EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Editorial

Os custos invisíveis da energia nuclear, por Henrique Cortez

[The invisible costs of nuclear power, by Henry Cortez]

[EcoDebate] Um dos mais discutíveis argumentos dos defensores da energia nuclear é o que afirma que seus custos de geração são competitivos e mais baixos do que a energia eólica.

É um argumento verdadeiro apenas se consideramos a geração no curto prazo, desconsiderando todo o ciclo de vida dos resíduos nucleares. Na prática ela gera custos que serão subsidiados pela sociedade ao longo de várias décadas ou séculos após o descomissionamento das usinas.

Os Estados Unidos, com um “estoque” atual de 64 mil toneladas de resíduos nucleares, investe no Projeto Yucca Montain, um depósito nuclear a cerca de 140 Km ao norte de Las Vegas, que, a partir de 2020, deverá receber, ao longo de um século, um volume previsto de 77 mil toneladas de resíduos nucleares, ao custo de US$ 90 bilhões. Só o custo de manutenção ao longo deste século de operação está previsto em US$ 9 bilhões.

Os custos de implantação, operação e manutenção deste depósito nuclear serão integralmente pagos pelos contribuintes norte-americanos. Nem um único centavo será pago pela indústria nuclear.

Na Inglaterra, os custos de reprocessamento, estoque e redução de resíduos nucleares, ao longo de 130 anos, estão estimados em 80 bilhões de libras, ou US$ 165 bilhões. Estes são números oficiais, apresentados ao parlamento britânico, pela autoridade nuclear (NDA) no dia 17/07. Novamente, o custo será pago pelo contribuinte.

No Brasil, o presidente da Eletronuclear disse que os rejeitos nucleares não preocupam nos próximos 500 anos.

O argumento que não precisamos nos preocupar com os rejeitos nucleares pelos próximos 500 anos também é muito discutível.

Mesmo se consideramos o tal prazo de “apenas” 500 anos, teríamos que supor que a Eletronuclear continuasse a existir ao longo deste “curto” prazo, que gerenciasse o risco, fizesse a manutenção, etc. Ou seja, cuidasse do resíduo por mais de 4 séculos após o descomissionamento das usinas. Aliás, como é que a Eletronuclear pode arcar com os custos e, eventualmente, garantir o pagamento de royalties, aos municípios a aceitarem os depósitos de resíduos nucleares, séculos após o descomissionamento de uma usina? Ou melhor, quem garante a existência da Eletronuclear por séculos?

Se considerarmos o ciclo de vida do produto (e seus rejeitos) a energia nuclear é “impagável”, porque deveria levar em conta o custo de gerenciamento dos resíduos por séculos após o descomissionamento de uma usina. Ou ninguém pensou nisso?

A afirmação da pseudo-competitivade da tarifa de energia nuclear é falsa e um engodo à sociedade, que será a real pagadora pelo gerenciamento dos resíduos. Que as autoridades brasileiras e a industria nuclear tenham, pelo menos, a honradez de expor a realidade do custeio, tal como já está acontecendo nos EUA e na Inglaterra.

Outro aspecto a ser discutido é a afirmação da segurança operacional das usinas, como o acidente de Three Mile Island (1979) e a tragédia de Chernobyl (1986) fossem casos isolados.

Na verdade, os acidentes, ou incidentes como prefere a indústria nuclear, são freqüentes. Como demonstração, recomendamos que leiam as seguintes matérias “Todas as centrais nucleares francesas serão avaliadas após o vazamento” , “Central nuclear de Cofrentes, na Espanha, entrou em alerta de segurança pela abertura indevida de uma válvula“, “Acidente nuclear em usina no sul da França” .

Estes são casos apenas ocorridos em julho/2008 e, estranhamente, somente noticiados, no Brasil, pelo EcoDebate. A imprensa nacional, contribui com o mito da segurança nuclear, ao desconsiderar ou sonegar a informação dos incontáveis acidentes ou incidentes que acontecem ao redor do planeta.

Estas questões são de pleno conhecimento das autoridades, que tem a obrigação de discuti-las com a sociedade, mas que preferem o silêncio e a omissão de informações. Talvez porque seja mais fácil impor a energia nuclear a uma sociedade que nada sabe sobre o assunto.

Não sabe em termos. Ou vocês conhecem alguém que queira uma usina nuclear ou um depósito de resíduos nucleares nas suas vizinhanças?

Sem um debate honesto e transparente, a energia nuclear será mais um dos inúmeros engodos, que transferem à sociedade e aos contribuintes os custos de políticas publicas insensatas.

Henrique Cortez, henriquecortez@ecodebate.com.br
coordenador do portal EcoDebate

One thought on “Os custos invisíveis da energia nuclear, por Henrique Cortez

  • 500 anos não é muito tempo para alguém com mentalidade jurássica!

Fechado para comentários.