Estudo da ONU diz que o trabalho decente melhorou no Brasil
Fonte: IBGE
Após piora na segunda metade dos anos 90, maioria dos indicadores tem resultado positivo nesta década, diz estudo das Nações Unidas
Após piorar na segunda metade dos anos 90, o Brasil melhorou a partir do início desta década em alguns dos índices usados pela ONU para avaliar o que chama de “trabalho decente”. É o que aponta um relatório organizado pela CEPAL (Comissão Econômica para América Latina e Caribe), pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) e pelo PNUD em que são analisados 28 indicadores de quatro áreas: emprego, proteção social, direitos no trabalho e diálogo social. Por Omar Soares de Campos, da PrimaPagina, PNUD Brasil
Nem todos os dados mostraram tendência semelhante, mas em linhas gerais é possível dizer que “o déficit de trabalho decente no Brasil é elevado; aumentou no começo do período analisado [1992] e tem diminuído nos anos 2000”, afirma o estudo, chamado Emprego, Desenvolvimento Humano e Trabalho Decente – A experiência brasileira recente e lançado na segunda-feira. As desigualdades de gênero e de cor/raça em geral diminuíram, mas permanecem altas.
A proporção de trabalhadores informais, por exemplo, era de 53,4% em 1992, passou a 53,8% em 1996, cresceu de maneira constante até 1999, quando atingiu 55,9%, mas vem caindo desde 2002, depois de uma pequena oscilação. Em 2006, o índice era de 51,8%, o menor da série analisada.
O acesso à Previdência Social, considerada pelo relatório um “instrumento essencial para a coesão social”, oscilou na margem dos 46% entre 1992 e 2002, ano em que teve início uma expansão constante: em 2006, era de 50,5%. “O aumento da proporção de beneficiados reflete, sem dúvida, as melhorias recentes do mercado de trabalho e está fortemente associado ao crescimento do emprego formal”, analisa.
Tendência semelhante ocorreu com o rendimento. “O rendimento médio do trabalho subiu após o Plano Real, mas caiu de forma sistemática entre 1996 e 2003, e começou a recuperar-se somente a partir de 2005. Esse movimento recente resulta da diminuição do desemprego, mas também reflete a recuperação do poder de compra do salário mínimo — iniciada na década anterior e intensificada a partir de 2005 —, melhores resultados nas negociações coletivas entre trabalhadores e empregadores e a melhoria relativa da situação das mulheres e da população negra no mercado de trabalho”, afirma o texto.
A recuperação do salário mínimo tem sido constante desde 1996, depois de oscilar nos dez anos anteriores. Em 2007, o mínimo do brasileiro era de R$ 419,86, em valores reais. “Em termos nominais, o salário mínimo subiu de R$ 70,00 em setembro de 1994 para R$ 380,00 em abril de 2007, um reajuste de 442,9%. No mesmo período, a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), calculado pelo IBGE, foi de 182,4%, o que resultou em um ganho real da ordem de 92,2%. Portanto, nesse período o mínimo quase dobrou em termos reais”, destaca o relatório.
O aumento dos rendimentos ocorreu paralelamente à diminuição da parcela dos trabalhadores que exercem jornadas excessivas — superiores às 44 horas estipuladas pela Constituição. Na década de 90, cerca de 40% década de da mão-de-obra brasileira trabalhava mais do que esse patamar, mas a proporção vem caindo desde 2001 e em 2006 atingiu 34,7%.
A jornada extensa era mais comum entre os homens (42,4%) do que entre as mulheres (24,5%), mas o quadro muda quando se levam em conta também os serviços domésticos “No país, 109,2 milhões de pessoas de 10 anos ou mais de idade declararam realizar tarefas domésticas; desses, 71,5 milhões (65,4%) são mulheres e 37,7 milhões (34,6%) são homens”, afirma o relatório. “Entre a população ocupada, os homens despendem 9,1 horas semanais em atividades desse tipo, e as mulheres, 21,8 horas. Assim, ainda que a carga horária feminina remunerada seja em média menor que a masculina (34,7 e 42,9 horas semanais, respectivamente), a situação se inverte quando se consideram também os afazeres domésticos: as mulheres trabalham em média 11,5 horas por dia útil, e os homens, 10,6.”
As mulheres também estão em situação desfavorável nas taxas de desemprego. “Em 2006, a taxa de desemprego para pessoas acima de 16 anos ou mais atingiu 11% entre as mulheres, enquanto para os homens era bem mais baixa (6,3%). Entre 1992 e 2006, o aumento da taxa de desemprego feminina (41%) foi quase o dobro da alta da desocupação masculina (21%)”, relata o texto.
Trabalho infantil
Um número que tem apresentado avanços expressivos no Brasil é o de redução do trabalho infantil. De acordo com a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2006, o Brasil tinha 37,9 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 15 anos. Destes, 2,4 milhões exerciam algum tipo de trabalho na semana de referência da pesquisa. Em 1992, o problema atingia o dobro de pessoas nessa faixa etária — 5 milhões.
“A incidência do trabalho infantil diminuiu de 13,6% para 6,2% entre 1992 e 2006. Desagregado em duas faixas etárias, o indicador mostra que, no mesmo período, a redução foi de 3,7% para 1,3% entre crianças de 5 a 9 anos, e de 21,9% para 10,0% entre os 10 a 15 anos”, afirma o relatório, que defende a tese, com base em um estudo da OIT baseado na própria PNAD, de que trabalho infantil gera renda menor na idade adulta.
“A pesquisa indica que pessoas que começaram a trabalhar antes dos 14 anos têm uma probabilidade muito baixa de obter rendimentos superiores aos R$ 1.000 ao longo da vida. A maioria daquelas que entraram no mercado antes dos 9 anos têm baixa probabilidade de receber rendimentos superiores a R$ 500”, diz o texto. “Em média, quem começou a trabalhar entre 15 e 17 anos não chega aos 30 anos com uma renda muito diferente de quem ingressou com 18 ou 19 anos. Mas, à medida que a pessoa envelhece, há maior probabilidade de que, se começou a trabalhar entre os 18 e 19 anos, consiga melhor renda do que quem começou a trabalhar entre os 15 e 17 anos”, acrescenta.
O que é trabalho decente
Trabalho decente é um trabalho produtivo e adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, eqüidade e segurança, e que garanta uma vida digna a todas as pessoas que vivem do trabalho e a suas famílias. Também pode ser entendido como emprego de qualidade, seguro e saudável, que respeite os direitos fundamentais do trabalho, garanta proteção social quando não pode ser exercido (desemprego, doença, acidentes, entre outros) e assegure uma renda para a aposentadoria. Também engloba o direito à representação e à participação no diálogo social. Trabalho decente diz respeito à dignidade humana.
Este conceito está embasado em quatro pilares: a) respeito às normas internacionais do trabalho, em especial aos princípios e direitos fundamentais do trabalho (liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; eliminação de todas as formas de trabalho forçado; abolição efetiva do trabalho infantil e eliminação de todas as formas de discriminação); b) promoção do emprego de qualidade; c) extensão da proteção social; e d) diálogo social.
Um elemento central e transversal do conceito de trabalho decente é a igualdade de oportunidades e de tratamento e o combate a todas as formas de discriminação — de gênero, raça/cor, etnia, idade, orientação sexual, contra pessoas com deficiência, vivendo com HIV e Aids etc.
Leia o relatório
Emprego, Desenvolvimento Humano e Trabalho Decente – A experiência brasileira recente
Enviado por Tita Barreto, do Blog Velho Chico VIVO
[Ecodebate, 12/09/2008]