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Editorial

O debate no G8 sobre a crise alimentar fracassou como era esperado, por Henrique Cortez

[EcoDebate] A produção agrícola mundial é, comprovadamente, mais do que suficiente para alimentar toda a população do planeta. Mesmo assim enfrentamos uma inaceitável crise alimentar.

A partir de dados estatísticos coletados em 2006, a FAO (Food and Agriculture Organization, das Nações Unidas) pôde afirmar que a produção de alimentos no planeta é suficiente para garantir à população mundial uma dieta diária de quase 3.000 calorias. Pesquisas indicam que o total da produção mundial de alimentos já seria suficiente para alimentar 9 bilhões de pessoas. Aliás, só a redução do desperdício já bastaria para alimentar toda a população mundial.

Portanto, o problema da fome episódica ou crônica não é a falta do que comer, mas os recursos financeiros para o pleno acesso ao alimento, cada dia mais caro.

A crise alimentar atual é causada pela conjunção de fatores associados: especulação agrofinanceira, aumento artificial do preço das commodities, fatores climáticos adversos, consumo e desperdício obscenos, agricultura intensiva e asfixia da agricultura familiar, entre outros.

Em muitos países na África e na Ásia o potencial de crise é maximizado pelos “grandes interesses econômicos internacionais” (entenda-se os países economicamente desenvolvidos), que não têm o menor escrúpulo em especular, em manipular os preços das commodities e em incentivar a substituição da produção de alimentos pela de agrocombustíveis.

Um novo evento, a deslocalização agrícola, também está influenciando a crise alimentar. Agora, alguns países, como a China e a Arábia Saudita, adquirem terras no exterior (aqui entendidos como países pobres ou, no jargão eufemista, países em desenvolvimento) para sua produção agrícola específica e exclusiva. Se faltar comida no país produtor paciência, porque o que foi produzido sob oferta firme será impiedosamente exportado.

O fracasso do debate no G8 era mais do que esperado, tendo em vista que os países que se dizem desenvolvidos estão no centro da questão, na exata medida em que eles são responsáveis diretos pelo hiperconsumo de alimentos, pela especulação e pelos subsídios desumanos.

O subsídio anual concedido aos fazendeiros dos países ricos é estimado pela Oxfam em US$ 125 bilhões ou seja, 20 vezes maior do que os Estados Unidos e a Europa transferiram, em 2008, para ajudar a agricultura no mundo.

No entanto, a insegurança alimentar ameaça 15% da população mundial e, diante das mudanças climáticas, isto deve se agravar rapidamente. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) diz que produção de alimentos deve cair 25% até 2050.

É natural, portanto, que o G8 não tenha assumido qualquer compromisso real para r eduzir pela metade a fome no mundo até 2015 Afinal, se os países economicamente desenvolvidos já não se importam com a fome de 800 milhões de indivíduos, porque se importariam com a fome de 1 bilhão e meio?

A insegurança alimentar é hoje a mais gritante, abjeta e desnecessária realidade mundial. E, se depender do G8, continuará sendo.

Henrique Cortez, henriquecortez{at}ecodebate.com.Br
coordenador do EcoDebate

[EcoDebate, 22/04/2009]

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