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Aprimorando o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)(2): Zonas de Amortecimento Ambiental, artigo de Rogério Grassetto Teixeira da Cunha

SNUC Sistema Nacional de Unidades Conservação
A lei 9965, que criou em 2000 o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), sistematizou e centralizou a legislação sobre Unidades de Conservação (UCs) no Brasil. Ela representou assim um importante avanço ambiental, a despeito dos tradicionais problemas enfrentados no país quando o assunto é implementação, cumprimento e fiscalização das leis de uma forma geral. Lamentavelmente, essa lei, tão importante para a preservação da nossa biodiversidade, é especialmente negligenciada em vários aspectos.

No entanto, é evidente que ela tem sido fundamental para a preservação e acredito que vale a pena o esforço de tentar aprimorá-la, com a criação de algumas novas categorias de UCs. Semana passada, sugeri aqui a criação das Áreas de Recuperação Ambiental. Proponho agora uma segunda nova modalidade de UC, a Zona de Amortecimento Ambiental (ZAA), cuja finalidade principal seria a contenção do desmatamento em áreas extremamente críticas.

Imaginei dois tipos de locais nos quais as ZAAs seriam especialmente benéficas. Um é na região de expansão da fronteira agrícola no arco sul de desmatamento da Amazônia, nos estados de Rondônia, Mato Grosso, Pará e Tocantins, além do oeste do Maranhão. Nesta enorme área em risco, seriam detectados os locais com maior velocidade e intensidade de destruição, onde seria dada prioridade para a criação de ZAAs. As unidades seriam de formato mais alongado, de modo a cobrir uma extensa frente de contato entre as zonas de expansão e as áreas mais preservadas. Com a criação destas UCs, que deveriam contar com fiscalização mais intensa, poderia dificultar-se a expansão desenfreada do agronegócio.

O leitor deve estar se perguntando o que impediria os desmatadores de plantão de cruzarem as áreas de amortecimento e continuarem a sua sanha depredatória do outro lado da ZAA. Por um lado, quem poderia ajudar a impedir seria a população que mora na ZAA, a qual seria fortemente estimulada a extrair seu sustento a partir de atividades que exigem a preservação, como o turismo ou a coleta de produtos da floresta, por exemplo. Por outro lado, vejo estas áreas ainda como focos de fiscalização concentrados que deveriam contar com mais pessoal e infra-estrutura de fiscalização (eu sei, eu sei, o velho problema da falta de fiscalização). Assim, não só as áreas do entorno estariam mais sujeitas a controle do desmatamento, como o escoamento de produtos retirados ilegalmente das florestas seria grandemente dificultado.

O segundo tipo de local seria às margens de novas rodovias na região amazônica (porque as laterais das atuais já foram pro beleléu), digamos 1 km de cada lado. Nestas faixas ficariam proibidas quaisquer atividades de desmatamento e, principalmente, a abertura de novas estradas laterais, um dos principais vetores de capilarização do desmatamento na região. Isto em locais ainda não atingidos pelo fenômeno espinha de peixe (padrão de desmatamento muito comum em estradas na Amazônia e que se assemelha, em imagens de satélite, à estrutura óssea dos peixes devido à criação de estradas vicinais perpendiculares à principal e de outras assessórias a estas, com desmatamentos em faixas paralelas ao longo de todas elas).

Poderia argumentar-se, com certa razão, que não há a necessidade de uma nova categoria de UC e que o problema poderia ser resolvido com respeito à lei e decretando-se a criação de várias unidades, preferencialmente de categorias mais restritivas, como Estações Ecológicas ou Reservas Biológicas. Mas a idéia aqui não é só técnica, mas também política, de marcar uma posição clara e dizer aos desmatadores e ao mundo: “Aqui nós iremos controlar o desmatamento doa a quem doer e sem medo de cara feia”.

Tomando atitudes inequívocas como esta, poderíamos começar a pleitear verbas por desmatamento evitado. Do contrário, estamos falando apenas blá-blá-blá político que não será levado a sério por quem realmente se interessa pela preservação da floresta e tem dinheiro para financiar projetos nesse sentido.

Rogério Grassetto Teixeira da Cunha, biólogo, é doutor em Comportamento Animal pela Universidade de Saint Andrews.

* Artigo enviado pelo Autor e originalmente publicado no Correio da Cidadania, parceiro estratégico do EcoDebate, na socialização da informação.

 

Nota: Sobre o mesmo tema, leia também:

https://www.ecodebate.com.br/2016/05/05/unidades-de-uso-sustentavel-no-snuc-artigo-de-antonio-silvio-hendges/

https://www.ecodebate.com.br/2016/05/03/unidades-de-protecao-integral-no-snuc-artigo-de-antonio-silvio-hendges/

https://www.ecodebate.com.br/2016/04/29/categorias-de-unidades-de-conservacao-no-snuc-artigo-de-antonio-silvio-hendges/

https://www.ecodebate.com.br/2014/09/30/sistema-nacional-de-unidades-conservacao-snuc-vive-crise-sem-precedentes/

https://www.ecodebate.com.br/2008/12/01/aprimorando-o-sistema-nacional-de-unidades-de-conservacao-snuc-areas-de-recuperacao-ambiental-1-artigo-de-rogerio-grassetto-teixeira-da-cunha/

 

[EcoDebate, 08/12/2008]

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