Falta de dados dificulta estudo do clima na Antártida
Como um iceberg que só revela sua ponta, alguns efeitos da mudança climática na Antártida permanecem ocultos em zona poucos estudadas, desafiando os cientistas. O desabitado “continente branco”, com cerca de 14 milhões de quilômetros quadrados, tem a maior reserva de água doce do mundo, na forma de uma espessa capa de gelo, cujo derretimento total elevaria o nível dos oceanos em até 60 metros. Por Conrado Hornos, da Agência Reuters, no UOL Notícias, 31/07/2008 – 21h07.
Há dados sobre o degelo na Península Antártica, a parte do continente que se estende em direção à América do Sul. Mas muitos especialistas acham que faltam mais informações para especular sobre um degelo completo ou sobre outros efeitos imediatos da mudança climática.
De acordo com a entidade científica British Antarctic Survey, a temperatura da Península Antártica aumentou mais do que em nenhum outro lugar da Terra nos últimos 50 anos.
Os cientistas são praticamente unânimes em afirmar que o aquecimento global das últimas décadas é provocado principalmente por atividades humanas, como a queima de combustíveis fósseis, ao lado de fatores naturais.
Na Antártida, várias plataformas de gelo diminuíram de tamanho nos últimos 30 anos, e seis delas desabaram totalmente. Embora isso não provoque um aumento significativo da água do mar — já que os blocos de gelo bóiam — o fenômeno acelera o avanço das geleiras que estão sobre o continente.
Imagens de satélites revelam que nos últimos anos aproximadamente 415 quilômetros quadrados da capa de gelo da banquisa de Wilkins caíram.
“As banquisas de Wilkins, Larsen e outras menores já desabaram e não existem mais, então aí não há dúvidas sobre o que aconteceu”, disse à Reuters o pesquisador Hernán Sala, do Instituto Antártico Argentino.
Na opinião dele, a falta de registros históricos em parte da Antártida impedem a generalização de conclusões sobre o continente.
“Alguns acham que vai derreter todo, outros que não derrete, e na realidade o que se teria de dizer é que não existe muita informação”, explicou Sala, que num recente relatório escreveu que a região central da Antártida é a parte do planeta com menor quantidade de dados disponíveis para análise.
O ambiente hostil, com temperaturas de até -40C, e a distância em relação a centros de abastecimento dificultam a instalação de estações de medição na região do Pólo Sul, e por isso os dados só podem ser colhidos por satélites e sensores remotos.
Sala disse que só seria possível avaliar o que acontece no centro da Antártida se houvesse 30 anos de registros contínuos.
Para tentar preencher tais lacunas, as várias bases internacionais na Antártida buscam dados sobre o passado do continente. Retirando cilindros de gelo, os cientistas encontram pistas sobre como era o clima há várias décadas. Eles chamam esses blocos de “testemunhas”.
“Junto com brasileiros e norte-americanos, estamos tentando extrair uma testemunha profunda da área da Península Antártica. Já tiramos 130 metros de uma testemunha de gelo e queremos tirar uns 300 metros, o que nos daria uns 200 anos de antiguidade de comportamento climático”, disse Ricardo Jaña, cientista do Instituto Antártico Chileno.
(Reportagem adicional de Mónica Vargas em Santiago)
[EcoDebate, 02/08/2008]