(floresta zero) Governo vai ampliar as áreas de agricultura e pecuária na Amazônia
Medida aprovada por 13 ministérios reduz de 80% para 50% área de reserva florestal em propriedades rurais
O governo federal aprovou ontem uma medida que, na prática, vai ampliar as áreas de agricultura e pecuária na Amazônia e diminuir as exigências de replantio de floresta em áreas degradadas.
A Comissão Coordenadora do Zoneamento Ecológico-Econômico do Território Nacional, uma câmara interministerial composta por 13 ministérios, modificou a área de reserva legal no entorno da BR-163, que liga Santarém (PA) a Cuiabá (MT), e da Rodovia Transamazônica, a BR-230. Matéria de Catarina Alencastro, no O Globo, 06/02/2009.
Pela decisão, as propriedades rurais da região próxima às rodovias terão sua reserva legal reduzida de 80% (exigido em todo o bioma amazônico) para 50%. Ou seja: quem já desmatou terras no entorno das rodovias não será mais obrigado a reflorestar 80% da propriedade, como determina a legislação ambiental, e sim, 50% da fazenda. Com isso, cerca de 700 mil hectares deixarão de ser replantados com árvores nativas da Amazônia e poderão ser usados para a agricultura.
Minc defende mudança, mas não participa de votação
A decisão ainda terá de ser aprovada pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e depois virar um decreto presidencial.
Mas a aprovação na câmara interministerial foi unânime e teve parecer favorável elaborado pelo próprio Ministério do Meio Ambiente. A área sujeita à mudança corresponde a 30% dos 33,4 milhões de hectares que estão sob influência da BR163, em 19 municípios do Pará.
Um representante do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior admitiu que a decisão “abre um precedente muito positivo”, que pode acabar sendo replicado em outras áreas. Para o Meio Ambiente, porém, a mudança impedirá o avanço do desmatamento.
— Aparentemente é uma flexibilização, mas, objetivamente, você ganha mais condições de cumprir a lei — alegou Roberto Vizentin, diretor de Zoneamento Territorial do ministério.
A nova área de reserva legal já foi aprovada pela Assembleia Legislativa do Pará e virou lei estadual sancionada pela governadora Ana Júlia Carepa (PT). O Código Florestal permite essa possibilidade, desde que o estado já tenha feito o Zoneamento Econômico-Ecológico e que a área já esteja bastante degradada.
O Mato Grosso, na outra ponta da BR-163, ainda está fazendo o zoneamento, mas também reivindicou a diminuição da reserva legal no norte do estado, dentro do bioma amazônico.
O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, participou apenas da primeira parte da reunião, mas deixou a discussão quando este assunto entrou na pauta e não votou. Ele defende a implantação de um distrito florestal antes que a obra saia, e lembra que o anúncio do asfaltamento da BR-163 triplicou o desmatamento na região.
No entanto, Minc também acredita que a diminuição da reserva será um ganho ambiental: — Nessas áreas, o desmatamento é de 90%. Quando você diz que essas áreas podem usar 50% para produção, que para ficar legal tem que reflorestar, ele vai ter que demarcar APP (Área de Preservação Permanente, como encostas de morros e beiras de rios) e replantar 40% com nativas.
A regra só valerá para quem desmatou até 2005, ano em que o Pará aprovou a lei de macrozoneamento.
Greenpeace condena redução de reserva
O Greenpeace condenou a redução da reserva legal de propriedades rurais do entorno da BR-163 e da BR230. Para a ONG, a decisão dá um aval aos desmatadores e legitima o crime ambiental por eles praticado até 2005.
— O que me assusta é que já existe essa decisão, e o zoneamento vai valer como carimbo e legitimação. O problema da BR163 é que ela foi aberta nos anos 70, ficou anos abandonada, e quando foi anunciada sua retomada houve um processo de grilagem e acirramento dos conflitos. A decisão me parece desfocada, isso é só para legalizar a devastação que já está lá — avaliou Sérgio Leitão, diretor de Políticas Públicas do Greenpeace.
A ONG diz que a questão não é a extensão da área destinada à preservação, e sim a falta de fiscalização. Para Leitão, o argumento do governo de que a medida ampliará a legalidade é desculpa para explicar sua incompetência: — A reserva legal já foi de 50%. O problema não é ser 50 ou 30 ou 20, é não ter fiscalização. Falta governo. Isso é argumento da burocracia para justificar sua falta de ação. O governo está sempre procurando uma desculpa para justificar o que não foi feito, para justificar seus erros. Essa recomendação da redução de reserva legal é para perdoar o passado, e não para evitar que aconteçam novos crimes.
O parecer do Ministério do Meio Ambiente pela redução da reserva legal faz um resumo do trâmite percorrido no Pará antes de o texto chegar à esfera federal.
Diz que a mudança foi aprovada pela sociedade civil e por ONGs ambientalistas. O Pará foi o estado que registrou mais desmatamento no ano passado, com 5.180 km2 de florestas devastadas. No total, 11.968 km2 foram destruídos na Amazônia.
O macrozoneamento do Pará determinou que pelo menos 65% do território do estado serão destinados a áreas protegidas e no máximo 35% para consolidação e expansão de atividades produtivas.
[EcoDebate, 07/02/2009]
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