EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Notícia

Estudo exclusivo mostra que um em cada cinco mananciais do DF está comprometido pela ocupação desordenada

Águas ameaçadas: Dos 484 cursos d’água, 93 apresentam graves problemas ambientais

Os recursos hídricos do Distrito Federal padecem diariamente por causa da ocupação desordenada das cidades e a falta de conscientização ambiental da população. Levantamento da Subsecretaria de Defesa do Solo e da Água (Sudesa), feito para o Correio, mostra que 93 mananciais no DF têm graves problemas ambientais, como falta de cobertura vegetal, construção e ocupação urbana nas margens, processos erosivos, de assoreamento e contaminação por lixo, entulho e até esgoto. O número representa 19,2% dos 484 mananciais mapeados. Significa dizer que praticamente um em cada cinco cursos d’água do DF está comprometido. Por Gizella Rodrigues, do Correio Braziliense, 20/10/2008.

Os mananciais em pior estado são aqueles que acompanham o crescimento das cidades e dos assentamentos, irregulares ou não. O diagnóstico é preocupante porque garantir a preservação das nascentes e córregos do DF seria uma forma de assegurar a sobrevivência dos recursos hídricos do Brasil inteiro. O DF não tem grandes mananciais, mas as águas que nascem transparentes no Planalto Central formam três bacias hidrográficas brasileiras: as dos rios Paraná, Tocantins-Araguaia e São Francisco. Segundo especialistas, a falta de cuidado compromete a qualidade e a quantidade de água de todo o país.

A região hidrográfica que está em maior perigo é a do Rio Paraná. É para lá que correm as águas do Lago Paranoá, que já chegam ao espelho d’água seriamente afetadas. De acordo com a Sudesa, todos os quatro ribeirões que deságuam no lago – do Gama, Riacho Fundo, Bananal e Torto – estão comprometidos. Cada um deles chega ao Paranoá por um braço diferente e toda a sujeira que é despejada irregularmente neles acaba no lago artificial.

O mais vulnerável é o Ribeirão Riacho Fundo, que recebe água de córregos que passam por Riacho Fundo, Guará, Núcleo Bandeirante, Águas Claras e Vicente Pires. Antes de chegar ao Lago Paranoá, ele se encontra com o Córrego Vicente Pires, que nasce em área degradada, perto do Lixão da Estrutural. Moradores jogam garrafas e sacos plásticos, pedaços de roupas e isopor na água. O ribeirão também sofre uma série de interferências no caminho para o lago, como a ocupação da margem a menos de 30m da água, delimitada como Área de Proteção Permanente (APP), o depósito de lixo e entulho e o despejo de esgoto.

A Companhia de Saneamento Ambiental do DF (Caesb) faz monitoramento da qualidade do Lago Paranoá semanalmente. Em geral, quase toda a extensão do espelho d’água é classificada como excelente. Mas, no local onde o Ribeirão Riacho Fundo chega ao lago (veja mapa), perto da Ponte das Garças, a água costuma ser considerada imprópria. No braço norte, perto da Ponte do Bragueto, também há uma mancha de água classificada como imprópria no ponto onde deságuam os ribeirões Torto e Bananal.

Segundo o professor Geraldo Resende Boaventura, do Departamento de Geoquímica e Recursos Minerais da Universidade de Brasília (UnB), as águas dos ribeirões Torto e do Bananal eram consideradas de excelente qualidade até cinco anos atrás. As nascentes dos cursos d’água ficam dentro do Parque Nacional de Brasília e, por isso, são preservadas. Mas as águas são contaminadas perto da Ponte do Bragueto, onde é despejada a galeria de águas pluvais, e sofrem interferência da ocupação do Varjão – perderam a vegetação natural em alguns pontos da margem e recebem entulho, areia e lixo. “Assim que saem do parque, os córregos sofrem um processo de degradação causado, principalmente, pela ocupação desordenada e equivocada”, afirma o professor.

Um dos córregos que forma o Ribeirão do Torto é o Urubu, que passa atrás do condomínio Privê do Lago Norte. Moradores que construíram a menos de 30m da margem tentaram desviar o curso do córrego para, assim, saírem da área considerada de preservação permanente. Para isso, escavaram e aterraram o manancial, plantaram grama e colocaram até blocos de asfalto na margem. Em julho, moradores foram flagrados jogando terra no córrego, chegaram a ser presos e vão responder por crime ambiental, que tem pena de um a quatro anos de reclusão. Por causa das interferências no córrego, a água está cheia de bactérias e o solo, desbarrancando.

Construções irregulares são o desafio

Impedir a ocupação irregular do solo no Distrito Federal e a construção de casas em áreas de nascentes e nas margens dos córregos é tarefa da Subsecretaria de Defesa do Uso do Solo e da Água (Sudesa). O órgão se orgulha de ter levado para delegacias mais de 20 pessoas acusadas de grilagem de terras só este ano e impedido o surgimento de loteamentos irregulares depois de janeiro do ano passado. Mas a gerência operacional do órgão ainda encontra dificuldades para derrubar construções já consolidadas em Área de Preservação Permanente (APP) e impedir que os danos ambientais causados por elas se tornem irreversíveis.

As ações da Sudesa têm se concentrado na derrubada de casas que estavam sendo feitas nos condomínios irregulares sem alvará de construção – as obras estavam embargadas pelo GDF. No último dia 25, por exemplo, houve uma derrubada de construções que desrespeitaram a ordem no condomínio Estância Quintas da Alvorada, no Lago Sul. Mas as 1.532 casas e lojas erguidas na beira de córregos, nascentes e veredas em Vicente Pires, na Colônia Agrícola Samambaia e na Vila São José continuam de pé até hoje.

A Sudesa concluiu o levantamento das edificações em APP no Setor Habitacional Vicente Pires em abril deste ano e chegou a anunciar um cronograma de demolições. Mas o GDF decidiu que as casas só seriam derrubadas depois que as famílias fossem transferidas para outras áreas e cancelou as operações. “Estamos em fase de negociação. Em alguns casos, a retirada da construção em APP traz mais danos que a permanência dela”, justifica o tenente Leandro Antunes, assessor especial da Sudesa. Atualmente, a subsecretaria tem 82 agentes, mas pouco mais de 50 pessoas trabalham efetivamente na rua, como fiscais. “Ainda não é um número ideal, mas é o melhor que já tivemos”, ressalta Antunes. (GR)

O QUE DIZ A LEI

A Lei Federal nº 4.771, de 1965, institui o Código Florestal. Ela estabelece a criação de Áreas de Preservação Permanente (APPs) em terrenos cobertos ou não por vegetação nativa, para preservar os recursos hídricos, paisagem, biodiversidade, proteger o solo e estabilidade geológica. Desde a criação da lei, as regiões próximas a cursos d’água passaram a ser consideradas APPs. Entre elas estão a mata ciliar ao longo de todo o percurso hídrico. Nos córregos menores, com menos de 10m de largura, a lei exige que se conserve uma faixa de pelo menos 30m de largura em cada margem. Esse número aumenta de acordo com o volume do rio ou riacho, chegando a 500m. A regra também vale para reservatórios artificiais, como o Lago Paranoá. No caso de nascentes e olhos d’água, um terreno com raio de 50m ao redor do local deve permanecer intacto. (GR)

EcoDebate, 21/10/2008.

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário do Portal EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta que envie um e-mail para newsletter_ecodebate-subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

Fechado para comentários.