Para a ANP, mamona é inadequada ao biodiesel. Óleo atinge especificação, diz MME
A mamona como matéria-prima do biodiesel, como havia sido propalado pelo governo, seria importante instrumento de distribuição de renda e geração de emprego. Mas uma resolução da Agência Nacional do Petróleo (ANP), publicada em 19 de março, joga uma ducha de água fria no programa social sonhado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao dificultar a comercialização da matéria-prima.
Uma fonte do governo federal declarou à Gazeta Mercantil que a elevada viscosidade do óleo de mamona torna a matéria-prima incompatível com motores projetados para serem movidos a óleo diesel. Da Gazeta Mercantil, 14/07/2008.
Governo admite que mamona não atende lei do biodiesel
Brasília, 14 de Julho de 2008 – O biodiesel extraído da mamona, segundo havia sido propalado pelo governo federal, seria um dos principais instrumentos de geração de renda e emprego nas regiões Norte e Nordeste. Mas coube à Agência Nacional do Petróleo (ANP) jogar uma ducha de água fria no programa social do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Uma fonte oficial do governo informou que a resolução número 07, publicada em 19 de março deste ano, criou dificuldade para comercializar o biodiesel feito à base dessa matéria-prima. Para a fonte, a resolução diz que o biodiesel puro de mamona não atenderia às especificações por possuir elevada viscosidade. Na prática, a energia do óleo da mamona é inadequado para motores movidos a diesel.
Procurada pela Gazeta Mercantil, a ANP não quis comentar o assunto. Por meio de sua assessoria de imprensa afirmou que: “a mamona pode ser utilizada como componente de mistura de matérias-primas para produção de biodiesel, tendo em vista a especificação de biodiesel regulamentada pela Resolução ANP n° 7/08”.
A viscosidade do óleo da matéria-prima varia entre 20 a 30 milímetros (mm) por segundo. Portanto, acima dos limites permitidos na resolução da ANP, entre 3 e 6 milímetros. Quanto maior a densidade do óleo vegetal menor a velocidade em que o fluído se movimenta no interior do motor. O engenheiro-agronômo da Embrapa Algodão, Liv Soares Severino, diz que a resolução da ANP não exclui o biodiesel feito de mamona no mercado. Conforme ele entende, o relatório indica que não se pode usar o biocombustível feito 100% com essa matéria-prima. Isso pode ser pela densidade do produto, o que tornaria inviável ao uso nos atuais modelos de motores. Para se ter idéia, a viscosidade do óleo diesel é de 3,1 mm por segundo.
“Para usar o produto puro teria que se fabricar um novo tipo de motor”, destacou. O engenheiro afirmou que pesquisadores de Córdoba (Espanha) descobriram uma linhagem de mamona que não tem esse tipo de problema.
Tanto Severino como a fonte reservada do governo são unânimes em dizer que a resolução da ANP em nenhum momento cita o percentual de óleo de mamona que poderia ser usado na mistura do diesel, embora a agência afirme que ele pode ser usado na mistura para a produção do biodiesel.
“É uma resolução inepta. Na prática ela proíbe a comercialização do biodiesel de mamona porque em nenhum momento afirma que pode se misturar o produto”, destacou a fonte reservada. A mesma fonte garante que a mamona é a única matéria-prima que não cabe nas especificações da resolução da ANP. “E as matérias-primas que não atenderem as especificações estarão fora do programa”, diz.
Neste caso, avalia, quem produzir biodiesel extraído da mamona estará sujeito a fiscalização da ANP e, eventualmente, poderá ter a mercadoria rejeitada no mercado, que certamente poderá ser considera ilegal. “Isso contraria o próprio espírito do programa social do governo que concedeu incentivos fiscais federais no Nordeste para a produção do biodiesel de mamona”, argumenta a fonte. A própria Petrobras tem anunciado investimento no setor. Ambos especialistas descartaram a possibilidade de se reduzir a viscosidade do óleo de mamona no processo industrial.
Ou seja, a redução da viscosidade só é possível via a mistura do produto, o que não é garantido na resolução da ANP.
Óleo atinge especificação, diz MME
O Ministério de Minas e Energia (MME) divulgou, por meio de sua assessoria, que o processo industrial de fabricação de biodiesel consegue trazer ao óleo de mamona a viscosidade exigida pela lei. Mas, para Miguel Biegai Júnior, analista da Safras & Mercado, ainda que se consiga atingir o mesmo nível de viscosidade, esse processo é muito mais trabalhoso – e mais caro – do que para outros óleos.
Além disso, segundo ele, o preço desse óleo vale, em média, o dobro do valor do óleo de soja. A tonelada do óleo de mamona custa em torno de R$ 5 mil, enquanto que, o de soja, próximo de R$ 2,6 mil. O analista acrescenta ainda que o plantio de mamona precisa ser muito incentivado para se tornar uma cultura de grande escala. “O custo de produção é muito alto e o produtor que cultiva não tem garantia de venda, o que não ocorre com soja e milho, que têm muito mais liquidez”, diz Biegai.
Na safra 2004/05, foram produzidas 209 mil toneladas de mamona, volume que caiu para 103 mil no ciclo seguinte. Para a safra 2007/08 a previsão é de atingir 146 mil toneladas, segundo a Conab.
[EcoDebate, 15/07/2008]