Pnad: Trabalho infantil diminui, mas aumenta jornada. Trabalho prejudica o estudo das crianças
Cerca de 300 mil crianças deixaram de trabalhar no ano de 2007, revela a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada ontem (18/9). Por outro lado, entre os meninos e meninas que não conseguiram deixar o trabalho, a jornada aumentou em cerca de uma hora.
O estudo, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que no ano passado 4,8 milhões de brasileiros com idade entre 5 e 17 anos estavam trabalhando, o que representava cerca de 10,8% das crianças e adolescentes de todo o país nessa faixa etária.
Em relação ao número de horas trabalhadas, a maioria (30,5%) tinha uma jornada semanal de 40 horas ou mais. Em 2006, esse taxa era de 28,6%.
Embora o contingente de trabalhadores com idade entre 5 a 13 anos, proibidos por lei de exercer qualquer tipo de jornada, tenha diminuído 0,5 ponto percentual na passagem de ano, esse grupo integra a faixa que mais teve acréscimo de horas trabalhadas.
De acordo com o economista do IBGE Cimar Azeredo, a redução do trabalho infantil e a saída de pessoas dessa situação, de uma forma geral, pode ter evidenciado uma outra parcela de crianças que trabalharam mais do que as demais.
“O grupo que está reduzindo pode ser daquele que trabalha menos, está fazendo um bico, passando férias e que é mais fácil de ser resgatado, podendo não estar comprometido com o sustento da família, com o mercado”, disse Azeredo.
A Pnad também mostra que, quanto mais nova a criança, maior a chance de estar em atividades agrícolas. Na faixa etária de 5 a 13 anos, 60,7% estão no setor, considerado o mais pesado devido ao manuseio de ferramentas de corte e aos riscos de contato com animais peçonhentos, além do problema da falta de fiscalização.
“Um sítio onde o pai coloca o filho para trabalhar no interior é muito mais difícil de ser flagrado pela fiscalização do trabalho, que uma mercearia onde acontece a mesma coisa na cidade”, pontuou Azeredo.
O economista explica que, além das razões culturais que levam os pais a permitir que os filhos trabalhem, na expectativa de que as crianças aprendam um ofício, há a necessidade de complementar a renda familiar.
Nas casas onde há crianças que trabalham, contando com a sua participação, o valor da renda mensal per capita era de R$ 318 em 2007, enquanto a média do rendimento nos demais lares do país foi estimada em R$ 653 per capita.
Trabalho fora e dentro de casa prejudica o estudo das crianças
As crianças e adolescentes que trabalham estudam menos. A constatação é da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o dado reforça a necessidade de formalização do trabalho e de proteção à criança.
O estudo do IBGE indica que, no conjunto de indivíduos com idade de 5 a 17 anos, o percentual de estudantes entre aqueles que não trabalham é maior do que entre os que exercem algum tipo de atividade laboral: 94% e 80%, respectivamente.
Além disso, a pesquisa mostra a redução do número de crianças e adolescentes que trabalham e estudam no país em 2007. A taxa de escolarização, que mede a quantidade de estudantes de uma faixa etária em relação ao total da população com a mesma idade, caiu de 81%, em 2006, para 80%, no ano passado.
A explicação do IBGE liga a queda à redução do trabalho infantil. No ano passado, 10,8% das crianças e adolescentes brasileiros estavam nessas condições, contra 11,5% em 2006. Entre eles, um contingente de 1,2 milhão de indivíduos entre 5 e 13 anos, impedidos por lei de trabalhar.
Mesmo assim, o principal impacto do trabalho sobre a educação foi verificado entre aquelas que poderiam, por lei, trabalhar, portanto, na faixa etária de 14 a 17 anos (de 14 a 16 anos, apenas na condição de aprendiz). Entre esses brasileiros, 74,9% dos que trabalham freqüentam a escola. Na mesma faixa de idade, entre os que não trabalham, 88,9% estudam.
Outro fator que pode dificultar o acesso ao ensino e ao lazer entre as crianças são os afazeres domésticos. De acordo com um dos coordenadores da pesquisa, o economista Cimar Azeredo, ainda não é possível mensurar a interferência de serviços simples como arrumar cama e lavar louça na escolarização, tampouco saber se mascaram a realidade do trabalho infantil dentro de casa.
“Não conseguimos separar em termos de horas, por exemplo, para medir [a interferência]”, informou Azeredo. “Uma coisa é colocar a filha para arrumar a cama, criar hábitos, outra coisa é uma menina de 10 ou 11 anos ser responsável pela limpeza da casa inteira e ainda ter que lavar, passar e cozinhar”, ponderou.
Mais da metade (60,7%) das crianças e adolescentes que trabalham no país exerce algum tipo de tarefa doméstica. Entre as que não trabalham, menos da metade realiza alguma dessas atividades em casa.
Trabalho infantil predomina entre negros
A maioria das crianças que trabalha ilegalmente no Brasil é preta ou parda. Divulgada hoje (18), a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) revela que 59,5% dos brasileiros com idade entre 5 e 13 anos que trabalhavam em 2007 eram pretos ou pardos.
Elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a pesquisa mostrou que o número de brasileiros na faixa etária de 5 a 17 anos que trabalhavam diminuiu no ano passado em relação à 2006, mas ainda representava 4,8 milhões de crianças e adolescentes.
A Constituição Federal proíbe o trabalho para pessoas com menos de 16 anos, a não ser na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos.
Entre as quatro divisões etárias estabelecidas na pesquisa, o maior percentual de pretos e pardos foi registrado entre as mais novas. De acordo com o IBGE, 69,6% das crianças com idade entre 5 e 9 anos que trabalhavam em 2007 eram pretas ou pardas. Na faixa de 10 a 13 anos, esse índice era de 65,1%.
As crianças trabalhadoras de 5 a 13 anos somavam cerca de 1,257 milhão no ano passado. A maioria, do sexo masculino, estava empregada na agricultura e tinha renda familiar per capita mensal inferior a um salário mínimo. Entre as mais novas, o rendimento era o menor: R$ 189.
Entre os adolescentes de 14 a 17 anos e que podem trabalhar na condição de aprendiz, os pretos e pardos também predominavam. Entre aqueles de 14 e 15 anos, 67,7% eram classificados como tal, assim como 55,4% dos ocupados com 16 e 17 anos.
Matéria de Isabela Vieira, da Agência Brasil, publicada no Ecodebate, 19/09/2008.