Mais de 15 anos são necessários para superar desigualdade entre brancos e negros no ensino, diz pesquisador da UFRJ
Embora a desigualdade entre brancos e negros no que se refere à presença no ensino fundamental tenha diminuído nos últimos dez anos, nos níveis médio e superior há assimetrias que só poderiam ser superadas no prazo de 17 anos. EcoDebate, com texto e informações de matérias de Alana Gandra, repórter da Agência Brasil.
A conclusão é do levantamento elaborado pelo Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais (Laeser) do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O estudo integra o quarto capítulo dentre os 11 que vão compor o 1º Relatório das Desigualdades Raciais no Brasil, que deve ser concluído em março e atualizado a cada ano.
Segundo o pesquisador da entidade Marcelo Paixão, nos últimos dez anos houve uma queda na diferença do tempo de estudo entre negros e brancos.
Entre 1996 a 2006, foi registrado um aumento de 1,6 ano de estudo entre os brancos com idade acima de 15 anos. Entre os negros da mesma faixa etária, o crescimento foi de 1,9 ano de estudo.
“A diferença entre os dois grupos se reduziu em 0,3 ano de estudo. Se essa queda mantiver essa média, a redução das desigualdades se esgotaria em não menos que 17 anos”.
Ele lembra que, normalmente, o prazo para a conclusão do ensino fundamental e médio é de 11 anos. “Ou seja, dizer que vai demorar 17 anos significa dizer que haverá pelo menos duas gerações ainda com desigualdades”.
Para o pesquisador, o acesso ao segundo grau é o principal gargalo da educação brasileira. Segundo ele, os principais indicadores para medir a qualidade do ensino são as defasagens entre a idade da pessoa e a série em que ela estuda e entre o número de matrículas para uma determinada série e a idade das crianças que a freqüentam.
Nesse sentido, diz Paixão, o percentual de jovens com idade entre 15 a 17 anos que estudam em série compatível é muito baixo, especialmente para a população negra. “Isso sinaliza que, se por um lado ocorreu uma universalização no primeiro grau, ainda temos um duplo desafio”.
Segundo Paixão, a queda na desigualdade está relacionada principalmente às taxas de cobertura do sistema escolar.
“Houve uma expansão da freqüência escolar na população entre sete e 14 anos de idade. Isso trouxe a equiparação dos indicadores de jovens negros e brancos no Brasil, o que não significa que a diferença da qualidade do ensino para ambos tenha caído em igual proporção”.
Desmembrando os dados, Paixão informa que 80% da população branca entre sete e 14 anos de idade estuda em escola privada e 20% em escola pública.
“Mas menos de 10% de crianças negras estudam em escola privada. Considerando as defasagens nos sistemas público e privado, isso também denota o quanto é importante para a população negra a melhoria na educação pública”, observa o pesquisador. “Enquanto ela não ocorrer, a qualidade do ensino para os negros será muito aquém que a de brancos”.
Estudo mostra que taxa de adequação escolar ainda é menor entre negros
Em 2006, do total de crianças negras entre sete a dez anos de idade, metade não freqüentava o nível de ensino esperado para a idade que tinham, seja porque estavam fora da escola, tinham sido reprovadas ou abandonaram os estudos por algum motivo. Entre as crianças brancas, 38% estavam nessa situação.
Em 1995, o Brasil apresentava um percentual na taxa de adequação do sistema de ensino para o primeiro ciclo fundamental (crianças entre sete a dez anos de idade) de 52,5% de brancos e 30,7% de negros. Passados 11 anos, o índice entre as crianças brancas subiu para 62,2% e entre as negras, para 52,3%.
“Isso significa que o indicador entre as crianças negras melhorou mais rapidamente do na população branca”, diz Paixão.
Mas, segundo ele, a taxa de adequação de crianças negras em 2006 era igual a de crianças brancas em 1995. “Os indicadores reduziram. Mas é necessário observar que estão muito aquém do ideal. Esses indicadores ainda vão continuar se qualquer esforço verificado nos últimos anos não for mantido ou aprimorado”.
Em relação ao segundo ciclo do ensino fundamental, relativo a crianças entre 11 a 14 anos de idade, o estudo mostra que, em 1995, a taxa de adequação entre brancos era de 31% e entre os negros atingia 12,1%.
Em 2006, o indicador subiu para 49,8% para as crianças brancas e para 33,1% entre as brancas.
“Ou seja, metade das crianças brancas entre 11 e 14 anos de idade não estava estudando na série correta ou sequer estava estudando. A gravidade do indicador é dizer que, entre as crianças negras nessa faixa etária, 70% não estão estudando na série correta ou estão fora da escola”.
No ensino médio, em 2006, os indicadores mostram que 37,4% da população branca com idade entre 15 e 17 anos estudava série esperada. No caso dos jovens negros, o percentual passa era de 19,3%.
“Isso significa que 80% dos jovens negros ou não estão estudando ou estão estudando em uma série inferior a que seria a idade esperada”, observa paixão.
No nível superior, segundo o estudo da UFRJ, as assimetrias persistem entre negros e brancos. Isso pode ser observado pela taxa bruta de escolaridade, que mede o total de pessoas que freqüenta a universidade.
A taxa bruta para a população branca passou de 13,21%, em 1995, para 30,27%, em 2006. Para a população negra, o percentual subiu de 3,3% para 12,1% no período.
“Do total de negros que freqüentam o ensino superior frente a população que tem entre 18 e 24 anosde idade, apenas 12% estão na universidade”.
Quando se considera a taxa líquida de escolaridade – referente à população que tem entre 18 e 24 anos que está na universidade frente a população total nessa faixa etária – observa-se que a taxa líquida no terceiro grau entre os brancos passa de 9,2% para 19,5% entre 1995 e 2006.
Em outras palavras, dentre os jovens brancos brasileiros, um em cada cinco estava na universidade ou na faculdade nesse período.
“No caso dos negros, há uma mudança de 2% para 6,3%. Quer dizer que, dentre a população negra entre 18 e 24 anos de idade, 6% estavam na idade correta e freqüentavam uma universidade. Ou seja, metade da população negra que está na universidade já está acima dos 24 anos e reflete que a população jovem negra conhece a universidade e a faculdade de ouvir falar”.