Caminho verde ao crescimento, artigo de Nicholas Stern
[Green path to growth, article by Nicholas Stern]
Se trabalharmos juntos, dá para evitar os riscos piores das mudanças climáticas. Se não agirmos agora, essa oportunidade não voltará
[Folha de S.Paulo] AS MUDANÇAS climáticas são um problema global de escala sem precedentes. O mundo tem apenas alguns poucos anos para agir de modo a evitar grandes riscos de danos graves ao planeta e às perspectivas de crescimento econômico sustentado, desenvolvimento e redução da pobreza.
A crise financeira ressalta a urgência das ações em relação às mudanças climáticas. Essa crise vem sendo gestada há 20 anos e mostra claramente que, quanto mais tempo se ignora o risco, maiores são as conseqüências.
Até meados deste século, o alto crescimento de carbono terá elevado as concentrações de gases-estufa até um ponto em que desastres climáticos de grandes proporções serão prováveis. Nesse ponto, correremos claro risco de sufocar o crescimento.
Para administrar o clima e nossas economias, precisamos reduzir as emissões de gases-estufa em 50% até o ano 2050.
Para alcançar essa meta, a maior parte da produção de eletricidade terá que ser descarbonizada, e as emissões de gases dos transportes, do uso da terra, de edifícios e da indústria terão que ser fortemente reduzidas.
Globalmente falando, as emissões per capita precisarão cair para cerca de duas toneladas de CO2 -a média atual é de sete toneladas.
Haverá pouca margem para desvios -se um ou dois países grandes deixarem de cumprir a meta, será muito difícil imaginar como os outros países conseguirão alcançar metas de emissões próximas do zero. A maioria dos países desenvolvidos hoje emite entre dez toneladas e 24 toneladas de CO2 per capita; logo, esses países terão que reduzir suas emissões em pelo menos 80% até 2050.
Isso é algo que o Reino Unido acaba de se comprometer a fazer.
É o momento de promover um crescimento que possa ser sustentado. Uma “recuperação verde” oferece a oportunidade de uma nova forma de crescimento e da construção de um futuro de baixo carbono, com os investimentos que são vitais para a economia, o planeta e a sociedade. Isso estimularia o crescimento econômico, geraria empregos e desenvolveria tecnologias-chaves para o futuro.
Para atingir essa meta, os setores público e privado precisam trabalhar em conjunto. Será o setor privado que fará a maior parte dos investimentos, mas o setor público precisa implantar a estrutura para a ação e moldar os incentivos e o clima de investimentos que permita que esses investimentos sejam feitos.
A 15ª Conferência das Partes da Convenção-Marco das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Copenhague (Dinamarca), no final de 2009, será crucial para desenhar a arquitetura de uma resposta global às mudanças climáticas e da direção futura da economia mundial.
As discussões sobre a estrutura devem ser pautadas por princípios claros e baseadas em análises científicas e econômicas rigorosas. Esses princípios devem ser a efetividade -levando a cortes nas emissões, a eficiência -assegurando a mitigação com boa relação custo/benefício- e a eqüidade -considerando o fato de que as pessoas e os países pobres freqüentemente são atingidos primeiro e mais duramente e têm responsabilidade histórica limitada pelas emissões.
Os países desenvolvidos precisam liderar pelo exemplo. Eles precisam reduzir fortemente suas próprias emissões, não apenas se pautando por onde é mais barato fazê-lo.
Mas uma redução global de 50% nas emissões não poderá ser alcançada sem que os países em desenvolvimento tomem medidas fortes para reduzir suas emissões. A maioria dos grandes países emergentes do mundo, incluindo o Brasil, já emite significativamente mais que o nível de duas toneladas per capita.
Os países desenvolvidos precisam ser capazes de mostrar ao mundo em desenvolvimento que o crescimento econômico com baixa emissão de carbono é possível, que os fluxos financeiros aos países em desenvolvimento podem ser substanciais e que as tecnologias de baixo carbono serão economicamente viáveis, disponíveis e compartilhadas.
O comércio internacional atribui um preço às emissões de gases-estufa e reforça os princípios da efetividade, eficácia e eqüidade. Os benefícios do comércio de carbono podem ser grandes, gerando fluxos financeiros do setor privado aos países em desenvolvimento. Fluxos de US$ 20 bilhões a US$ 75 bilhões por ano aos países em desenvolvimento serão plausíveis se os países desenvolvidos reduzirem suas emissões de 20% a 40% até 2020, em relação aos níveis de 1990.
Mas países como o Brasil não precisam esperar. Com uma matriz energética limpa, uma economia de foco doméstico e fortemente regulamentada e vontade política suficiente, o Brasil está em posição não só de avançar, mas de liderar outros países.
Existem riscos, mas também existem oportunidades enormes. Se os países trabalharem juntos para criar uma resposta global efetiva a esse desafio, ainda há tempo para evitar os riscos piores das mudanças climáticas. Mas, se não agirmos agora, essa oportunidade não voltará.
SIR NICHOLAS STERN, 62, é professor de economia e governo da London School of Economics and Political Science (Inglaterra) e ex-economista-chefe do Banco Mundial. Comandou o “Relatório Stern” sobre mudanças climáticas em 2006.
Tradução de Clara Allain.
Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo, 03/11/2008.
[EcoDebate, 04/11/2008]
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