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Artigo

Algumas observações sobre os custos da hidrelétrica Belo Monte, artigo de Marcos Vinicius Miranda da Silva

[EcoDebate] Em 2002, a Centrais Elétricas do Norte do Brasil (Eletronorte) divulgou o relatório final sobre os estudos de viabilidade do complexo hidrelétrico Belo Monte. Nesse relatório, a construção dessa usina exigirá um investimento em torno de US$ 4,04 bilhões, incluindo os juros durante sua construção. O custo de geração será de US$ 12,40 por MWh. Como Belo Monte terá uma potência de 11.181,3 MW, o custo do kW instalado ficará em US$ 361. Ressalta-se que esses valores foram convertidos pelo câmbio de junho de 2001.

No XXVII Seminário Nacional de Grandes Barragens, realizado em junho de 2007, o custo de geração anteriormente mencionado foi ratificado pelo artigo AHE Belo Monte – Evolução dos Estudos, que se encontra disponível no website da Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobrás).

Um levantamento sobre algumas fontes renováveis de energia, realizado a nível mundial pelo professor Wim C. Turkenburg da Utrecht University, constatou que o custo do kW instalado das grandes hidrelétricas varia de US$ 1.000 a 3.500, enquanto o custo de geração, de US$ 20 a 100 por MWh, também em valores de 2001.

A comparação entre os custos apresentados pela Eletronorte e por Turkenburg mostra uma diferença significativa. Como os custos fornecidos por este professor referem-se provavelmente a empreendimentos concluídos e como existe pouca flexibilidade para que inovações tecnológicas possam reduzir drasticamente os investimentos realizados na construção de grandes usinas hidrelétricas, suspeita-se que o investimento apresentado pela Eletronorte esteja subestimado.

Levando em conta um custo de US$ 1.000 por kW instalado para a hidrelétrica Belo Monte, bem como uma vida útil de 50 anos para essa usina e uma taxa de juros de 12% ao ano, obtém-se um custo de geração de US$ 33,34 por MWh, ou seja, 169% maior que o custo apresentado pela Eletronorte. Nesse caso, o investimento necessário para construir essa hidrelétrica ficaria em torno de US$ 11,2 bilhões.

Um custo de geração de US$ 33,34 por MWh ainda é baixo para o segmento de geração de energia elétrica, porém é preciso lembrar que ele isoladamente não pode determinar a viabilidade de Belo Monte, pois outros custos devem ser considerados.

A estratégia de aproveitar o potencial hidrelétrico da Amazônia para atender a demanda dos grandes centros consumidores localizados em outras regiões do país exige a construção de extensas redes de transmissão, intensivas em capital. No caso da hidrelétrica Belo Monte, conforme apresenta a Eletronorte, o investimento na rede de transmissão ficará em torno de US$ 1,8 bilhão, enquanto o custo de transmissão será de US$ 8,14 por MWh, convertido também pelo câmbio de junho de 2001.

Para que esse custo de transmissão seja uma realidade, toda a energia elétrica gerada por essa usina, deduzindo-se as perdas, precisará ser enviada a outras regiões do país. Se essa premissa for modificada, ou seja, se uma parte da energia elétrica gerada por Belo Monte for consumida no território paraense, o custo de transmissão aumentará. Como exemplo, cita-se o caso do “linhão” Norte-Sul, que apresenta um custo de transmissão em torno de US$ 15 por MWh, uma vez que sua capacidade média é de 600 MW.

Uma análise econômica mais completa necessariamente deve considerar os custos de controle e riscos socioambientais, a compensação financeira pelo uso dos recursos hídricos, o custo do backup térmico, além obviamente dos custos de geração e transmissão. Infelizmente, nas análises econômicas realizadas no país, há o péssimo hábito de levar em conta apenas os custos de geração e transmissão das hidrelétricas e de transferir os outros custos para o governo federal. Isso mascara a comparação entre as alternativas de oferta de energia e contribui para elevar a carga tributária brasileira.

Sobre a inclusão do custo do backup térmico, argumenta-se que o risco de racionamento de energia elétrica no período de estiagem é um efeito colateral do modelo de geração do país, que prioriza o aproveitamento hidrelétrico. Portanto, o investimento para manter um parque térmico pronto para entrar em operação quando houver necessidade é conseqüência da opção pela hidreletricidade. Dessa forma, o custo desse backup deveria ser contabilizado na análise econômica das hidrelétricas.

Talvez mesmo com a inclusão de todos esses custos, a construção de grandes usinas hidrelétricas na Amazônia ainda seja a melhor opção de oferta de energia elétrica para o país sob o ponto de vista econômico, mas isso precisa ser comprovado. Por outro lado, a divulgação de informação com um elevado grau de incerteza como, por exemplo, o custo de geração da hidrelétrica Belo Monte apresentado pela Eletronorte, é uma postura incompatível com os preceitos éticos e democráticos, que poderá levar a sociedade brasileira ao erro.

Marcos Vinicius Miranda da Silva é Analista de Sistemas Energéticos