Os movimentos sociais e o governo Lula. A tensão entre o programático e o pragmático
A adoção do ‘pós-neoliberalismo pragmático’ de Lula fragmentou a esquerda, os movimentos sociais e os intelectuais.
Muitos pensam que mesmo não sendo o governo que se esperava é bem melhor do que a mera continuidade dos tucanos. Já outros, consideram frustrantes os rumos tomados, considerando-se o que foi construído pelo movimento social nas últimas décadas. Para esses, Lula deu as costas para a história do movimento social brasileiro. Lula faz tempo deixou de ser uma unanimidade entre os movimentos sociais, entretanto, com exceção de uma reduzida parcela que se reúnem em agrupamentos políticos menores, os setores mais expressivos do movimento social, não o consideram um governo de direita e até mesmo neoliberal.
A compreensão de que não se trata de um governo que possa ser taxado de neoliberal parte de algumas constatações. A primeira delas, no fato de que o tratamento dispensado ao movimento social é diferente do período anterior, particularmente do período, ou ‘Era FHC’. Ao contrário das políticas neoliberais que procurava criminalizar, desqualificar e jogar o movimento social contra a sociedade, o atual governo reconhece os movimentos sociais, ao menos na retórica, como um sujeito político importante. As políticas do governo Lula procuram aproximar-se do movimento social, cooptá-lo quando possível, torná-lo um aliado, fazer com que o mesmo legitime as políticas do Estado. Quando isso não é possível, mantém a ‘janela’ de diálogo aberto.
Tem-se assim uma relação tensa, ambígua e complexa. O governo Lula age de forma pragmática. Nunca assumiu o projeto político sustentado pelos movimentos sociais de mudança do modelo econômico, mas ao mesmo tempo procura cultivar uma boa relação com o movimento social por ordem mais de pragmatismo do que respeito. Da parte do movimento social o ‘jogo’ é semelhante. Mesmo frustrado com as opções feitas pelo governo, não rompe definitivamente em função da interpretação de que há espaços nos qual é possível o tensionamento e o avanço de algumas propostas. Foi esse sentimento que levou os movimentos sociais, afastados das eleições de 2006 no primeiro turno, apoiar majoritariamente Lula no segundo.
A condução da política econômica em curso é o principal motivo da rota de colisão do governo Lula com o movimento social, entretanto, há uma séria de outras agendas que distanciam a posição do governo com as forças sociais: a lentidão na Reforma Agrária, o caso dos transgênicos, a transposição do Rio S. Francisco, a construção de hidrelétricas, a produção de agrocombustível, estão entre as principais. Na questão indígena também é grande o descontentamento com a postura vacilante do governo, desanuviada momentaneamente pela vitória parcial na reserva indígena Raposa Serra do Sol, mas registre-se o drama dos indígenas Guarani-Kaiowá no MS que encontra pouco eco no governo.
A interpretação do movimento social, já de algum tempo, é que Lula trocou o programático pelo pragmático.
(Ecodebate, 30/12/2008) publicado pelo IHU On-line, 28/12/2008 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
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