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Ulianópolis (PA) é o município que mais perdeu floresta amazônica para o gado. Poder de setores que desmatam se reflete nas eleições municipais

Desmatamento na Amazônia, em foto de arquivo MMA
Desmatamento na Amazônia, em foto de arquivo MMA

76% de mata de campeã em desmate vai para pecuária – Ibama estima haver mais de 500 mil bois ilegais nas 36 cidades mais desmatadoras; São Félix do Xingu, no Pará, perdeu a maior área nativa

Mapeamento por radar dos 36 municípios que mais desmatam a Amazônia aponta Ulianópolis (PA) como o que já perdeu a maior parte de sua floresta -76%- para dar espaço à pecuária. O levantamento feito pelo Sipam (Sistema de Proteção da Amazônia), a que a Folha teve acesso, desfaz dúvidas levantadas no início do ano pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação às taxas oficiais de desmatamento. Da Folha de S.Paulo, 22/12/2008.

As imagens de radar, ainda mais precisas que as dos satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), já ajudam o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) a localizar criadores de gado em áreas desmatadas ilegalmente e que sofreram embargo da atividade econômica.

A estimativa é que haja mais de 500 mil cabeças de gado em áreas desmatadas ilegalmente e que desrespeitaram o bloqueio de produção, disse Flávio Montiel, diretor de proteção ambiental do instituto. Segundo ele, entre 20% e 25% das propriedades autuadas desrespeitaram o embargo. Bois “piratas” podem ser apreendidos.

Tendências do desmatamento na Amazônia foram debatidas na semana passada em seminário em Brasília. O Estado do Maranhão passou a integrar o grupo de Estados que mais abatem a floresta. Lá, o desmatamento está mais associado à produção de carvão vegetal. Na fronteira agrícola, o problema decorre sobretudo do avanço da pecuária. Pará e Mato Grosso ainda lideram o ranking dos Estados mais devastadores.

Outra tendência verificada é de desmatamento em áreas menores, que fogem do alcance dos satélites do Inpe, feito supostamente de forma a tentar burlar a fiscalização. O ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) avalia que o cumprimento das metas de desmatamento, fixadas no Plano Nacional de Mudanças Climáticas, exigirá grande esforço. Entre agosto de 2007 e julho de 2008, a Amazônia perdeu quase 12 mil quilômetros quadrados de mata.

“A expansão do desmatamento segue um padrão incontrolável”, disse o diretor-geral do Sipam, Marcelo de Carvalho Lopes. Os radares do Sipam rastrearam um território de cerca de 780 mil quilômetros quadrados -correspondente à área dos 36 municípios que registram ritmo mais acelerado de desmatamento-, entre os meses de março e outubro. Foram cerca de 350 horas de vôo. As imagens de radar já foram repassadas ao Ibama e ficarão disponíveis para a fiscalização em Estados e municípios.

Entre os 36 municípios, 7 já perderam mais da metade de suas florestas, embora a lei fixe o limite de desmatamento no bioma amazônia em 20% das propriedades. Da lista, São Félix do Xingu (PA) foi o que perdeu a maior extensão de floresta: 13,5 mil quilômetros quadrados, o que corresponde a 16% do território do município, um dos maiores do Brasil. Esse número ainda pode aumentar porque a análise das imagens ainda não foi concluída. Falta analisar cerca de 3% do total.

Mais da metade das cidades da lista (19) é de Mato Grosso. O governador do Estado, Blairo Maggi (PR), foi quem mais contestou os dados do Inpe quando o instituto apontou o aumento no ritmo do desmatamento na Amazônia.

Poder de setores que desmatam se reflete nas eleições municipais

O poder econômico e político dos desmatadores esteve presente nas eleições dos 36 municípios que mais derrubam a floresta na Amazônia.

Levantamento feito pela Folha a partir de dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mostra que 25 prefeitos eleitos (69%) nesses municípios são diretamente ligados ou receberam doações de campanha vindas de pessoas e empresas ligadas à agricultura, à pecuária e à indústria madeireira.

No Pará, Estado campeão do desmatamento entre agosto de 2007 e julho de 2008, segundo o Inpe, com 5.180 km2 derrubados, o resultado eleitoral de 10 dentre as 12 prefeituras da lista (83%) seguiu a regra. Em Mato Grosso, que teve o maior número de municípios na lista dos mais desmatados divulgada em janeiro (19), foi possível identificar a conexão em 14 campanhas vitoriosas (73%).

Em Juína (MT), a eleição do petista Alcir Peruzzo contou com a ajuda financeira do madeireiro Osmar Queiróz. Um dos 124 presos em 2005 pela Polícia Federal na Operação Curupira -que desmontou um esquema de exploração ilegal de madeira-, Queiróz doou R$ 3.000 à campanha de Peruzzo.

Em Lábrea (AM), 52% dos R$ 106.342 gastos na campanha à reeleição do prefeito Gean Campos de Barros (PMDB) vieram de duas doações feitas pelo empresário e fazendeiro Frederico Scheffer.

Reserva

O fazendeiro atualmente tenta na Justiça impedir a criação, pelo governo federal, da Floresta Nacional do Iquiri e da Reserva Extrativista de Ituxi. As duas áreas propostas estão localizadas nos 150 mil hectares que o fazendeiro possui no município amazonense.

Oito madeireiras doaram o equivalente a 40% dos custos da campanha do prefeito reeleito de Paragominas (PA), Adnan Demachki (PSDB). Ao todo, foram 12 depósitos, que somaram exatos R$ 170 mil.

Demachki disse ter recebido “com orgulho” a ajuda das madeireiras. Segundo ele, todas têm projetos de exploração legalizados, com planos de manejo. “Eu defendo o que é legal para o município. Uma dessas madeireiras tem selo verde [a certificação internacional do setor]. Outra só usa madeira reflorestada. Então, não vejo o que contestar”.

Peruzzo disse que teve doações de vários setores” em “pequenas quantidades” e que sua campanha foi “modesta e sem nenhum comprometimento”.

Informado por telefone do tema da reportagem, o prefeito reeleito de Lábrea chegou a marcar um horário para falar à reportagem, mas depois não atendeu às ligações.

Scheffer defendeu as doações feitas a Barros e disse que a vitória dele não o ajuda na ação judicial que move contra a criação das áreas de preservação. A advogada de Queiróz não respondeu à reportagem.

[EcoDebate, 23/12/2008]

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