Por um novo acordo climático em 2009, artigo de Mary Robinson, Margot Wallström e Gro Harlem Bruntland
Atingir a sustentabilidade e ter baixas emissões de carbono exigirão também uma inovação social e política de longo alcance
[Gazeta Mercantil] As insuficiências da regulamentação estiveram na origem da crise financeira – não nos podemos permitir cair no mesmo erro no que respeita ao clima. O Protocolo de Kyoto expira em 2012 e a comunidade internacional tem de adotar um novo acordo em Copenhague, em 2009. Para o efeito, entre 1 e 12 de Dezembro, decorre em Poznan, na Polônia, uma reunião preparatória.
Esta reunião reveste se da maior importância porque deve criar as condições para o acordo que se espera possa ser concluído em Copenhague no próximo ano e que, provavelmente, constitui a nossa última oportunidade para controlar as alterações climáticas antes que seja demasiado tarde.
Enquanto as Nações Unidas congregam em Poznan os ministros do ambiente de todo o mundo, as bases econômicas que sustentam um novo e sólido tratado apresentam-se cada vez mais frágeis. Yvo de Boer, responsável pela Convenção Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, afirmou recentemente: “É certo que a situação se alterou, mas não creio que ninguém terá a estreiteza de espírito de se preocupar apenas com o problema a curto prazo e ignorar as questões a longo prazo, porque as decisões tomadas se irão repercutir nos próximos 30 anos.”
Esta afirmação reflete também a posição do presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama, e da União Européia. Ambos se comprometeram a respeitar as decisões de limitar as emissões de dióxido de carbono, defendendo as iniciativas governamentais e o investimento em novas tecnologias verdes e em energias renováveis como uma forma sustentável de estimular a economia e criar mais emprego.
Participamos, enquanto os presidentes, na iniciativa em matéria de alterações climáticas “Rumo a Copenhague”, uma rede aberta baseada na internet que propugna também a justiça climática. Estamos empenhados nesta iniciativa porque entendemos que o debate sobre o clima e o novo tratado devem prestar uma maior atenção às implicações sociais e humanas das alterações climáticas.
Na sua maioria, o aumento previsto de 2,6 mil milhões da população global até 2050 ocorrerá nas regiões mais pobres do mundo. Estas regiões, que carecem de um crescimento econômico convergente, são as mais instáveis do ponto de vista político e serão as mais afetadas pelas alterações climáticas. Trata se de uma trajetória alarmante que gera um «déficit de sustentabilidade» que deve ser resolvido. É evidente que não podemos atenuar o problema das alterações climáticas sem abordar a questão da pobreza.
Por exemplo, o continente africano é responsável por 3,8% das emissões mundiais de , mas as alterações climáticas terão repercussões injustas e devastadoras.
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) estima em várias dezenas de milhares de milhões de dólares os custos anuais de adaptação dos países em vias de desenvolvimento – em 2050, estes custos ascenderão a US$ 86 bilhões por ano. A atenuação das repercussões das alterações climáticas dificultará a concretização de muitos das Metas de Desenvolvimento do Milênio, das Nações Unidas, incluindo os que visam a redução da pobreza e da mortalidade infantil e a luta contra a AIDS, a malária e outras doenças.
Na melhor das hipóteses, 1% dos recursos exigidos está atualmente disponível ao abrigo da taxa sobre o mecanismo de desenvolvimento limpo. Por conseguinte, para garantir a justiça climática e cumprir as Metas de Desenvolvimento do Milênio, será necessário divisar novas formas inovadoras de formação de competências e transferência de tecnologia. Urge, sobretudo, garantir a equidade e a proporcionalidade dos fundos disponíveis para as medidas de adaptação nos países em vias de desenvolvimento, por forma a refletir claramente o princípio do poluidor pagador e a respeitar os direitos humanos e a igualdade entre homens e mulheres, ou seja, a justiça climática.
Se a atenuação das alterações climáticas se faz à escala mundial, já a adaptação decorre num contexto local. Por este motivo, num novo acordo climático, a adaptação e a atenuação devem estar em pé de igualdade. Além disso, importa equacionar, numa perspectiva de desenvolvimento, a questão da justiça climática e dos direitos humanos.
Em última análise, atingir a sustentabilidade e uma economia com baixas emissões de carbono não só dependerá da inovação tecnológica como exigirá também uma inovação social e política de longo alcance. Não esqueçamos que a tecnologia não tem capacidade para eliminar a pobreza, respeitar os direitos humanos, garantir a igualdade entre homens e mulheres, pôr cobro às alterações climáticas e construir uma sociedade sustentável – mas as pessoas sim. É nisto que a iniciativa “Rumo a Copenhague” consiste – e é sobre isto que deve ser alcançado um acordo em Copenhague — justiça climática para todos os povos.
Mary Robinson, Margot Wallström e Gro Harlem Bruntland – Pela ordem: ex-presidente da Irlanda e vice-presidente do Clube de Madrid, vice-presidente da Comissão Européia e ex-primeira-ministra da Noruega
* Artigo originalmente publicado na Gazeta Mercantil, 12/12/2008.
[EcoDebate, 13/12/2008]
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