Manifesto pela demarcação das terras indígenas no Ceará
POVOS INDÍGENAS NO CEARÁ: NÃO NOS RENDEMOS NEM NOS VENDEMOS!
“Teve um tempo que nós para viver precisamos nos calar, e, hoje, nós para viver precisamos falar”. (Pajé Luiz Caboclo)
A história dos povos indígenas no Brasil é marcada por um intenso processo de lutas e resistências. No Ceará não é diferente. Lutas contra as invasões que tentam expulsá-los de seus territórios. Resistências contra as diversas tentativas de negação de suas existências e culturas. Após décadas utilizando-se do silêncio como forma de resguardarem-se de perseguições, estereótipos e preconceitos diversos, os povos indígenas decidiram, no início dos anos de 1980, assumir uma nova forma de resistência: a afirmação de sua identidade indígena, dando continuidade à luta de seus ancestrais por terra, reconhecimento étnico-cultural e dignidade.
Ao romper o silêncio, eles desafiaram não apenas os posseiros, latifundiários, empresários e políticos locais, que há anos praticam invasões em seus territórios, mas também a própria história oficial que afirmava não haver mais índios no Ceará.
Ao mesmo tempo, as elites locais e internacionais impõem à sociedade cearense um projeto de modernização capitalista que está modificando completamente a paisagem do Estado. Sob a máscara do velho discurso do progresso, prometem emprego e desenvolvimento. Na verdade, tratam-se de projetos nitidamente elitistas e concentradores de renda, uma nova colonização que não respeita o meio ambiente nem a dignidade das pessoas, com fortes impactos negativos no modo de vida dos povos indígenas e das populações tradicionais, tanto do sertão quanto do litoral.
É neste contexto que presenciamos hoje uma forte ofensiva contra os povos indígenas e uma intensa campanha de negação de suas identidades e direitos constitucionais. No Ceará, o Governo Cid Gomes e a iniciativa privada local e internacional ameaçam os territórios habitados tradicionalmente pelas comunidades indígenas.
Em Itapipoca, o grupo empresarial internacional Nova Atlântida nega a existência dos Tremembé de São José e Buriti e alega a posse das terras ocupadas secularmente por estas populações, apesar de uma liminar que embarga a construção de um grande complexo hoteleiro e imobiliário por este grupo, concedida pela Justiça Federal e confirmada pelo Tribunal Regional Federal (TRF) 5ª Região do Recife.
Em Caucaia, a oligarquia Arruda, há décadas no poder municipal local, entrou com um mandado de segurança pedindo a anulação do processo demarcatório das terras dos Tapeba, que já lutam há três décadas pela sua demarcação.
Em Aquiraz, o grupo Ypióca, além de poluir e retirar água da Lagoa da Encantada, nas terras da Aldeia dos Janipapo Kanindé, criminaliza os defensores dos direitos indígenas.
Em São Gonçalo do Amarante, desde a construção do Porto do Pecém, a situação dos Anacé vem agravando-se em razão de toda a infra-estrutura que o complexo vem trazendo àquela região (termelétrica, usina, etc). O empreendimento já ocasionou a expulsão de três comunidades e ameaça grande parte das terras por eles ocupadas, além de gerar fortes impactos ambientais.
Em Maracanaú, os Pitaguary estão ameaçados judicialmente de perder parte de suas terras para o posseiro Fernando Façanha, que ocupa indevidamente um espaço de 600 ha no meio da aldeia Santo Antônio dos Pitaguary.
Tais fatos somam-se à problemática dos índios do sertão que, em municípios como Crateús, Monsenhor Tabosa, Poranga, Quiterianópolis, Novo Oriente e outros, vivem situações de intenso conflito, por conta da identificação indígena desses povos e da demarcação de seus territórios.
Neste sentido, nós, movimentos sociais do Ceará e sociedade civil organizada, nos solidarizamos com a luta dos povos indígenas e nos unimos para denunciar os abusos do poder público e da iniciativa privada! Exigimos também o imediato reconhecimento da identidade indígena desses povos e a urgente demarcação de suas terras tradicionais!
ESTAMOS VIVOS: DEMARCAÇÃO JÁ!
Manifesto enviado por Maria Amélia
[EcoDebate, 22/08/2008]