EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Notícia

FDA revê posição e EUA regula, pela primeira vez, o consumo de animais transgênicos

Salmões gigantes, vacas-laboratório com antibióticos na carne ou vacinas no leite, cabras-têxteis que produzem fibras como a teia de aranha ou suínos que precisem comer menos para engordar mais. A chegada de carne, leite ou remédios obtidos de animais transgênicos está ao dobrar da esquina. Pelo menos nos Estados Unidos, onde os cultivos modificados geneticamente são a maioria em muitas das plantas mais consumidas (milho, soja) e há uma menor rejeição popular diante dessas técnicas.

A reportagem é de Emilio de Benito, do jornal espanhol El País, 20-09-2008.

Em previsão às futuras petições, a Food and Drug Administration (FDA) [agência que regula os produtos alimentícios e farmacêuticos nos Estados Unidos] já elaborou um rascunho dos requisitos que vai exigir das empresas que queiram pôr no mercado animais com genes que não lhes são próprios.

A FDA já advertiu que os controles serão muito mais duros que no caso das plantas. A base do documento está no acompanhamento: as empresas deverão informar não só que vão comercializar um animal geneticamente modificado. Terão que indicar exatamente a seqüência do gene que vão introduzir, o método empregado, onde vai ser colocado e fazer um férreo acompanhamento dos exemplares, desde o criadouro até o prato do consumidor. Essa supervisão inclui analisar se o animal transgênico não se comporta como os demais.

Além disso, para evitar críticas dos ecologistas e ameaças ao meio ambiente, os animais e seus produtos deverão estar sempre isolados e identificados (cogita-se uma etiqueta EG, siglas em inglês para “modificado geneticamente”). Dessa maneira, poderá se impedir que as mudanças passem para espécies selvagens afins, e os consumidores saberão sempre a origem do que estão comendo, desde um bife até um antibiótico.

Esses controles não satisfizeram as organizações ecologistas norte-americanas, que temem que haja animais que escapem (e contaminem as espécies selvagens ou domésticas não-transgênicas) ou que apareçam riscos para a saúde dos animais ou das pessoas a médio prazo, o que não se poderia comprovar com os testes que se realizam habitualmente.

Os candidatos para chegar antes ao mercado são vários: desde salmões gigantes, que pesam seis vezes mais do que um exemplar selvagem, as carnes de gado ou suína protegidas mediante genes estranhos (introduzidos usando um vírus como vetor) para protegê-los de doenças ou para proporcionar mais vitaminas ou hormônios em sua carne. Também está em estudo conseguir leite rico em certas substâncias, ou inclusive a modificação de cabras para que dêem uma fibra parecida ao fio das teias de aranha. A mais longo prazo, poder-se-ia conseguir animais imunes ao mal da vaca louca, por exemplo.

A regulação não vai ser, sobre o papel, obrigatória, mas será sim de fato. Ante o receio que essas técnicas geram em muitos cidadãos, o selo da FDA servirá de garantia.

Na Espanha e no resto da União Européia, a chegada de animais transgênicos está mais complicada, segundo confirmou um porta-voz da Agência Espanhola de Segurança Alimentar e Nutrição. Eles seriam regidos, em teoria, pela mesma regulação das plantas. O receio não se deve tanto à sua segurança – supõe-se que se deverá comprovar exaustivamente caso a caso antes de se colocar no mercado –, mas sim pela atitude dos cidadãos.

É o que aconteceu com as plantas transgênicas – que sofrem uma moratória de fato – ou, mais recentemente, nos animais clonados. Ainda que a Agência Européia de Segurança Alimentar (EFSA) ditou em janeiro que a carne ou outros derivados animais conseguidos dessa maneira não supunham um risco para a saúde, o Parlamento Europeu, mais sensível aos movimentos cidadãos, votou, no dia 3 de setembro, a sua proibição.

20 anos de espera

A possibilidade de que os animais transgênicos, ou seus derivados, cheguem ao mercado ronda os pesadelos dos ecologistas há mais de 15 anos. Em 1989, Tracy, uma ovelha modificada para que seu leite contivesse alfa-antitripsina, um fármaco contra o edema pulmonar, foi apresentada à sociedade. Claro que então o que se fazia era separar o medicamento do leite e não comer a carne do animal. Seus criadores estavam no Instituto Roslin, de Edimburgo, o mesmo centro que clonou, em 1997, a ovelha Dolly. Tracy acabou nas mãos de uma empresa farmacêutica.

Desde então, numerosas espécies e aplicações entraram na lista de possíveis alimentos ou derivados. Mas até agora ninguém se atreveu a dar o passo de vender, diretamente, carne de vaca transgênica, por exemplo. Se o exemplo das plantas valesse, não houve pessoas que adoeceram por consumi-las. Mas isso não basta para tranqüilizar a população.

(www.ecodebate.com.br) entrevista publicada pelo IHU On-line, 23/09/2008 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]