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Pará: advogado da CPT e militantes são condenados pela justiça federal, por Rogério Almeida

[EcoDebate] José Batista Gonçalves Afonso é natural de Minas Gerais, soma mais de 40 anos. Batista é advogado e coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT) no município de Marabá, sudeste do Pará e integra o coletivo da coordenação nacional da mesma entidade. A entidade ligada à Igreja Católica é conhecida pelo alinhamento com a causa camponesa.

Batista milita na região mais delicada do Brasil na luta pela reforma agrária. O lugar onde mais se executaram militantes e simpatizantes na defesa de tal causa. A região onde por conta de inúmeros projetos ditos grandes, pólo de madeira, pólo siderúrgico, hidroelétricas, exploração mineral e garimpo espocam passivos de toda ordem, como a devastação da floresta, trabalho escravo, concentração do poder econômico e político.

Através de uma sentença expedida no dia 12 de junho pelo juiz federal Carlos Henrique Hadad condenou Batista Afonso a dois anos e meio de reclusão. Explica uma nota do coletivo de entidades camponesas da região datada de 24 de junho, que o fato que originou a sentença ocorreu em abril 1999, após uma ação de massa organizada pelo coletivo dos camponeses/as na sede do INCRA de Marabá. A mesma sentença também condenou Raimundo Nonato Santos Silva, (Nonatinho), na época dirigente da regional sudeste da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará.

Um pouco da história. Até 1997, um ano após o massacre de Eldorado do Carajás, os ocupantes e assentados da reforma agrária não conheciam qual era o orçamento da Superintendência Regional do Incra de Marabá e muito menos como o mesmo era distribuído. A partir do ano de 1997 as entidades de representação política camponesa passaram a organizar grandes acampamentos em Marabá, com média de 10 trabalhadores/as rurais. Os acampamentos as vezes duravam até 30 dias.

O momento ficou conhecido como grande acampamento. Só a partir dessas ações as entidades de representação camponesa e apoio passaram a conhecer o volume de recursos, antes negociado com prefeitos alinhados ao contexto político da época. As representações falam que fizeram um orçamento participativo ao contrário. No ano de 1999, por conta da demora no processo de negociação, trabalhadores/as ocuparam o a sede do INCRA, e convidaram as representações públicas da época a passarem uma noite com eles/as, e prosseguirem a negociação em seguida.

Condenar Batista Afonso e o ex-militante Nonato Santos é a condenação da ação coletiva de um setor da sociedade que sempre foi marginalizado. É condenar uma ação coletiva que buscou a efetivação de direitos elementares garantidos na Constituição.

Sobre o riscado jurídico a nota explica que: Em abril de 2002, o Ministério Público propôs suspensão do processo, mediante pagamento de seis cestas básicas por cada um dos acusados e comparecimento mensal à Justiça Federal, o que foi aceito por José Batista e demais acusados. Ainda durante o cumprimento das condições, a polícia federal indiciou novamente José Batista, e teve início outro processo, pelo crime de esbulho, em razão de um segundo acampamento dos mesmos movimentos em frente ao INCRA. Novamente foi proposto a ele o pagamento de cestas básicas para a suspensão do segundo processo, tendo sido aceita a proposta.

Prossegue a nota: cumpridas as condições impostas no primeiro processo e, no momento do MPF requerer a extinção do mesmo, outro juiz (Francisco Garcês Júnior) assumiu a vara federal de Marabá e, sem nenhum fato novo, sem ouvir o MPF, anulou todas as decisões do seu antecessor e determinou o seguimento dos dois processos contra Batista e Nonato. O segundo processos prescreveu no ano passado e o primeiro resultou na atual condenação.

A região respira o momento delicado de pesado jogo de interesses sobre e os recursos naturais nela existentes. Momento de ampliação dos tentáculos da Vale em diferentes frentes. Momento que vários segmentos realizam ação de massa no sentido de questionar o modelo de desenvolvimento regional. Colocar nas grades um ativo advogado que possui ressonância nacional e internacional é mais que estratégico. Assim como os abastados da região de Conceição do Araguaia solicitaram a expulsão do Frei Henri dês Roziers, outra pedra no sapato dos adversários de interesses dos poderosos da região e fora dela.

1. Sobre os serviços prestados do juiz a nota esclarece: A revogação da prisão preventiva do fazendeiro Aldimir Lima Nunes, o “Branquinho”, denunciado pelos crimes de homicídio, trabalho escravo, aliciamento, ameaças a autoridades federais e grilagem de terra. Preso pela Polícia Federal, depois de ter fugido da delegacia regional de Marabá pelas portas da frente, mesmo assim, foi posto em liberdade em 2004, pela então juiz federal de Marabá.

2. A decretação da prisão de um trabalhador rural, pelo simples fato de o mesmo ter deixado de comparecer a uma audiência de interrogatório porque estava com medo de sair de sua residência e vir a ser assassinado, uma vez que havia sofrido uma emboscada de pistoleiros dias antes, tendo levado quatro tiros. Este trabalhador inclusive havia pedido proteção policial;

3. Deferimento de liminares reintegrando fazendeiros que ocupam ilegalmente lotes em projetos de assentamento – uma das decisões favoreceu o fazendeiro Olavio Rocha que acumulava ilegalmente 19 lotes no Assentamento Rio Gelado, município de Novo Repartimento;

4. Decisões favorecendo fraudadores da SUDAM e grileiros de terras públicas na região de Anapú – em janeiro de 2004, o então juiz da vara federal de Marabá (que ainda responde pela vara na ausência do atual juiz titular), cassou mais de uma dezena de liminares que devolviam milhares de hectares de terras públicas na Gleba Bacajá ao INCRA. Tais terras tinham sido griladas por madeireiros e fraudadores da SUDAM, entre eles, Regivaldo Pereira Galvão e Vitalmiro Bastos de Moura, acusados de serem mandantes do assassinato da Missionária Dorothy Stang, crime que ocorreu meses após a decisão da justiça federal de Marabá. A decisão prejudicou também centenas de famílias que lutavam pela implantação dos PDS’s junto com Dorothy;

5. Decisão de requisitar o Exército para dar cumprimento a liminar em fazenda improdutiva ocupada por famílias sem terra e em processo de desapropriação pelo INCRA, no município de Marabá;

6. Deferimento imediato de Liminares em favor da VALE sem ouvir o MPF em ações de interdito e reintegrações de posse envolvendo movimentos sociais;

7. Concessão de liminares para vários fazendeiros da região impedindo o INCRA de realizar vistoria em fazendas parcialmente ocupadas, embora o Supremo Tribunal Federal já tenha decidido que nestes casos não há obstáculo para que o INCRA vistorie o imóvel;

8. Expedição de liminar de reintegração de posse em terra pública onde famílias estão assentadas há 5 anos – devido o INCRA não aceitar pagar, num processo de desapropriação, por uma área que descobriu ter sido grilada por um fazendeiro de Tucuruí, o juiz federal, arbitrariamente determinou o despejo de 112 famílias assentadas, no PA Reunidas, onde existem dezenas de casas construídas e estradas feitas, escola em funcionamento e as famílias produzindo.

9. De seis processos encontrados na Justiça Federal de Marabá onde a VALE responde por crime ou dano ambiental, em quatro deles não há sentença, sendo que um se encontra em fase de investigação pela Polícia Federal há mais de quatro anos. Em outro houve acordo para reparação pecuniária do dano e no último, uma Ação Civil Pública movida pela FUNAI e o Ministério Público Federal processando a VALE por dano ambiental, o juiz julgou improcedente o pedido favorecendo a VALE.

10. Mais de 30 lideranças dos movimentos sociais investigadas pela polícia federal ou com processos na Justiça Federal de Marabá.

Rogério Almeida é colaborador da rede www.forumcarajas.org.br