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Artigo

Cerrado de todos os tempos e estações, artigo de Pedro Wilson

“Por ser de lá
do sertão, lá do cerrado,
lá do interior do mato,
da caatinga, do cerrado…
…sou como a rês desgarrada
nessa multidão boiada caminhando a esmo”.
Dominguinhos

Há 13 anos, em 1995, em nosso primeiro mandato de deputado federal, apresentamos uma proposta de emenda à Constituição Federal visando corrigir uma grave distorção em relação à preservação dos biomas nacionais. Devido a sua dimensão continental e a grande variação geomorfológica e climática, o Brasil abriga 7 biomas, 49 ecorregiões, já classificadas, e incalculáveis ecossistemas. Os biomas são: Amazônia, Caatinga, Campos do Sul/Pampa, Savana/Cerrado, Mata Atlântica, Pantanal e Zona Costeira. A Constituição Cidadã de 1988 garantiu a Amazônia, Zona Costeira, Mata Atlântica e Pantanal a condição de Patrimônio Nacional, mas cometeu uma grave omissão discriminando o Cerrado juntamente com a Caatinga e os Campos Sulinos.

O reconhecimento do Cerrado e da Caatinga como patrimônios nacionais vai corrigir a omissão inaceitável na Constituição Federal e, certamente, servirá de base para políticas de desenvolvimento sustentável para estas regiões. A Savana/Cerrado é a segunda maior formação vegetal brasileira, superada apenas pela Floresta Amazônica. São 2 milhões de km² espalhados por onze Estados, concentrando sua maior parte em Goiás e no Planalto Central. Estima-se que abrigue cerca de 10 mil espécies de plantas diferentes, 750 espécies de aves que reproduzem na região, 180 tipos de répteis, 195 de mamíferos, sendo 30 tipos de morcegos catalogados na área. O número de insetos é surpreendente: apenas na área do Distrito Federal há 90 espécies de cupins, há também mil espécies de borboletas e 500 tipos de abelhas e vespas.

A Savana/Cerrado tem a seu favor o fato de ser a caixa-d’agua do Brasil e alimenta as três das maiores bacias hidrográficas da América do Sul, a Tocantins/Araguaia, do São Francisco e Paranaíba/Prata, que favorece a manutenção de uma biodiversidade surpreendente. Tudo isso está ameaçado pela ação predadora do agronegócio e avanço das monoculturas extensivas de soja, de cana-de-açúcar, expansão urbana desordenada, a mineração, a invasão de terras indígenas e a impulsão da agropecuária, são alguns dos fatores de impácto sobre nosso bioma. De acordo com o Ibama, o bioma Savana/Cerrado é o segundo colocado na lista cuja biodiversidade está ameaçada de extinção, perdendo apenas para a Mata Atlântica. As maiores agressões começaram na década de 60, com a construção de Brasília e a ocupação da Região Centro-Oeste. Atualmente, segundo estudos, restam apenas 20% de sua vegetação original. Caso o ritmo da devastação continue – cerca de 2,2 milhões hectares anuais – a estimativa é de que poderá ser quase extinto até 2050.

A imprensa goiana chamou a atenção nestes dias sobre o avanço do desmatamento em áreas de conservação, as APPs, Parques Nacionais, Florestas e Reservas Extrativistas, e alertou para o perigo do encolhimento do Cerrado em pelo menos dez vezes o equivalente ao tamanho do Distrito Federal. Nossa preocupação tem sido o norte principal de nosso mandato. Em audiências públicas realizadas no ano passado, através da Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, produtores rurais da região do entorno do Distrito Federal e até representantes da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), confirmam que não é necessário desmatar o Cerrado para garantir o desenvolvimento da agricultura e da pecuária em Goiás. Com o planejamento, manejo, e pesquisas que desenvolvam tecnologias para o aprimoramento da produção.

A falta de proteção com a conservação ambiental do bioma Savana/Cerrado fica bem caracterizada pelo ínfimo percentual de áreas protegidas na forma da unidade de conservação. Apenas 0,7% de seu território – incluídos os parques, florestas e reservas – e 0,2% de unidades de uso direto – florestas nacionais, áreas de proteção ambiental e reservas extrativistas, são protegidas hoje. Nesse sentido, a PEC do Cerrado passa a ser de fundamental importância, pois vem num contexto direto da defesa do Cerrado goiano e da Caatinga, ampliando para os campos do sul, como forma de: 1º) corrigir a distorção da Constituinte de 1988, que na intenção de preservação da Floresta Amazônica, da Mata Atlântica e do Pantanal, agiu prontamente na sua defesa; mas excluiu e discriminou o Cerrado, a Caatinga e os Campos Sulinos, com área de preservação. 2º)
Salvar o Cerrado goiano do desmatamento e da destruição a que vem sendo submetida pela ação predatória de produtores sem a devida consciência ambientalista que deve.

O povo goiano deve acompanhar com mais precisão, denuncias como esta que nos chega através da imprensa, dos jornais, rádios e televisão, também os mandatos de parlamentares que são eleitos com seus votos para perceber que há um trabalho consistente e forte em defesa do Cerrado e do estado de Goiás. Que existe alguém – ou alguns – preocupado com a beleza da Chapada dos Veadeiros, Parque Nacional das Emas e Chapadão do Céu. Com a natureza que sempre foi generosa com o estado. Com seus verdadeiros paraísos de águas termais , cachoeiras, lagoas, parques e reservas florestais, de cidades como Goiás, Pirenópolis, Corumbá, Caldas Novas, Trindade, Mineiros, Alto Paraíso, Formosa, Buriti Alegre.

É na região dos cerrados onde o criador foi extremamente generoso com os Estados de Goiás e Tocantins e com o Distrito Federal e outros, onde se vê as mais belas paisagens, as mais lindas lagoas, as mais intensas cachoeiras e as mais densas vegetações, que nos atemos na defesa do bioma. E neste aspecto, não há uma canto, uma só região. A natureza espalhou por todo o estado e por todo o cerrado o seu esplendor. O Parque Nacional das Emas, na divisa com os Estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, que é um dos mais belos exemplares de de santuários ecológicos da América do Sul, e o maior orgulho para os moradores de Mineiros, de perobas e jatobás, de cupins luminosos que encantam a todos.

O Chapadão do Céu, onde a natureza mais uma vez exagerou, na cidade de Goiás, o portal do Parque das Emas, com suas praças do Sol, da Terra e da Lua,como que reverencia a natureza, que lhe é tão generosa e que precisa ser generosamente preservada.
É assim que tocamos o nosso mandato, com a ajuda da Rede Cerrado, do Movimento Cerrado, com as mais diversas entidades que compõem a defesa dessa luta, com a imprensa livre e sempre atenta, com a Frente Parlamentar Ambientalista, da Câmara dos Deputados, com Organizações não Governamentais, com todos os homens e mulheres, de todas as raças, de todos os credos, de todas as etnias,comprometidos com essa luta porque o Cerrado somos todos nós. A PEC do Cerrado, que também é da Caatinga e dos Pampas, precisa ser aprovada, este ano, porque o nosso cerrado corre risco e não pode esperar. Não para corrigir apenas uma omissão da Constituição, mas por uma questão de justiça, de defesa do meio ambiente e da vida.

Pedro Wilson é deputado federal

* Artigo enviado pelo Fórum Carajás.

[EcoDebate, 25/02/2009]

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