Destruindo Santo Amaro da Imperatriz, artigo de Ana Echevenguá

“A memória dói e ensina: os recursos naturais não-renováveis vão sem dizer adeus e jamais voltam”. Eduardo Galeano

Imagem: Localização de Santo Amaro da Imperatriz, SC. Fonte: Wikipédia

[Ecodebate] Várias cidades do Brasil são, hoje, invadidas por investidores que vêem em seus recursos naturais uma ótima oportunidade de fazer dinheiro. E precisam explorá-los antes que se extingam. Doa a quem doer!

E estes oportunistas recebem aplausos e bênçãos de outros oportunistas – os governantes – que estão mais preocupados com o próprio bolso do que com os interesses coletivos. Aí, tudo pode acontecer: licenciamentos ilegais, acordos espúrios e um total desrespeito aos preceitos constitucionais e legais que deveriam reger o Brasil.

Santo Amaro da Imperatriz-SC está nas mãos destes oportunistas. O município pertence à Grande Florianópolis e é a capital catarinense das águas termais. Possui, sem dúvida, a melhor água mineral do mundo. É pequena, com menos de 50 mil habitantes. 72% de sua área territorial é considerada APP – Área de Preservação Permanente. Embora sua economia esteja centrada na agricultura, a abundância de seus recursos hídricos e relevo privilegiado são atrativos ao turismo de lazer, de aventura…

Ah! A água. A revista Fortune denominou-a como o “óleo do século XXI”. Por quê? Porque quem controla este recurso tem, nas mãos, poder econômico e político. Ou seja, oportunidade de lucro certo. Por isso, a água é, hoje, questão de segurança e de defesa do Estado. Há tempos, deveria integrar o seu planejamento estratégico. Sem alimento, o ser humano resiste até 40 dias; sem água, morre em 3 dias.

E os ‘adoradores do lucro certo’ atacaram a pequena Santo Amaro devido à abundância e à qualidade de seus recursos hídricos.

No momento, seus habitantes lutam contra a implantação de 6 PCHs – Pequenas Centrais Hidrelétricas – que já ganharam o licenciamento ambiental.

Bom, todos sabem que Santa Catarina conta com um órgão licenciador e fiscalizador (FATMA) que não cumpre suas obrigações. É um show de licenças facilitadas e fiscalização zero aos amigos do rei…

No caso das PCHs, devido ao fortalecimento do repúdio da população, e um certo apoio da mídia, a FATMA declarou a suspensão temporária dos processos de licenciamento dessas “para que a comunidade, em conjunto com o Comitê Gestor da Bacia hidrográfica, apresente suas avaliações a respeito dos projetos”. Traduzindo: ela quer que a comunidade faça o que ela já deveria ter feito. E suspensão temporária é apenas um paliativo para o problema. Como é ano eleitoral, empurraram o problema com a barriga.

Outro empreendimento em Santo Amaro – também já licenciado – preocupa! A construção de uma estância hidromineral cujo projeto de R$ 90 milhões prevê um hotel cinco estrelas (com 200 apartamentos e 8 suítes presidenciais com mais de 400 metros quadrados), um condomínio horizontal (com 70 casas que terão entre 200 e 250 metros quadrados), nas encostas da maior reserva florestal de Santa Catarina – o Parque da Serra do Tabuleiro.

Uma pergunta: com todos os crimes já praticados pela FATMA, dá pra acreditar que esta área está fora dos limites da Serra do Tabuleiro? (Lembram daquela confusão dos limites deste Parque no caso da Praia da Pinheira?)

A estância será abastecida com água mineral termal de uma fonte que jorra 60 mil litros por hora. Água mineral nas torneiras, nas banheiras de hidromassagens, cascatas, piscinas, centro de estética, spa…

Será que a população local está ciente dos impactos negativos que um empreendimento deste porte vai provocar na sua cidade?

Sem a atuação legal dos órgãos competentes, especialmente dos Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas (que, no caso de Santo Amaro, é completamente omisso), vislumbro um futuro negro esta cidade e para outras tantas cujos governantes são cúmplices da exploração predatória dos seus recursos naturais.

Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, presidente da ong Ambiental Acqua Bios, email: ana@ecoeacao.com.br

[EcoDebate, 03/10/2008]