Paragominas em chamas, artigo de Rogério Almeida
Imagem de satélite da região de Paragominas. Fonte Embrapa
Amazônia – o muque como forma de aplacar a diferença
“…na América Latina, não raramente se protege os algozes e se difama as vítimas”, afirma o premiado escritor manauara Milton Hatoum, hoje radicado em São Paulo, em análise a um colega sobre a elite local. Escritos sobre a história e sociologia não deixam dúvidas quanto ao privilégio como seiva do caráter da mesma, tão afeiçoada ao erário público.
Não fossem as verbas da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), muita gente que posa de bacana hoje estaria à míngua. São elucidativas as observações do mulato suburbano e porrista, Lima Barreto, sobre os vícios da nascente República, na obra os Bruzundangas. “Não há quem não queira deixar para os seus parentes, mulheres e amantes, generosas pensões”, dispara Barreto num trecho.
A apropriação do Estado sempre foi estratégica para a elite local. Como perceber a truculência dos madeireiros de Paragominas, nordeste do Pará, senão nessa perspectiva? A dita elite local tornou comum o uso da truculência para aplacar a diferença e manter ações ilegais. O histórico de chacinas e assassinatos de camponeses e seus aliados esclarecem a trajetória do mundo rural amazônico.
O estopim para a destruição da sede do IBAMA e o saque da madeira
A ação violenta contra agentes do governo em Paragominas não inaugura o histórico da truculência. Num passado não muito remoto os madeireiros expulsaram uma equipe na região de Altamira, sudoeste do estado. Os agentes tiveram o hotel onde se alojavam cercado e foram gentilmente convidados a se retirar. Em Tailândia fez um ensaio geral, e alcançou a apoteose em Paragominas.
A violência em Paragominas foi motivada em oposição à operação Rastro Negro, contra agentes do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que fiscalizavam carvoarias e a exploração madeireira ilegal nas terras do povo Tembé. O saldo foi a sede do instituto em Paragominas incendiada, o hotel onde estavam hospedados os agentes depredado, quatro carros queimados e 14 caminhões com de 400 metros cúbicos madeira roubados.
Edílson Tembé, dirigente indígena, em encontro em Belém no mês passado, alertou sobre a pressão de fazendeiros e madeireiros sobre as terras e a floresta do povo indígena no município de Paragominas.
Ao lado do sul do Pará, Paragominas foi um dos berços em que se cevou a União Democrática Ruralista (UDR), braço da intolerância dos ruralistas criado pelo goiano Ronaldo Caiado, e que fez fama com a fomentação de chacinas e execuções de camponeses e seus aliados. Numa obra que registra a presença da UDR no Pará, a professora Marcionila Fernandes (1992) indica a presença de famílias tradicionais do setor cafeeiro de Minas Gerais e São Paulo.
Nas observações de Fernandes registram-se a presença dos irmãos Lincoln e Luiz Bueno, paulistas do celeiro dos cafeicultores, aportados na região desde a década de 1970. “Um pioneiro” tem sido esse o amparo de gestos mais largos para a manutenção do poder. A que tudo e todos devem se submeter. Onde não há espaço para a diferença.
Lanari, Quagliato e os paranaenses Bannach são outros troncos de família que deram forma a UDR no Pará com o endosse entre os paraenses de Asdrúbal Bentes e empresas como o Grupo Marcos Marcelino, Estacon. A Associação Rural da Pecuária do Pará (ARPP) encontra-se no DNA da União. A ARPP, outro dia premiou a empresa Agropecuária Xinguara, como pecuarista do ano.
Rogério Almeida é Jornalista. Colaborador do www.forumcarajas.org.br, articulista do IBASE e Ecodebate, coordena o Blog Furo.
[EcoDebate, 27/11/2008]
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