Pará é o campeão absoluto em trabalho escravo, grilagem e casos de malária em 2008
Dados divulgados durante o ano de 2008 colocam o estado do Pará como campeão de queimadas, líder em casos de malária na Amazônia e região onde se concentrou o maior número de trabalhadores em condições análogas à escravidão.
Além disso, o Pará apresentou os maiores problemas com grilagem de terras, além de ter disputado com Mato Grosso o título de campeão do desmatamento.
Com base nestes dados, estado teve poucas razões para comemorar. O Pará em apenas um mês perdeu 54 recém-nascidos, que morreram na unidade hospitalar da Santa Casa de Misericórdia. Segundo os últimos dados divulgados morreram mais de 200 recém-nascidos.
O Estado também foi palco de investigações policiais. Segundo informações da Polícia Federal, Dantas tinha cerca de US$ 800 milhões num fundo de investimentos nas Ilhas Cayman. Para aplicar esse dinheiro no Brasil, o banqueiro teria utilizado a criação de gado para lavar dinheiro.
Mortes de recém-nascidos
Uma das notícias que mais repercutiu no país foi a das mortes dos bebês que nasceram na Santa Casa de Misericórdia do Pará. Ao todo, morreram mais de 200 recém-nascidos, entre maio e julho, o que fez com que o então presidente da Santa Casa, Anselmo Bentes fosse substituído pelo médico cirurgião vascular, Maurício César Soares Bezerra.
Para tentar amenizar a situação, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, anunciou o repasse de R$ 1 milhão para a compra de equipamentos hospitalares do hospital. O governo federal também combinou de repassar mensalmente R$ 200 mil para a construção de leitos de terapia intensiva na rede privada no Estado.
Justificativas – Após a repercussão nacional das mortes, a primeira justificativa veio da própria Santa Casa: as crianças eram prematuras e apresentavam má-formação. Porém, ao contrário do que os diretores da Santa Casa afirmaram, os moradores que moravam nas proximidades e funcionários do estabelecimento apresentaram outras causas: superlotação, falta de equipamento e de aplicação correta dos recursos financeiros, além de falhas médicas.
A secretária de Saúde do Estado do Pará, Laura Rosseti, em entrevista coletiva à imprensa, fez uma nova argumentação. Ela creditou as mortes ao ‘acaso’. Os bebês, segundo Rosseti, eram prematuros extremos (alguns com menos de um quilo e seis meses de gestação) e com má formação.
No dia 25 de junho o gerente e médico da UTI Neonatal, Benedito Maués, afirmou que a taxa de mortalidade entre as 240 internações realizadas ao mês pela unidade da Santa Casa ficava em torno de 17% – acima dos 10% a 15% declarados como aceitáveis pela Organização Mundial de Saúde (OMS), mas dentro do esperado a partir da gravidade dos casos atendidos pelo hospital.
Em matéria publicada pelo jornal O Liberal, Bentes afirmou que a superlotação da UTI do hospital foi o principal motivo para a morte dos bebês. “Claro [que foi a superlotação]. Todo mundo conhece isso, acontece há bastante tempo lá”, disse. Segundo ele, “há pelo menos dez anos faltam leitos para recém-nascidos na Santa Casa”.
O Sindicato dos Médicos do Estado do Pará também se manifestou, afirmando que o problema é antigo e que há um ano denunciam as mortes de bebês, mas nenhuma providência foi tomada. Falta no hospital investimentos em saúde básica e prevenção, segundo o sindicato.
O último semestre também não teve boas notícias para a casa hospitalar. No dia 25 de agosto, um principio de incêndio na ala de cuidados especiais no berçário obrigou a transferência de 17 bebês para outros setores do hospital. O fogo teria sido provocado por uma pane no aparelho de ar-condicionado do berçário.
Para reivindicar as péssimas condições, os médicos entraram em greve. Eles pediam por melhores condições de infra-estruturam -com a compra de equipamentos, remédios e materiais- melhorias na remuneração e diminuição da superlotação.
Para reverter o quadro, além dos investimentos anunciados pelo governo federal, a governadora Ana Julia Carepa inaugurou cinco obras de reforma e adaptação. A mais significativa é a nova Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTI-Neo), que passará a oferecer mais 18 leitos para os recém-nascidos.
Dantas no Pará
Outro caso que virou polêmica no Pará e no Brasil foi a operação da Polícia Federal chamada Satiagraha, que analisa as ações fraudulentas do Grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas. Eles e mais 14 pessoas são acusados por crimes de lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, evasão de divisas, formação de quadrilha e tráfico de influência para a obtenção de informações privilegiadas em operações financeiras.
Em apenas dois anos, Dantas acumulou no Pará um patrimônio invejável de terras e cabeças de gado. Nos 510 mil hectares de suas fazendas – algumas sob suspeita de grilagem e com ocorrência de trabalho escravo – existem 450 mil cabeças de gado. O valor mínimo estimado desse plantel alcança R$ 2,7 bilhões e o máximo, R$ 4,5 bilhões.
Documentos apontam que a Agropecuária Santa Bárbara Xinguara, do grupo Opportunity, comprou irregularmente cinco fazendas no sudeste do Pará. No total, as fazendas somam cerca de 23,5 mil hectares, custaram R$ 53,7 milhões e foram vendidas em setembro de 2005 por Benedito Mutran Filho, então um dos maiores proprietários rurais do Estado.
Segundo a PF, Dantas tinha cerca de US$ 800 milhões num fundo de investimentos nas Ilhas Cayman. Para aplicar esse dinheiro no Brasil, o banqueiro teria utilizado a criação de gado para lavar dinheiro. Nesse esquema, o empresário inventava o nascimento de novilhos, o que é impossível de ser checado, depois simulava a vende desse suposto gado novo, esquentando dinheiro sem origem, que teria vinda de um paraíso fiscal.
A PF também analisa a relação do grupo com atividades de mineração. O braço minerador do grupo Opportunity, a empresa GME4 do Brasil Participações e Empreendimentos S.A, tem interesse em encontrar ouro em Mato Grosso.
A empresa também enfrente ações judiciais sobre a legalidade de suas terras. O governo paraense reivindica duas fazendas do grupo em Xinguara, e o Instituto Brasileiro de Colonização e Reforma Agrária (Incra) abriu processo para desapropriar a fazenda Cristalino, em Santana do Araguaia (PA).
Como resultado da investigação, o banqueiro foi preso. A operação, chamada deflagrada em julho de 2008 investiga além de Dantas, o ex-prefeito de São Paulo, Celso Pitta e o empresário Naji Nahas que também foram presos e libertados depois. Por tentar subornar um delegado da Polícia Federal para ter seu nome excluído das investigações da Operação Satiagraha, o banqueiro foi condenado a dez anos de prisão e multa de mais de R$ 1,4 milhão por corrupção ativa, no dia 2 de dezembro. Pelas acusações por gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro, Daniel Dantas ainda não foi condenado.
Ouro – O braço minerador do grupo Opportunity, a empresa GME4 do Brasil Participações e Empreendimentos S.A, tem interesse em encontrar ouro em Mato Grosso. Os requerimentos foram apresentados junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) em junho do ano passado. Um ano depois, a área já autorizada pelo departamento para a pesquisa do minério no Estado já é maior que a cidade de São Paulo e abrange pelo menos cinco municípios mato-grossenses. O grupo também conta com a chancela do DNPM para prospectar minérios em Goiás, Bahia, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Tocantins.
Em um ano, a empresa conseguiu autorizações para pesquisas em uma área 57,9% superior à autorizada no mesmo período para a Companhia Vale do Rio Doce, segunda maior mineradora do mundo. Os alvarás começaram a ser concedidos em abril deste ano e têm validade de três anos cada um. Se a empresa achar minérios, ela pode vender os seus direitos de exploração ou ela própria explorar os recursos encontrados no solo. Em alguns casos, o espaço de tempo entre o pedido da GME4 e a expedição do alvará foi de dois meses, segundo informa o jornal Folha de S.Paulo.
Líder em trabalho escravo
O Pará aparece em primeiro lugar quando a questão é trabalho escravo. De acordo com o Ministério do Trabalho, uma amostragem concluiu que um terço de todos os casos de trabalhadores encontrados em condições análogas à escravidão no Brasil se encontra no Pará. Nos últimos cinco anos foram resgatados 5.242 trabalhadores no estado. Ao todo, mais de 20 mil pessoas foram resgatadas em todo o Brasil.
Trabalho escravo é considerado, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o trabalho degradante, que envolve o cerceamento da liberdade do trabalhador. Os trabalhadores são aliciados por um “gato” – maneira pela qual é conhecido o intermediário que faz a contratação e transporta essas pessoas. Ao chegar ao local combinado, o trabalhador se descobre devendor do transporte e da hospedagem. Além disso, encontra péssimas condições de moradia e trabalho.
Só no ano de 2008 o Grupo Móvel de Erradicação do Trabalho Escravo realizou 17 ações no Pará, de um total de 60 no país, resgatando 413 pessoas.
Nº 1 em Grilagem
O Pará também figura como o grande campeão da grilagem. Segundo anúncio feito pelo procurador da República no Pará, Felício Pontes, no dia 28 de agosto, a quantidade de terras registradas em cartório correspondem a quatro vezes o tamanho de todo o estado. O Pará é o segundo maior estado do país e pode-se dizer que só nos cartórios paraenses está registrada uma quantidade de terras correspondente a mais da metade do Brasil. O procurador explicou que os dados ainda não são oficiais, o que significa que a situação pode ser ainda pior.
Segundo um levantamento do governo federal, um quinto das terras paraenses estava nas mãos de grileiros em 2004, o que representa 24,8 milhões de hectares. Hoje essa quantidade aumentou para 31 milhões de hectares, o que corresponde a um quarto de todo o Pará.
Campeão em casos de Malária
Na reunião de avaliação do Programa Nacional de Controle de Malária, foi revelado que o Pará concentra mais de 80% dos casos de malária de todo o país. Os principais focos se encontram nos municípios paraenses de Pacajá, Itaituba, Jacareacanga, Goainésia, Anajás, Novo Repartimento, Novo Progresso e Cachoeira do Piriá.
No total foram contabilizados 29,5 mil casos da doença no primeiro semestre de 2008 em todo o país. Apesar do alto índice – principalmente no Pará – a doença está controlada e, em 2007, ocorreram 14 mortes por malária. Comparando, no ano 2000 foram registradas mais de mil mortes na Amazônia por conta da doença.
* Retrospectiva publicada pelo Portal Amazonia.org.br
[EcoDebate, 03/01/2009]
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