O G-8 dá as costas à África
Os países ricos evitam o compromisso de dobrar as ajudas a partir de 2010 e não há prazos para desembolsar os fundos prometidos contra as pandemias. Segue a íntegra de reportagem de Fernando Gualdoni publicada no El País, 8-07-2008. A tradução é do Cepat.
A África sai da reunião do G-8 de mãos vazias. Os sete presidentes do continente que se reuniram com os dirigentes dos países mais ricos não conseguiram arrancar desses a confirmação de que dobrarão as ajudas a partir de 2010 ou que lhes darão num prazo concreto dezenas de bilhões para combater a aids, a malária e a tuberculose. As duas eram promessas que o G-8 já havia assumido em reuniões anteriores, e que agora apenas restava dar os retoques finais. Salvo que se produza um milagre na declaração final de amanhã [hoje], a África terá que continuar a tomar os recursos do jeito que puder.
“Alguns dos dirigentes africanos só quiseram enfatizar que apreciam as promessas do G-8 para ajudar os seus países, mas que ao mesmo tempo gostariam de ver que esses compromissos fossem cumpridos”, declarou o porta-voz das Relações Exteriores do Japão, Kazuo Kodama. “Também não gostariam que houvesse um retrocesso”, acrescentou.
A foto de família entre os membros do G-8 e os presidentes da Nigéria, África do Sul, Gana, Tanzânia, Etiópia, Senegal e Argélia foi feita antes da reunião em Toyako (Japão), como se tratasse de uma tática para evitar as caras feias para a posteridade.
Em plena escalada dos preços dos alimentos e do petróleo, a falta de concretude por parte do G-8 não podia ser pior. A grande maioria dos países africanos é deficitária em energia, e para comer dependem em boa medida do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas. Um programa que, além disso, também ele necessita de uma injeção de fundos de cerca de 750 milhões de dólares urgentemente para continuar alimentando a mais de 73 milhões de pessoas em todo o mundo.
O presidente da Comissão Européia, José Manuel Durão Barroso, se comprometeu [ante]ontem a investir um bilhão de euros até final de 2009 para impulsionar a agricultura africana, e o Japão já se havia comprometido antes da reunião em dobrar seus desembolsos para o continente a partir de 2013. Entretanto, tudo isso é muito pouco se levarmos em conta que o Banco Mundial calculou que com menos de 6,5 bilhões de euros, a África sofrerá o indizível.
Uma resposta concreta do G-8 às promessas feitas aos países africanos teria sido de grande alívio. Na reunião de Gleneagles, em 2005, na Escócia, as potências se comprometeram a dobrar suas ajudas a partir de 2010. Estas passariam de 25 bilhões para 50 bilhões de dólares anuais. Em troca, os Estados africanos se comprometiam a trabalhar pelo desenvolvimento de seus países, a fortalecer a democracia e acabar com a corrupção. Dois anos depois, na reunião de Heiligendamm, na Alemanha, prometeram entregar outros 60 bilhões para o combate de pandemias sem confirmar os prazos de entrega do dinheiro. Ontem, em Toyako, apenas teriam que confirmar o prometido na primeira reunião e fazer um calendário para o que ficou acertado na segunda.
O Comitê para o Progresso da África, que foi estabelecido depois da reunião escocesa e que é composto pelo ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair, o ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan e o cantor e ativista Bob Geldof, entre outros, concluiu num recente relatório que nenhuma das duas partes cumpriu inteiramente seus compromissos.
A assistência financeira que o G-8 prometeu está ao menos 40 bilhões de dólares aquém das necessidades. Pela parte africana, os conflitos de Darfur, República Democrática do Congo e Somália, além da falta de firmeza da União Africana contra o Zimbábue, demonstram que ainda resta muito a ser feito pelo continente.
A reunião de Toyako não é apenas simbólica porque se esperava confirmar o conjunto de medidas de assistência das Nações Unidas de 2000 para reduzir a pobreza em 2015.
Os chamados Objetivos do Milênio consistiam na drástica redução da pobreza e da fome, na diminuição da taxa de mortalidade infantil e das mortes causadas pela aids, malária e outras doenças; e na educação primária para todos. A crise derivada do aumento dos preços do petróleo e dos alimentos disparou os índices de pobreza em ao menos cerca de 30 países africanos.
(www.ecodebate.com.br) publicado pelo IHU On-line, 09/07/2008 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
[EcoDebate, 10/07/2008]