Ministro do Desenvolvimento Agrário afirma que assentados não são os grandes culpados pelo desmatamento da Amazônia
Os ministros do Meio Ambiente, Carlos Minc, e do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, e o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart. Foto: Marcello Casal Jr./ABr
Cassel afirma que “quando o ministro não lê e não checa [os dados], a chance de erro é muito grande. A lista está errada, esse é o problema”
Em entrevista ontem à Folha, o ministro Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário) rebateu a afirmação de seu colega Carlos Minc (Meio Ambiente) de que a lista que inclui assentamentos da reforma agrária no topo dos desmatadores não será revista: “A lista está errada, esse é o problema. Por Eduardo Scolese, da Folha de S.Paulo, 03/10/2008.
Ela precisa ser substituída”.
Segundo Cassel, os próprios assentados, e não o governo federal, é que devem ser diretamente responsabilizados por eventuais crimes ambientais. O ministro também criticou a idéia do colega Mangabeira Unger de tirar do Incra a regularização fundiária. Leia trechos da entrevista em seu gabinete.
FOLHA – Ao atacar a lista divulgada pelo Ministério do Meio Ambiente, o sr. sugere que não existe desmatamento nos assentamentos?
GUILHERME CASSEL – Existe desmatamento na Amazônia em assentamentos, em áreas indígenas, em unidades de conservação, em propriedades privadas. Tradicionalmente quem tem desmatado são os madeireiros ilegais, os grileiros em terras públicas e os grandes latifundiários, em áreas de soja e pecuária. Não concordo com a afirmação de que os grandes responsáveis pelo desmatamento são os assentados. Sou contra essa idéia falsa.
FOLHA – Dados do TCU mostram que 18% do desmatamento na Amazônia é de responsabilidade dos pequenos produtores, o que inclui os assentados. Isso é pouco?
CASSEL – Esses dados mostram que 82% do desmatamento não é dos assentamentos e não é dos pequenos agricultores. O que incomoda, de vez em quando, é que parece que as pessoas não olham os dados oficiais.
FOLHA – Quando o sr. diz que os assentamentos não deveriam entrar na lista, o sr. leva em conta uma questão técnica ou o fato de os assentados serem aliados do PT?
CASSEL – Técnica. A minha restrição àquela lista é que ela é imperfeita do ponto de vista técnico. Ela não reproduz a realidade, ajuda a confundir, acaba protegendo quem mais desmata.
FOLHA – O ministro Minc disse à Folha que não irá rever a lista.
CASSEL – Acho que o Ibama vai, mais cedo ou mais tarde, construir uma lista mais próxima à realidade, com mais cuidado.
Quando o ministro não lê e não checa, a chance de erro é muito grande. A lista está errada, esse é o problema. Ela precisa ser substituída por uma outra lista, que reflita a realidade.
FOLHA – O Incra anunciou uma varredura nos assentamentos. Isso não é uma prova de que o órgão desconhece a realidade dos projetos?
CASSEL – Não. Oito assentamentos foram citados numa lista, e o setor público tem a obrigação de fazer um mergulho nisso e buscar informações mais precisas.
FOLHA – O governo federal é responsável por essas famílias até que ela recebam o título definitivo?
CASSEL – Isso seria um paternalismo absurdo. O Incra oferece assistência técnica, crédito.
Evidente que essas pessoas são as responsáveis. Se for constatado desmatamento criminoso, ele tem que perder o lote.
FOLHA – O Incra pode fazer a regularização fundiária na Amazônia?
CASSEL – Tem, desde que seja desburocratizada a legislação.
FOLHA – Mangabeira Unger defende a criação de um órgão apenas para cuidar do processo de regularização fundiária. Qual é sua opinião?
CASSEL – Isso é baseado num diagnóstico errado. Eu posso criar um, dois, três órgãos novos, posso montar uma grande estrutura, mas, com a legislação atual, não vai fazer [a regularização fundiária].
Frase
“Não concordo com a afirmação de que os grandes responsáveis pelo desmatamento são os assentados A lista é imperfeita do ponto de vista técnico. Ela ajuda a confundir, acaba protegendo quem mais desmata Quando o ministro [Minc] não lê e não checa, a chance de erro é muito grande. A lista está errada, precisa ser substituída por uma que reflita a realidade Eu posso criar órgãos [apenas para cuidar da regularização fundiária], montar uma grande estrutura, mas, com a legislação atual, não vai fazer [a regularização]”. GUILHERME CASSEL, ministro do Desenvolvimento Agrário.
[EcoDebate, 04/10/2008]