Pajé luta contra mineração em terras indígenas. Líder diz que pode haver tragédia
“Não sou presidente, como o Lula, mas sou liderança do meu povo, que mora na floresta faz 500 anos, e mereço ser ouvido.” – A declaração, em tom de desabafo, tem sido repetida em Brasília nos últimos dias pelo pajé Davi Kopenawa, respeitado líder dos ianomâmis – grupo de 15.500 índios que habita uma vasta região de florestas, com 9 milhões de hectares, entre Roraima e Amazonas, na fronteira com a Venezuela. Por Roldão Arruda, SÃO PAULO, para O Estado de S.Paulo, 29/02/2008.
À frente de uma pequena delegação, ele foi até a capital federal para falar sobre as dificuldades que seu povo enfrenta na área da saúde e, sobretudo, manifestar seu descontentamento com as ações dos deputados da comissão especial que analisa o projeto de lei nº 1.610/96, que vai regulamentar a mineração em terras indígenas.
De acordo com Davi, os parlamentares não estão preocupados em ouvir os índios, nem com o debate sobre a questão da mineração: “Querem fazer tudo escondido.”
O desembarque em Brasília – que começou na terça-feira e deve terminar hoje – é uma represália à visita que os deputados da comissão fizeram dias atrás a duas aldeias ianomâmis. “Ninguém gostou”, contou o pajé. “Eles foram sem avisar, o que é falta de respeito, e ainda levaram presentes, facas, terçados, coisas que não valem nada, para enganar os índios.”
Davi se opõe a qualquer proposta de mineração no território ianomâmi. Ele recorda a tragédia ocorrida em meados dos anos 80, quando 40 mil garimpeiros invadiram a região, levando doenças, violência e mortes. Também destaca que qualquer mineração implicará a construção de estradas e ameaças ambientais: “Quando abriram a Perimetral Norte, de Boa Vista a São Gabriel da Cachoeira, derrubaram florestas, sujaram os rios e trouxeram uma epidemia braba, chamada sarampo, que matou muita gente. Morreu até meu pai.”
Os ianomâmis constituem o grupo mais forte de oposição à liberação da mineração. Existem outros grupos que a apóiam.
No roteiro de visitas em Brasília, os ianomâmis incluíram o gabinete do deputado Édio Lopes (PMDB-RR), presidente da comissão que prepara o projeto de lei e responsável pela recente visita às aldeias ianomâmis. Ele disse ontem ao Estado que os índios foram avisados da visita e negou ter dado presentes às lideranças: “Levamos um coronel e um general conosco e ficamos o tempo todo em território militar, sem entrar nas aldeias.”
O deputado contou ter ficado impressionado com a influência de ONGs do Brasil e do exterior sobre as comunidades indígenas: “O Davi fala muito para a imprensa internacional.”