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Estudo de plantas médicas indígenas cai na ilegalidade

Cientistas trabalham sem autorização para contornar burocracia, diz cientista. Farmacólogos afirmam que órgão federal que regula o setor impede pesquisas e prejudica compensação de tribos por seu conhecimento

A pesquisa com plantas medicinais descobertas por culturas tradicionais só existe hoje no país se for feita na clandestinidade. Essa é a opinião do farmacólogo Elisaldo Carlini, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), e de vários outros pesquisadores da área que participam da reunião anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência). Por Afra Balazina, na Folha de S.Paulo, 18/07/2008.

As pesquisas realizadas com plantas cujos conhecimentos venham de índios ou povos como quilombolas e ribeirinhos precisam de autorizações do CGen (Conselho de Gestão do Patrimônio Genético) que não tem sido concedidas.
Segundo Carlini, a criação do órgão, em 2001, criou de barreiras para a bioprospecção, a criação de drogas com base em recursos de seres vivos.

A continuidade de um trabalho que ele orientava, com plantas utilizadas pelos índios krahô, foi proibido pelo órgão em 2003. “Eles estão querendo proteger as nossas riquezas, mas não é dessa maneira. Estão cometendo um crime de lesa-pátria, na minha opinião, porque estão impedindo a pesquisa.”

Carlini preside também um congresso sobre fitomedicina, que acontecerá em São Paulo em setembro, e conta que a maior parte dos 1.500 trabalhos inscritos descreve plantas sobre as quais os cientistas não obtiveram licença para trabalhar.

Sem aval, as pesquisas vão para a clandestinidade. Um programa dos SUS (Sistema Único de Saúde) para uso de plantas medicinais, diz, está atrasado por conta da burocratização da pesquisa no Brasil.

A química Vanderlan Bolzani, da Unesp, diz que falta de pesquisa leva ao uso inadequado da fitomedicina. Segundo ela, espécies estão sendo confundidas -algumas têm eficácia e outras não.

Ela citou como exemplo algumas plantas parecidas com a Erythrina mulungu, calmante. Uma planta tóxica, a Petiveria alliaceae, tem sido usada como cicatrizante.

Eliana Rodrigues, da Unifesp, autora da pesquisa com com os krahô, teva seu trabalho barrado no Cgen após uma disputa de índios por royalties. Ela conta que todo o processo de autorização leva em média três anos -passando pela universidade, Funai, órgãos de de pesquisa e ambientais.

Outra questão polêmica é a repartição dos benefícios gerados com o uso do conhecimento tradicional associado à natureza. Em alguns casos, mais de uma etnia detém o conhecimento que foi aproveitado, e é difícil avaliar quem descobriu o uso médico de determinada espécie.

Há caboclos de quatro regiões do país que usam uma mesma planta ansiolítica, que já teve eficácia testada cientificamente, diz Carlini. “Não tenho como descobrir que grupo usou primeiro.”

Ele opina que o governo deveria se responsabilizar por descobrir quem tem o direito de receber o benefício e fazer a distribuição de lucros.

Habeas corpus

Num dos debates na SBPC, surgiu a idéia de os cientistas que não conseguem trabalhar pedirem habeas corpus preventivos ao STF (Supremo Tribunal Federal). “Há uma unanimidade na comunidade científica de que a legislação atual atenta contra a pesquisa e é equivocada”, diz o consultor e ambientalista Fabio Feldman.

Maria Emerick, diretora do departamento do patrimônio genético do MMA, era aguardada para uma mesa-redonda, mas não compareceu até o fim do evento, na noite de ontem (17/7).

Hoje, uma medida provisória regulamenta a questão e há um anteprojeto de lei sobre o tema parado desde 2003 na Casa Civil. O ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) afirmou na segunda-feira (14/7), na reunião da SBPC, que tentará “descriminalizar” a pesquisa e os pesquisadores.

Ele disse que parte dos trabalhos poderiam ser autorizadas pelo Ibama e outra parte, diretamente pela universidade. Carlini disse que vai insistir para que o ministro atenda a Febraplame, que congrega as associações para estudo de plantas medicinais.

[EcoDebate, 19/07/2008]