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PAC da grilagem: Lula veta artigo com regra de zoneamento ecológico-econômico e amplia ocupação de terra na Amazônia


Carlos Minc diz ter sido surpreendido, mas que retirada do dispositivo não é “desastre”. Artigo vetado condicionava regularização de terras ao zoneamento dos Estados, que deverá ser concluído só no 2º semestre de 2009.

Ao converter em lei a medida provisória que ampliou de 500 para 1.500 hectares o limite das áreas na Amazônia Legal que podem ser vendidas a seus ocupantes sem licitação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou um artigo que condicionava a regularização das propriedades ao zoneamento ecológico-econômico dos Estados, com regras para a ocupação do território. O Ministério do Meio Ambiente disse ter sido pego de surpresa. Por Eduardo Scolese e Marta Salomon, da Folha de S.Paulo, 06/08/2008.

Como apenas 2 dos 9 Estados da Amazônia -Acre e Rondônia- já concluíram o zoneamento, o dispositivo vetado poderia, segundo versão oficial do governo federal, representar um entrave à regularização fundiária, apontada como maior das prioridades do PAS (Plano Amazônia Sustentável).

Segundo dados do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), 420 mil quilômetros quadrados do território da Amazônia (8,4%) são terras públicas ocupadas irregularmente por posseiros.

Na justificativa do veto, Lula alegou que a exigência do zoneamento poderia limitar a regularização fundiária a uma pequena parcela (7,5%) da Amazônia Legal. A previsão é que o zoneamento ecológico-econômico deva ser concluído até o segundo semestre de 2009.

O zoneamento determina quais as áreas poderão ser destinadas a atividades econômicas mais intensas e quais terão de ser preservadas.

O veto surpreendeu o ministério. “Não era esperado, mas não chega a representar um desastre ecológico”, reagiu o ministro Carlos Minc. “Concordamos que a regularização fundiária é uma tarefa urgente.”

Minc diz ter negociado com a Casa Civil e o Ministério do Desenvolvimento Agrário o respeito à preservação de 80% das propriedades em área de floresta como precondição à entrega dos títulos de propriedade.

O diretor de zoneamento do Meio Ambiente, Roberto Vizentin, classificou o veto de “equívoco”: “Era um artigo defendido por deputados e senadores e que qualificava o processo de regularização, fazendo com que ele fosse compatível com princípios e fundamentos do desenvolvimento sustentável que o zoneamento enseja”.

O ministro Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário), que assina o veto com Lula, não quis se manifestar ontem.

O artigo vetado fora incluído no texto pelo relator da MP 422, deputado Asdrubal Bentes (PMDB-PA), a pedido de deputados do núcleo agrário da Casa. Para ambientalistas, a ampliação do limite de 500 para 1.500 hectares significou um incentivo à legalização da grilagem na região amazônica.

Mangabeira diz que nova lei é insuficiente

Citado no inquérito da Operação Satiagraha como “agente político” dos interesses de Daniel Dantas na Amazônia, o ministro Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos) julga a nova lei insuficiente para acelerar a regularização fundiária na região e defende a redução de exigências para ampliar o reconhecimento do direito à terra aos atuais ocupantes.

“Vamos ter de alargar esse caminho, tomando cuidado para defender interesses legítimos.” Coordenador do Plano Amazônia Sustentável, ele aguarda aval de Lula para anunciar “medidas de impacto”: “Provavelmente vai ser necessária uma simplificação das regras”. Ele cita os EUA, que fizeram “simplificações até mesmo drásticas do direito”.

Há consenso no governo de que a não-regularização é um motor do desmatamento: 67 milhões de hectares (23,3% da Amazônia Legal) estão entregues à ação de grileiros: “É como se fosse um grande acampamento, um caldeirão de insegurança jurídica”. Para ele, a MP é insuficiente para fazer a transição da posse à propriedade.

Aí surgem as divergências: Carlos Minc (Meio Ambiente) diz que a MP “já foi pra lá de Marrakech”, e Guilherme Cassel (Reforma Agrária) acha que ela representa “o limite” para que a regularização seja feita com responsabilidade: “Existe grilagem de terra na Amazônia toda, até nas terras indígenas e nas unidades de conservação. Mas não dá para fazer pirotecnia”, diz. (MS)

[EcoDebate, 07/08/2008]