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Artigo

A luta pela terra, pela água e pelo ar, artigo de Mayron Régis

[EcoDebate] Nos meses de inverno, quando o amanhecer se intrinca sobre a vida no planeta terra, como um pesar profundo se intrincaria das pessoas, obrigando-as a refletir o que será o seu dia, vem à mente que o mundo do trabalhador rural não se resume e nem pode se resumir, apenas, à luta pela terra, o atear do fogo para limpar esta terra e a produção de três cultivares para o sustento da sua família.

Aonde estão as lutas pelas florestas e pelos recursos hídricos do estado do Maranhão e da região do Baixo Parnaíba? Aonde estão as lutas dos sindicatos e da federação dos trabalhadores pelas florestas e pelos recursos hídricos? A fim de responder tais perguntas, temos que rever boa parte do percurso da classe trabalhadora sobre o solo maranhense nas últimas décadas, pois andar sobre este solo significou muitas vezes andar sobre a sua fonte de recursos sendo expropriada por forças econômicas multiformes e inclementes que lhe infligiam novas estruturas sociais e ambientais.

Por décadas, presumia-se, por parte dos movimentos sociais, que bastava ocupar a terra e por parte dos governos se presumia que bastava titular essa mesma terra e dispensar alguns recursos para a sua manutenção. Contudo, o que se viu e o que se vê, referindo-se a pequenos proprietários rurais, posseiros e assentados, na Amazônia, no Cerrado, na Caatinga e na Mata dos Cocais, que são os biomas do Baixo Parnaíba maranhense, é que essas práticas levaram à degradação dos recursos naturais, a escassez de alimentos e o abandono das áreas.

Em vários documentos escritos sobre reforma agrária e a situação fundiária no Brasil se enaltece a luta pela terra como uma luta pelo direito a produção e a alimentação, ou seja, o direito a uma vida digna. Passou batido à maioria dos escreventes e dos leitores que, embora sejamos carne, nada seríamos sem água e sem ar. É como se passasse uma borracha em cima de todo o processo físico-natural e histórico que possibilitou a existência de árvores seculares no ambiente amazônico e nele se escrevesse pastagem, gado, cana, soja, eucalipto e carvoaria.

Talvez tenhamos que rebatizar a consciência dos trabalhadores rurais a respeito do seu papel político, a despeito de que a formação política para a classe trabalhadora dá aquela sensação de fim-de-festa quando todos vão embora, com as mesmas convicções de antes, de que a mudança social passa pelas mãos dos trabalhadores, mas com um apelo diferente das lutas sociais passadas, nas quais se lutava por uma melhoria econômica e social nas suas vidas, em que ele se veja e em que ele veja riqueza não só naquilo que produz, fabrica, vende e consome para si e para os outros como também em matérias que ainda não estão prontas para serem transformadas em mercadorias, pegando aqui o exemplo do bacuri.

As comunidades agro-extrativistas do Baixo Parnaíba maranhense consolidaram empiricamente uma relação sócio-econômica com os ramos de Floresta Amazônica, de Cerrado, de Caatinga e de Mata dos Cocais que permitiu a essas comunidades se manterem enquanto extrativistas e agricultores no mesmo espaço físico e espaço de tempo. Em todo caso, as mentes de certos agrupamentos humanos do Baixo Parnaíba maranhense se projetam em áreas que são imprescindíveis para a roça e outras que são imprescindíveis para a coleta dos frutos da mata. Dependendo da região e do agrupamento humano, as áreas imprescindíveis para a roça viriam à frente das áreas para extrativismo. Uma diferença que facilitou bastante a tomada de terras devolutas pelo agronegócio no estado do Maranhão, pois a estrutura econômica que avaliza esse processo parte do principio que para a agricultura familiar plantar mandioca bastam dez hectares.

Frente ao agronegócio, as áreas de extrativismo se armam da garra das várias comunidades que vivem da coleta do bacuri e do pequi como se viu na luta pela criação da reserva extrativista de Chapada Limpa e outras tantas lutas para que elas não sejam desmatadas e as matas não virem carvão vegetal. No caso da reserva extrativista de Chapada Limpa, no município de Chapadinha, criada em setembro de 2007, o STTR, junto com o IBAMA, as associações de Chapada Limpa e Juçaral e ONG’s, reivindicou a sua criação como forma de preservar os bacurizeiros que ajudam na alimentação das comunidades e os mananciais que se derramam na bacia do rio Munim. As movimentações da sociedade civil no Baixo Parnaíba, englobando sindicatos, associações, ONG’s e ministério público, em defesa das áreas de extrativismo, valorizam uma diversidade política que as organizações deveriam cuidar em sua rotina, pois a demanda por novas áreas para produção de soja e outras monoculturas desafia as muitas diversidades que convivem no Baixo Parnaíba.

Essa demanda, que é cada vez mais uma demanda por energia, vide o caso do projeto da Gerdau de 70 mil hectares, é um desafio para a agricultura familiar e para o extrativismo para as próximas décadas no Baixo Parnaíba, pois não é só a compra ou a grilagem de terras, como também é a introdução de espécies exóticas para a produção de agroenergia em áreas que são prioritárias para as comunidades tradicionais como também para as próprias cidades. Com relação as cidades, essas áreas mantém a umidade em nível suportável e absorve as águas das chuvas que alimentam as bacias hidrográficas. É preciso que o movimento sindical apreenda o que esses projetos agroenergéticos acarretam para o meio sócio-ambiental quando da sua instalação.

Mayron Régis, Fórum Carajás