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Ecocéticos desafiam Al Gore nos EUA a debate sobre clima

Na quinta-feira, o Congresso americano votou pela primeira vez uma lei que restringe a emissão de gases poluentes no país. A Lei Lieberman-Warner foi aprovada por um subcomitê e ainda precisa passar por várias votações para sair do papel. Mesmo assim, foi mais um golpe contra o influente lobby dos “negadores do aquecimento global”, que engoliu em seco o Nobel da Paz e o Oscar concedidos ao ex-vice-presidente Al Gore. A reportagem é de Patrícia Campos Mello e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 3-11-2007.

Mas os ecocéticos não desistem facilmente. Nas últimas semanas, um grupo de contestadores das mudanças climáticas vêm colocando anúncios enormes no New York Times dizendo que “a mudança climática não é uma crise” e desafiando Gore para um duelo verbal. Eles argumentam que o aquecimento global não tem influência do homem e se opõem a limites fixos de emissões de gás carbônico.

“O fato de Gore ganhar o Nobel não vai fazer com que nós abandonemos a luta”, diz o advogado Chris Horner, um dos desafiantes do anúncio e autor do Guia Politicamente Incorreto para Aquecimento Global e Ambientalismo, que passou metade do ano na lista dos livros mais vendidos do NYT.

Para Horner, Gore é catastrofista e parte de uma premissa falsa. “O CO2 não eleva a temperatura da Terra, e essa é apenas uma das mentiras de seu filme”, diz. Horner, considerado um anti-Cristo pelos ambientalistas por combater o protocolo de Kyoto.

O lobby poderia ser apenas folclórico se não tivesse tanto poder. Horner, por exemplo, faz parte do instituto Competitive Enterprise Institute, que recebeu US$ 19 milhões da ExxonMobil e outras corporações para produzir estudos sobre clima.

O grupo dos negadores do aquecimento global, formado por políticos conservadores, institutos de direita, empresários das áreas de carvão, aço, gás e petróleo, está enfraquecido, mas ainda tem influência, diz Manik Roy, diretor de Assuntos de Congresso do Pew Center on Global Climate Change. “Eles estão infiltrados em várias camadas do poder” diz.

No Congresso, o mais destacado cético é James Inhofe, que chegou a ser líder do subcomitê de Meio Ambiente e diz que o aquecimento global “pode ser a maior farsa já armada contra o povo americano”. “Na Casa Branca, o vice-presidente Dick Cheney é um grande ecocético. Não acha que a mudança climática é um problema sério”, diz Roy.

No início do ano, outro instituto conservador , o American Enterprise Institute, chegou a oferecer US$ 10 mil para pesquisadores que produzissem estudos contestando as determinações do painel de clima da ONU. O governo americano vem anunciando seu empenho na batalha contra o aquecimento global, mas, na prática, a Casa Branca não aceita metas fixas de redução de emissões.

O grande teste da influência do lobby dos ecocéticos será a tramitação da Lei Lieberman-Warner, que prevê uma redução de 19% no nível de emissões de 2005 em 2020, e 63% em 2050, além de implementar leilões de créditos de carbono. A lei poderia estar na mesa do presidente, para ser assinada ou vetada, em agosto ou setembro do ano que vem.

O problema é que boa parte da população americana ainda acha que não é preciso fazer nada de tão urgente para reduzir emissões, acredita Roy. Uma pesquisa da revista Newsweek de setembro mostra que 39% dos americanos ainda acham que “há muita controvérsia entre os cientistas” sobre o fato de o planeta estar ficando mais quente e só 46% acreditam que já se podem sentir os efeitos do aquecimento global.

Ação dos ecocéticos inclui prêmio e anúncio em jornal

O lobby dos ecocéticos adaptou-se aos novos tempos. “Depois dos relatórios do Painel Internacional de Mudança Climática (IPCC), confirmando a existência do aquecimento global e seus efeitos negativos, ficou muito difícil simplesmente negar as mudanças climáticas”, diz Brenda Ekwurzel, cientista da União dos Cientistas Preocupados. A reportagem é do jornal O Estado de S. Paulo, 3-11-2007.

Portanto, a propaganda agora é mais sofisticada. Os ecocéticos não dizem mais “não há prova científica de que o planeta está ficando mais quente”. Mas afirmam que será até melhor para os humanos um planeta mais quente, que metas voluntárias de redução de emissões são suficientes, que metas obrigatórias vão impor custos insuportáveis para os Estados Unidos e que se China e Índia não se comprometerem a com redução de emissão de CO2, não adianta fazer mais nada.

“Não somos contra restrições nas emissões, mas queremos limites bastante flexíveis”, diz Stevens Berry, assessor do deputado republicano Lee Terry. Segundo ele, as posições mais flexíveis são apoiadas não apenas pela indústria, mas por sindicatos e cidadãos em geral – porque, se houver um esquema muito rígido de eficiência de automóveis e redução de emissões, os custos nos EUA vão ficar muito altos e “nós vamos acabar exportando empregos”, diz. “De mais a mais, as calotas polares de Marte também estão derretendo”, diz, numa recaída.

Thomas L Moskitis, lobista da American Gas Association por mais de 20 anos, admite que os ecocéticos enfrentam tempos difíceis. “É duro lutar porque a versão hollywoodiana de aquecimento prevaleceu”, afirma. Ele também não se opõe à redução de emissões. “Mas o que adianta a gente reduzir emissões? E todos os chineses que ainda vão comprar carros?”, questiona.

Ele não nega diretamente o aquecimento global, mas subverte a lógica. “Tenho de dizer que os anos de maior aquecimento da Terra foram os mais prósperos”, diz Moskitis, fã do dinamarquês Bjorn Lomborg. Bjorn defende que não vale a pena combater a mudança climática – o custo-benefício de se combater a malária, por exemplo, seria mais vantajoso.

Sites como o do Instituto Heartland têm até guias para influenciar a opinião pública e semear dúvidas. “O senador Smith fala em redução de poluentes entre 20% e 30%, mas não menciona que esses cortes vão custar US$ 3.372 por ano para cada família americana e destruir 2,4 milhões de empregos.”

Ou então: “O aquecimento global está acontecendo e o homem é parcialmente responsável – mas isso não quer dizer que o aquecimento global vá criar danos suficientes à Terra.”

(www.ecodebate.com.br) matérias do jornal O Estado de S.Paulo, publicadas pelo IHU On-line, 03/11/2007 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]