigências formais. EIA sem o município sequer saber quem fez e quando foi feito. Estudo que só possui dados econômicos, e poucas informações de biólogos e profissionais da área social”.
Na outra audiência que aconteceria em Balsas, a Comissão Pastoral da Terra e outras organizações locais suspenderam a sua realização por não ter tido condições de analisar o estudo em menos de uma semana. Sentados com os representantes da SEMA (Secretaria de Estado do Meio Ambiente), os integrantes da CPT exigiram a documentação das áreas do empreendimento do senhor Euclides de Carli para conferir a sua veracidade.
Segue um relato de Urubatan, assessor da CPT Balsas:
Sentimos, no saguão da Câmara de Balsas, a presença de uma equipe bem articulada e determinada a atender os interesses de representantes do agronegócio. Afirmamos isso, porque a Audiência Pública que seria realizada pela SEMA no dia 03 de abril de 2009, havia sido solicitada pela CPT de Balsas, em meados de 2007. Não bastasse a solicitante não ter sido comunicada pela referida Secretaria de estado, recebe cópia em preto e branco do EIA/RIMA com um prazo de apenas 7 dias juntamente com o convite do interessado no desmatamento.
Não houve comunicação a Secretaria de Meio Ambiente de Balsas, segundo assessor da Secretária desta pasta. O Conselho Municipal de Meio Ambiente de Balsas, por sua vez, não recebeu nenhum comunicado. A ONG Núcleo Cerrado Vivo, que atua nessa região, também, não recebeu convite para participar da Audiência.
Mesmo diante desses fatos significativos, para citar apenas alguns, que por si só já justificam o adiamento da audiência, os funcionários da SEMA além de investir sobre os representantes das organizações locais, ameaçaram processar a própria Presidenta da Câmara por ela ter se sensibilizado com as entidades e participar do pedido de cancelamento da Audiência Pública.
A atitude da SEMA, em Balsas revelou que há uma preocupação excessiva com liberação de licença desmatamento ou legalização de áreas já degradadas.
Em reunião na sede da Diocese de Balsas das entidades com a SEMA, apresentamos, aos representantes dessa Secretaria, foto de satélite e falamos sobre o vídeo que demonstra a devastação das matas dentro da APA – Cabeceira do Rio Balsas e nas margens de todo o Rio Balsas e, contudo, não vimos nenhuma manifestação da SEMA no sentido de fiscalizar as áreas apresentadas, e muito menos, de processar os infratores. A secretaria apenas confirmou que era de responsabilidade dela a preservação da APA.
Ouvimos ao final da reunião que mais cedo ou mais tarde pacificamente ou com a presença da polícia a audiência será realizada e que buscássemos vias legais para impedir o desmatamento.
Mayron Régis, jornalista, Assessor Fórum Carajás, colaborador e articulista do EcoDebate.
[EcoDebate, 16/05/2009]
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